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Karol


Não posso acreditar que estava nervosa sobre vir ao bar hoje, porque juro que
nunca me diverti tanto assim. Neste instante, estou espremida ao lado de Ruggero
no banco estofado da mesa, e estamos envolvidos num debate acalorado com
Lionel e jorge  sobre, entre outras coisas, tecnologia. Lionel  não abre mão de
sua opinião de que crianças e jovens não devem ser autorizados a assistir mais de
uma hora de TV por dia. Concordo totalmente, mas Ruggero  e jorge  não, e nós
quatro estamos trocando farpas sobre a questão há mais de vinte minutos. Tenho
vergonha de admitir, mas sinceramente não esperava que todos esses jogadores de
hóquei tivessem opiniões articuladas sobre assuntos não relacionados ao esporte,
mas eles são muito mais perspicazes do que eu imaginava.
“As crianças têm que ir para a rua, andar de bicicleta, caçar sapos e subir em
árvore”
, insiste lionel , balançando o copo de cerveja no ar para dar ênfase. “Não é
saudável ficar enfiado dentro de casa olhando para uma tela o dia todo.”
“Concordo com tudo, menos com a parte dos sapos”
, intervenho. “Porque sapos
são pegajosos e nojentos.”
Os caras começaram a rir.
“Fresca”
, brinca lionel
“Ah, como assim, karol, dá uma chance pros sapos”
, protesta jorge . “Você
sabia que, se lamber o certo, dá um barato legal?”
Olho para ele horrorizada. “Não tenho o menor interesse em lamber sapos.”
Jorge  pergunta: “Nem para ficar com o príncipe?”.
A mesa inteira solta uma exclamação animada.
“Não, nem assim”
, afirmo, decidida.
LLionel dá um gole demorado na cerveja antes de se voltar para mim. “E que tal
lamber algo diferente de um sapo? Ou você é contrária a lambidas de forma
geral?”
Minhas bochechas ardem diante da sugestão, mas o brilho travesso em seus
olhos me diz que não está tentando ser grosso, então respondo com minha
própria dose de insinuações. “Ah, sou a favor de lambidas, sim. Desde que esteja lambendo algo saboroso.”
Outra rodada de exclamações animadas, mas da qual Ruggero  não participa.
Quando me viro para ele, vejo que seus olhos se inflamaram.
Eu me pergunto se está imaginando minha boca no… não, não vou nem falar.
“Merda, alguém precisa amarrar aquele velho pra ele parar de monopolizar o
jukebox”
, declara jorge , quando mais uma música do Black Sabbath berra nas
caixas de som do bar.
Todos nos viramos na direção do culpado — um frequentador do bar com uma
barba ruiva espessa e a cara mais malvada que já vi. No instante em que o karaokê
acabou, Barba Ruiva correu para o jukebox, enfiou dez dólares em moedas de
vinte e cinco centavos e digitou uma lista de rock que até agora consiste em Black
Sabbath, Black Sabbath e mais Black Sabbath. Ah, e uma música do Creedence que
Jorge  alegou estar ouvindo quando perdeu a virgindade.
Por fim, nosso debate se volta para o hóquei, com jorge  tentando me
convencer de que o goleiro é o jogador mais importante do time, enquanto lionel
o vaia o tempo inteiro. A música do Black Sabbath enfim acaba e é substituída por
“Tuesday’s Gone”
, do Lynyrd Skynyrd. É só os acordes de abertura ecoarem pelo
bar, que sinto Ruggero  se enrijecendo ao meu lado.
“Qual o problema?”
, pergunto.
“Nada.” Ruggero  limpa a garganta, em seguida se levanta e me puxa com ele.
“Dança comigo.”
“Com esta música?” Fico perplexa por um momento, até que lembro que ele é
apaixonado por Lynyrd Skynyrd. Aliás, tenho certeza de que esta música estava na
lista que me mandou na semana passada.
Do outro lado da mesa, jorge solta um riso de desdém. “Desde quando você
dança, R.?”
“Desde agora”
, murmura Ruggero .
Ele me leva até a pequena pista em frente ao palco, que está completamente
vazia, sem ninguém dançando. Sinto o desconforto varar meu corpo, mas quando
Ruggero  estende a mão, hesito apenas por um segundo antes de segurá-la. Ei, se ele
quer dançar, então vamos dançar. É o mínimo que posso fazer, considerando o
quão incrível esta noite está sendo.
Você pode falar um monte de coisas de Ruggero , mas ele definitivamente
é um homem de palavra. Passou a noite colado em mim, tomando conta das
minhas bebidas, me esperando fora do banheiro, certificando-se de que não sou
assediada por seus amigos nem pelas pessoas que conhecemos no bar. Ruggero  me
apoiou por inteiro, e, por causa dele, fui capaz de relaxar e curtir pela primeira vez em muito tempo.
Deus. Não acredito que sempre achei que ele não fosse um cara legal.
“Sabe que essa música tem sete minutos, não sabe?”
, ressalto, ao pisarmos na
pista de dança.
“Sei.” Seu tom é descontraído. Linear. Mas tenho a estranha sensação de que está
chateado com alguma coisa.
Ruggero  não gruda o corpo no meu nem tenta se esfregar. Em vez disso,
dançamos como vi meus pais fazerem, com a mão de Ruggero  no meu quadril e a
outra envolvendo minha mão direita. Descanso a mão livre em seu ombro, e ele
abaixa a cabeça e aperta o rosto no meu. Sua barba por fazer cria uma sensação
provocante em meu rosto, arrepiando meus braços nus. Quando inspiro, seu
perfume almiscarado enche meus pulmões, e sinto uma leve vertigem.
Não sei o que está acontecendo comigo. Me sinto com calor e excitada — é o
álcool, digo a mim mesma. Tem que ser. Porque Ruggero  e eu concordamos que
somos apenas amigos.
“jorge tá se divertindo”
, comento, principalmente porque estou desesperada para
me distrair de meus hormônios.
Ruggero  segue meu olhar até a mesa lá atrás, onde jorge  está enfiado entre duas
louras, que estão mordiscando seu pescoço muito ansiosas. “É. Acho que sim.”
Seus olhos castanhos  têm um olhar distante. Seu tom ausente deixa claro que
não está interessado em bater papo, então fico em silêncio e me esforço para não
me deixar afetar por sua masculinidade irresistível.
Mas cada vez que sua barba arranha meu rosto, os arrepios pioram. E cada vez
que sinto sua respiração em meu queixo, uma onda de calafrios desce por minha
coluna. O calor de seu corpo invade o meu, seu cheiro me rodeia, e estou
terrivelmente consciente de sua mão quente segurando a minha. Antes que eu
possa me impedir, esfrego o polegar no centro de sua palma.
A respiração de Ruggero  se acelera.
É, tem que ser o álcool. Não tem outra explicação para as sensações varando
meu corpo. A dor em meus seios, os músculos das coxas se enrijecendo e o vazio
estranho dentro de mim.
Quando a música termina, exalo um suspiro de alívio e dou um tão necessário
passo para trás.
“Obrigado pela dança”
, murmura Ruggero .
Posso estar embriagada, mas não estou bêbada, e detecto a tristeza irradiando de
seu peito largo na mesma hora.
“Ei”
, digo, preocupada. “O que foi?”

Era Uma Vez Na Grécia (Terminada)Onde histórias criam vida. Descubra agora