Capítulo 20

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Marina Moschen como Melissa



A viagem


Três dias. Três incansáveis, desesperadores e incontáveis dias. Os ponteiros do relógio me martirizavam. O tédio a cada minuto me consumia. Mas isso não era o pior de tudo. Pelo contrário, a confusão de sensações que preenchiam minha alma, vinha como verdadeiras facadas, ora no peito, ora no estômago. Doía. Por dentro e por fora.

Toda essa perturbação me provocou crises intensas, as quais faziam um bom tempo que eu não tinha. A todo momento me vinham as lembranças daquele dia. Uma sensação boa seguida de um leve frio na barriga nada agradável, evidenciando a minha preocupação com a opinião alheia. Mas não era qualquer opinião. Era a opinião de Miguel. Ele me abandonou, pensara eu todas as noites. E a cada vez que esses pensamentos me invadiam, minha vontade era de gritar, espernear e me auto crucificar por ser tão imbecil.

Eu estava no lugar certo. Afinal, clínicas psiquiatras são os melhores lugares para se deixar pessoas loucas e desajuizadas feito eu. Sem controle de suas principais emoções. Eu estava errada se pensava que Miguel sentiria alguma coisa por mim. Sentiria alguma coisa com aquele beijo. A mesma coisa que eu, infelizmente senti. A nossa relação era apenas de paciente e médico. E o fato de as pessoas insistirem em criar outra situação, para uma pessoa com sérios transtornos, com certeza, influenciaria a minha corrompida imaginação.

Parte de mim dizia para fugir novamente, mas a cada tentativa, eu me lembrava das palavras de Miguel e eu acabava desistindo, porém, chorava a todo momento. Lá estava Clarissa Hoffman voltando à escala zero. Mais uma vez eu estaria me submetendo ao silêncio, às borboletas e a me esconder a cada dia mais em meu próprio casulo.

Foram três dias suficientes para eu me dar conta do quanto eu sentia, desesperadamente e dolorosamente, a falta do pior psiquiatra do mundo. Admitir isso, em nada aliviava minha situação.

O sol invadiu a minha janela. Fazia um calor terrível no quarto, o que me fez acordar de mau humor, já que estava esperando ansiosamente pela viagem que não ocorreria por minha culpa. E, dessa vez, eu não precisava descontar em minha doença.

Meu corpo estava dolorido. Minha cabeça girava e eu só queria ficar na cama. Novamente eu me encontrava numa briga interna comigo mesma. Meu cérebro desejava que meu corpo saísse da cama, mas ele parecia não obedecer aos seus comandos.

Bateram na porta. Eram três batidas. Meu coração gelou. Não poderia ser ele. Ou talvez fosse e ele só queria se dar ao trabalho de vir me dizer que não poderia ser mais meu médico. Ou viria debochar de mim, o que eu achava meio difícil, porque tal atitude não combinava com Miguel. Ou talvez, eu estivesse errada. Oh céus, como eu desejei estar errada.

Diante do meu silencio, a porta se abriu. Uma brisa leve tomou conta do ambiente e meu coração pulou. Algo de muito errado estava acontecendo. E era inegável e evidente que eu estava com medo.

- Bom dia borboleta! Mas veja só, está deitada nessa cama ainda, esqueceu que vamos viajar? – Miguel parecia o mesmo de sempre. Era como se nada tivesse acontecido entre a gente. E por algum motivo, sua indiferença diante aquele assunto, incomodava-me mais do que se ele estivesse me xingando naquele momento. Eu preferia. Seria mais fácil.

- Achei que não iríamos.

- E por quê pensou nisso?

- Você sabe... – quis insistir.

Ensaios de borboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora