Capítulo 44

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Três meses depois


Durante esses quase seis meses internada novamente, acreditei que ficaria ali por mais longos anos. Mas não. Dessa vez o tempo foi curto, mesmo que, lá dentro, pareceu uma eternidade. Eu tentei colocar em prática tudo o que eu havia aprendido até então e, de certo modo, me ajudou. 

Por mais que a Clarissa reclamona, doente e deprimida ainda habitava em mim, a ânsia de sair dali era maior do que qualquer problema que existia. Quando você fica muito tempo presa e então finalmente encontra o sol, a última coisa que você quer, é perder a vista novamente.

Mas, eu descobri algo extremamente importante durante esse processo. Algo que eu jamais havia dado atenção. Aprendi sobre liberdade. Ora, seria sinal divino as borboletas logo ao lado da minha janela? Muito provavelmente que sim. Não era a toa que Miguel me chamava de borboleta. Eu era mais uma das borboletas que emoldurava a janela do meu quarto. 

Bem, o clico de vida de uma borboleta, todo mundo sabe. Primeiro são lagartas feias, nojentas e asquerosas. Então ela constrói o seu casulo e permanece lá até que esteja pronta. Até que suas asas estejam formadas. Em seguida, elas fazem uma força gigantesca para sair do casulo, mas é um processo extremamente essencial para que ela seja uma boa borboleta. Quando ela finalmente consegue sair dele, ela se torna um dos insetos mais lindo. 

Eu, assim como uma lagarta, fui discriminada. As pessoas se afastavam de mim como se eu fosse um peso, ou tivesse uma doença contagiosa. Construí meu próprio casulo e demorei longos anos para me libertar dele. Até que consegui, mesmo tendo um pequeno incentivo no caminho. Porém, só agora percebi, que não havia saído por completo, porque ainda faltava minhas asas. Ainda faltava voar.

Quando o portão da clínica se fechou atrás de mim, um sentimento de paz e vitória tomou conta de mim. 

- Minha filha, que alegria! - diz mamãe logo que desceu do carro, me dando um grande abraço com lágrimas nos olhos. 

- Mãe! - abraço-a sentindo o calor de seu colo, tão aconchegante. 

- Pronta para ir pra casa? 

- Prontíssima, mamãe. 


Durante o caminho todo pra casa, mamãe falava sobre os projetos da loja, sobre o que podíamos fazer juntas. Coisas como compras, ir no meu restaurante favorito, massagem, cabelo e várias outras coisas. 

- Filha, o que você acha de no final de semana a gente fazer um rolê só para garotas? Eu você e Dafne? A gente faz um dia de spa? Ou melhor, uma viagem? Respirar novos ares.

- Mamãe, Dafne pode dar a luz a qualquer momento. Seria melhor se estivéssemos na cidade. Se Eva puxar a mãe, há grandes chances de ela querer nascer nos lugares mais inapropriados. - ela ri, concordando. - Sem contar que tenho outros planos em mente.

- E por acaso esses planos envolvem um moreno tatuado? - ela pergunta me olhando de soslaio, como se estivesse apreensiva por ter dito alguma bobagem. Respiro fundo. - Desculpa. Se não quiser falar sobre isso, eu vou entender. É que, eu via a forma como vocês dois eram juntos. Você estava tão feliz filha. Eu via tanto amor nos olhos dele. Sabe, Miguel é um ótimo rapaz, apesar do seu pai não gostar muito do estilo dele. Mas, todo o dinheiro que demos a ele, ele gastou com você, para o seu tratamento. Todo final de mês ele prestava contas sobre as despesas e...

- Mãe! - interrompo-a. Eu não queria entrar naquele assunto de novo. - Eu sei sobre tudo isso. Aliás, falar o nome de Miguel, o assunto é esse. Eu amo Miguel. E, ao contrário do que todo mundo pensa, quando papai disse aquilo eu fiquei com raiva dele sim, mas fiquei com mais raiva de mim, porque deixei me levar por tais emoções. O que eu posso dizer, em resumo, é que eu preciso fazer as coisas por mim, e não para agradar aos outros. Eu não quero depender de ninguém para ser feliz, sabe. E se eu não conseguir ser feliz sozinha, não conseguirei fazer outra pessoa feliz. O tempo irá dizer o que  futuro nos reserva. 

Ensaios de borboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora