Capítulo 10

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"Ser criativo é olhar para seu reflexo e ver mais do que uma doença. Somos humanos e humanos podem adoecer. É se permitir fazer as coisas que você gosta e quando quer, sem se amarrar em opiniões e convenções." (Diane Bergher)

Março de 2017 – Nona sessão

Abri os olhos um pouco confusa. Era como se meu corpo inteiro ainda estivesse dormindo. Tentei me mexer, mas foi em vão, tudo doía. Uma luz forte incendiava o meu quarto e o silêncio era desesperador.

— Bom dia! — a enfermeira entra com uma bandeja em mãos, sempre sorridente e animada. — Dormiu bem?

— Acho que sim? Que horas são?

— São nove horas — ela coloca a bandeja em cima da mesinha ao lado da cama e ajeita a mesma para que fique em uma posição mais confortável para comer. — Temos frutas, um pãozinho integral e um suquinho de laranja. — ela sempre fazia questão de narrar as refeições.

— Nove horas? Não me lembro da hora em que fui dormir.

Ela pega meus comprimidos os coloca em minha boca seguido de um copo d'água.

— A senhorita não se lembra?

Franzo o cenho vasculhando em minha memória o que havia acontecido no dia anterior. Cinthia, a enfermeira, cantarolava enquanto posicionava meu café a minha frente.

— Pelo visto hoje precisará de ajuda, certo?

Apenas murmurei um sim.

— Eu tive outra crise não foi?

Ela pega com o garfo e leva até minha boca. Eu detestava aquela situação, odiava depender de alguém para me alimentar, mas as dores estavam insuportáveis até para uma simples esticada de braço.

— Você e o doutor Miguel parecem ter entrado em uma discussão. Você desmaiou logo em seguida.

Enquanto Cinthia me alimentava eu lembrava vagamente daquela noite. Algumas palavras de Miguel insistiam em invadir minha mente, e o motivo pelo qual meus nervos afloraram também apareceram.

— Posso pedir uma coisa?

— Claro, o que deseja?

— Que suspendem o Miguel. Não quero mais nenhum psiquiatra. Meu caso não tem solução. — deixei uma lágrima rolar.

A enfermeira deixou o garfo suspenso no ar me olhando com os olhos arregalados. Uma mistura de surpresa e pena.

— Clarissa, todo problema tem uma solução.

— Eu sei. E só há uma solução para o meu caso, mas não me permitem fazê-la.

— Ora, não está dizendo que voltou com essa ideia? — ela estica o braço novamente a mim.

— Essa ideia nunca me saiu da cabeça.

— Essa não é a única solução. Miguel é um bom médico. Sem contar que ele é jovem, tem mais paciência e conhece novos métodos de tratamento.

— Ele é o pior psiquiatra que existe. Ele me deixa irritada, cansada, e por culpa dele eu tive outra crise de nervos. Que tipo de psiquiatra impede uma família de visitar um paciente?

— Ele teve os motivos dele.

— Seja lá qual for, pra mim já deu. Toda essa troca de médicos, toda essa coisa, é cansativa demais.

— Necessário para o seu tratamento.

— Eu já estou farta. Faz dois anos que me encontro na mesma.

Ensaios de borboletasOnde histórias criam vida. Descubra agora