Capítulo 3

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Março de 2017 — Terceira consulta — Três semanas depois.

Estava no quinto dia em que não dormia direito. Por algum motivo, Miguel não havia aparecido, porém, eu não me incomodei com isso. Afinal, queria poupá-lo de me ver naquele estado. Uma das enfermeiras me ajudou a se vestir, pois me levaria para andar no corredor. Eu odiava ter que fazer aquilo. Na minha concepção eu era uma pessoa normal e olhar para os outros indivíduos a minha volta em uma situação de completa loucura me abalava. Sentia que meu fim estava próximo e me desesperava ao chegar a minha idade sendo tratada por louca. Afinal, queria ir além, eu tinha planos para o futuro, tinha anseios, desejos, e agora, nada mais importava.

Aquilo era inaceitável e a única coisa que eu gostaria era voltar a ser a Clarissa de antes. As enfermeiras tentavam entrar em algum assunto, mas eu desviava todos eles. Tentavam fazer com que eu me enturmasse com os outros pacientes que se encontravam em estágios parecidos ao meu, porém nada daquilo me animava. Eu não suportava a mim mesma e sempre após essas ocasiões, eu chorava a noite inteira.

Morrer várias vezes me pareceu ser a melhor opção. Morreria tendo as borboletas para me contemplarem. A janela do meu quarto por muitas vezes me serviu de inspiração, até que optaram por colocar grades. Meus remédios eram totalmente controlados para que eu não os tomasse tudo de uma vez.

Viver naquelas condições era como estar morta no mundo dos vivos.

Eu estava sozinha, sentada no banco próximo ao jardim enquanto o sol queimava minha pele. Olhava a movimentação das pessoas, e por mais que muitas delas devidamente tivessem algum problema, elas pareciam mais felizes do que eu. No fundo eu as invejava. Invejava porque elas conseguiam sorrir, gargalhar, gritar, correr, e eu permanecia imóvel. Eram felizes na sua própria loucura.

Senti a presença de alguém ao meu lado e sua sombra invadiu a minha. Sentou-se próximo a mim e eu já sabia quem era. Ele não se submeteria aos esforços de pedir licença ou permissão para invadir meu espaço. Não queria vê-lo e senti o gosto da frustração por ele não ter sumido de vez assim como outros psiquiatras.

– Vejo que não está mais em seu quarto. Tomar sol algumas vezes é bom.

Não respondi e ele não se abalou com isso.

– Dor generalizada nos músculos, costas, pescoço, pernas, espasmos, tremuras, nervosismo, insônia, depressão, irritabilidade.

Olhei para ele.

– Esses são alguns sintomas dos fibromiálgicos. Sensibilidade maior, cansaço maior, resistência menor e imunidade menor. Uma doença interessante. Não que eu já não soubesse sobre ela, mas achei interessante estudá-la mais a fundo.

Dei um sorriso debochado e voltei a olhar o jardim e o jeito como os pacientes se divertiam em sua insanidade.

– Sabe que não está sozinha nisso, não sabe? Você não é a única a passar por isso e a se encontrar em uma situação como esta, e vai por mim, tem gente em situação pior que a sua e que infelizmente não está mais aqui para nos contar sobre sua experiência.

– As grades em minha janela confirmam seus dados?

Ele me olha de um jeito indecifrável.

– Desculpa ter sumido, precisava me organizar para poder te ajudar, aliás, ajudar não, para podermos conversar melhor.

Dei de ombros sentindo uma pontada em minha cabeça. Odiava me submeter aos remédios que mais pareciam piorar do que melhorar minha situação.

– Podemos conversar aqui ou ir ao seu quarto se preferir – respirei fundo sem responder – Certo, ficaremos por aqui então.

Ensaios de borboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora