Capítulo 33

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- Mas o que significa isso?

- Senhor Romeu, eu levei Clarissa a...

- Eu não dirigi a palavra ao Senhor, seu moleque!

- Pai! - chamei-o em tom de reprovação. - Não precisa disso, Miguel e eu só estávamos nos divertindo.

- Divertindo? Vocês parecem que foram pra guerra e voltaram. Aonde você foi come esse marginal?

- Ei!- Com todo o respeito Senhor Romeu, mas não tem nenhum marginal aqui.

- É! Esse monte de tatuagem, essa corrente no pescoço e essa porcaria que vocês chama de automóvel... Deixa eu adivinhar, você foi a casa dele Clarissa, no meio do mato, no meio do morro, onde tem que pedir permissão pra entrar e rezar pra não ser assaltado. 

- Eu não vou ficar aqui pra ouvir tamanha bobagem. - Disse fazendo sinal a Miguel querendo subir as escadas, mas meu pai foi enérgico - Eu não terminei Clarissa! Eu quero saber onde você anda com esse rapaz. 

- Olha, eu posso não ser o cara que você procura para sua filha, mas respondendo ao seu pré conceito, não, minhas tatuagens e meu automóvel não definem quem eu sou, eu estudei, eu fiz faculdade, e pode o senhor não querer saber, mas eu venho de uma família muito nobre e trabalhadora. Posso não ter a quantidade de dinheiro que o senhor tem, mas moro num lugar decente, fiz uma faculdade, e moro num apartamento com a minha irmã mais nova. E ainda que eu morasse num barraco, eu tenho algo que o senhor, com todo esse dinheiro, não tem, que é educação e respeito com o próximo. Sei que não sou o genro que o senhor quis a sua filha, já que planejou um casamento de sucesso para ela com um austríaco rico e renomado, que no momento de dificuldade a abandonou quando estava tendo uma de suas crises. 

- Clarissa estava doente. Imagina o quão difícil deveria ter sido pra ele? O que você sabe?

- Ora, eu sou o médico dela. O psiquiatra que nunca, em nenhum momento desistiu de sua filha. Eu me apaixonei por ela, e caso o senhor não entenda, Clarissa não estava doente. Ela tem fibromialgia, uma situação que não tem cura, mas tem tratamento intensivo e que vez ou outra pode vir a tona com crises terríveis. Então, posso ser esse marginal tatuado, mas eu nunca abandonei sua filha como o senhor fez, então quem não entende a situação aqui é o senhor e esse seu pretenso futuro genro que por sinal está noivo. Alguma vez o senhor se perguntou sobre como Clarissa estava? Algum vez se perguntou, do que ela precisava? O que ela queria? Não, o senhor achou melhor abandoná-la num hospital psiquiátrico e não a visitou nenhuma vez. Fechou os olhos para a dor e o sofrimento dela, por ela não ser mais a filha perfeita. E agora, a felicidade dela te incomoda porque não faço parte da elite? que tipo de pai o Senhor é? - Miguel jogou palavras frias em papai, palavras que ele precisava ouvir, mas de algum modo elas me atingiram e me causaram tamanha dor que foi impossível não chorar. 

- Cala a sua boca, seu estúpido. Não venha me ensinar como cuidar da minha filha. Você está na minha casa e eu exijo respeito.

- Perdão, mas quem faltou com respeito primeiro foi o Senhor, eu só disse a verdade, mas é como eu digo a verdade dói.

- Eu não sou obrigado a ficar ouvindo sermões de um marginal como você que fica levando minha filha sabe se la para que fim do mundo e ainda quer me ensinar...

- Já chega! - gritei em lágrimas quando eu vi que aquela discussão não teria fim. - Chega! - pedi agora sem forças. - Miguel, vá embora, por favor. Amanhã conversamos. 

Miguel me olhou preocupado. Um mistura de culpa por eu estar no meio daquela discussão sem fim e o mesmo tempo aflito por eu ter uma recaída ou outra crise de nervos, mas ele entendeu que ir embora era a melhor situação. Ele assentiu, e foi embora, enquanto eu o via subir em sua moto. A verdade, eu não queria me virar e encontrar  o rosto de reprovação do meu pai. 

Ensaios de borboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora