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Ruggero


Metade dos caras na sala de musculação está com uma ressaca tremenda. Mas
eu, por incrível que pareça, não. Não, as revelações desta manhã espantaram
consideravelmente qualquer dor de cabeça ou náusea que pudesse ter sentido.
Karol  foi estuprada.
Essas três palavras estão flutuando na minha cabeça desde que a deixei em seu
alojamento, e toda vez que aparecem, uma fúria em brasa explode dentro de mim
feito um trem de carga. Queria que tivesse me dito o nome, o número do telefone,
o endereço do filho da puta.
Mas é melhor que não tenha dito, caso contrário, provavelmente estaria no meu
carro agora a caminho de cometer um assassinato.
Quem quer que tenha sido, peço a Deus que tenha pagado pelo que fez a
Karol . Que esteja apodrecendo na prisão neste momento. Ou melhor, que tenha
morrido.
“Mais dois.” Agustín  paira sobre mim, enquanto estou deitado no supino.
“Vamos, cara, que moleza é essa?”
Expiro e envolvo os dedos na barra. Canalizo toda a minha raiva em levantar os
pesos sobre a cabeça, enquanto Agustín  me acompanha do alto. Depois que termino
a última série, ele coloca a barra no lugar e me estende a mão. Deixo que me
levante, e trocamos de posição.
Preciso botar a cabeça no lugar. Ainda bem que não estamos no gelo hoje,
porque no momento não tenho certeza se ainda sei andar de patins.
Karol  foi estuprada.
E agora quer transar comigo.
Não, quer que eu a conserte.
Puta merda. O que estava pensando quando concordei com isso? Quis essa
menina nua desde o primeiro beijo, mas não assim. Não como um experimento
sexual. Não com tanta pressão para… para quê? Fazer com que seja bom para ela?
Não decepcioná-la?
“Não precisa ter pressa”
, zomba Agustín
Afasto os pensamentos angustiados e percebo que ele está me esperando colocar
a barra em suas mãos.
Inspiro e tento me concentrar em garantir que Agustín  não morra sob minha
guarda, em vez de ficar paranoico a respeito de karol .
“Então, tô puto com você”
, diz ele, flexionando os braços e trazendo a barra para
junto do peito. Em seguida expira e eleva a barra novamente.
“O que fiz agora?”
, pergunto, com um suspiro.
“Você me disse que não tava interessado em karol ”
Meu peito fica tenso, mas finjo indiferença enquanto conto suas repetições.
“Não tava, pelo menos não quando falamos disso.”
Agustín  solta um grunhido toda vez que estende os braços. Estamos os dois
levantando uns dez quilos a menos que o habitual, porque com a bebedeira da
noite passada ninguém aqui está funcionando cem por cento hoje.
“E agora você tá interessado, então?”
Engulo em seco. “Tô. Acho que sim.”
Agustín  não diz mais nada. Meus dedos pairam sob a barra enquanto ele termina
suas repetições.
Mantenho um dos olhos atento ao relógio acima da porta da sala de
musculação. São quase cinco. Karol sai do trabalho às dez e vai direto para a
minha casa.
E a gente vai transar.
A tensão em meu intestino aumenta, acumulando-se num nó gigante. Não
tenho ideia se sou capaz disso. Tenho pavor de fazer algo errado. De machucá-la.
“Não me surpreende que você tenha percebido seu erro”
, diz Agustín afinal,
enquanto trocamos de lugar de novo. “Ela é legal pra caralho. Percebi no
momento em que a vi.”
Sim, karol  é legal. Também é bonita, inteligente, engraçada.
E não está quebrada.
A pressão em meu estômago alivia à medida que me apego a esse último
pensamento. Foi por isso que concordei em dormir com ela, porque não importa o
que tenha acontecido no passado, não importa quantas cicatrizes ainda carregue
daquele calvário, não tenho um pingo de dúvida de que karol  não está
quebrada. Ela é forte demais para permitir que qualquer um — principalmente
um filho da puta de um estuprador de ensino médio — a quebre.
Não, o que está faltando é a capacidade de confiar no outro, e, em certa medida,
em si mesma. Ela só precisa de alguém para… guiá-la, na falta de uma palavra
melhor.
Mas, merda, será que esse alguém precisa mesmo ser eu? Não tenho a menor
ideia da etiqueta necessária para dormir com uma vítima de estupro.
“Mas, enfim, talvez eu não esteja chateado por você ter chegado primeiro”
,
completa Agustín
Lanço-lhe um leve sorriso. “Poxa, valeu.”
Ele sorri de volta. “Dito isso, peço isenção do trecho no código da camaradagem
que afirma que não posso namorar alguém com quem você terminou.”
Meus dedos se enrijecem em torno da barra. Nem pensar. A ideia de Agustín  com
Karol me faz querer dar uma de He-Man com esta barra e atirá-la do outro lado
da sala. Mas, ao mesmo tempo, tenho certeza de que não existe a menor chance de
Karol  sair com Agustín , principalmente agora que sei sobre seus complexos.
Então, dou de ombros casualmente e digo: “Isenção concedida”.
“Ótimo. Agora vou botar mais cinco quilos nessa belezura aqui, porque, sério,
R., somos melhores do que isso.”
Os próximos trinta minutos voam. A sala fica vazia, foi todo mundo para os
chuveiros. Mas quando vejo que Birdie ainda está na barra fixa do outro lado da
sala, caminho até ele.
“Ei, cara, tem um tempinho?”
, pergunto, enxugando a minha testa suada com
uma toalha.
Ele solta a barra, e seus tênis pousam no colchão azul de ginástica. Então pega a
própria toalha. “Claro. O que foi?”
Hesito. Jogadores de hóquei não são do tipo que se abrem uns para os outros
feito mulherezinhas. Na maioria das vezes, jogamos conversa fora no vestiário ou
trocamos insultos, com raros papos mais sérios.
Jake “Birdie” Berderon é a exceção à regra. Aluno do último ano, alto e
corpulento, é quem você procura quando precisa de um conselho, quem você
chama quando está com um problema, o cara que vai largar tudo o que estiver
fazendo só para ajudar. Na temporada passada, quando metade dos jogadores mais
velhos se formaram e estavam acontecendo as indicações para capitão, disse a
Birdie que se ele quisesse o posto, eu o apoiaria cem por cento. Ele me cortou
logo, insistindo que era péssimo em animar o time e que preferia jogar mais a
liderar, mas no fundo sei que Birdie é o nosso líder de verdade. Não existe
ninguém melhor. Sem brincadeira.
Dou uma olhada na porta aberta, em seguida, abaixo a voz. “Isso tem que ficar
entre nós, tudo bem?”
Um sorriso irônico levanta seus lábios. “Cara, se você soubesse quantos segredos
estão flutuando nesta minha cabeça grande, enlouqueceria. Confia em mim, sei  manter a boca fechada.”
Despenco no banco de madeira comprido contra a parede e descanso as mãos
sobre os joelhos. Não sei por onde começar, mas sei que não posso dizer a
verdade. Isso é algo que só Hannah tem o direito de compartilhar.
“Já dormiu com uma virgem?”
, arrisco.
Ele pisca. “Hmm. Certo. Bom, já. Já dormi.” Birdie senta ao meu lado. “Cá entre
nós?”
, pergunta.
“Claro.”
“Nat era virgem quando começamos.” Nat, na verdade, é Natalie, a namorada de
Birdie desde o primeiro ano. Os dois são aquela espécie de “o” casal, do qual todos
zombam por serem nojentos de tão perfeitos, embora no fundo todo mundo tenha
inveja do relacionamento deles.
Tenho que perguntar: “Você também era?”.
Ele sorri. “Não. Compareci a esse departamento aos quinze anos.”
Quinze anos. A idade de karol  quando foi… de repente me pergunto se aquilo
foi a sua primeira vez, e o horror fecha minha garganta. Meu Deus. Perder a
virgindade é uma questão importante para algumas garotas — não posso nem
imaginar como seria ter isso tirado de você.
“Por quê? Tem um encontro com uma virgenzinha gostosa?”
, brinca Birdie.
“Algo assim.” Considerando que conheceu karol ontem à noite no Malone’s,
tenho certeza de que Birdie é capaz de ligar uma coisa à outra, mas sei que não vai
comentar com ninguém.
E acho que essa história de virgem é mais segura do que proferir as palavras
vítima de estupro. Afinal, a abordagem de se dormir com uma não pode ser tão
diferente assim de se dormir com outra. Em ambos os casos, você precisa ser
paciente, respeitoso e cuidadoso, certo?
“Então, o que você fez para a primeira vez de Nat?”
, pergunto, sem jeito.
“Honestamente? Só tentei deixá-la confortável.” Birdie dá de ombros. “Ela não
curte aquela palhaçada toda de flores, velas e pétalas de rosa na cama. Não queria
fazer da situação uma coisa grande demais.” Outro dar de ombros. “Mas algumas
meninas fazem questão da produção toda. Então, acho que a primeira coisa no seu
caso é descobrir que tipo de garota ela é. Discreta ou super-romântica.”
Penso em karol  e em toda a pressão que está passando para ser “normal” —
que deve ser um milhão de vezes pior do que a pressão que eu estou sentindo no
momento —, e, na mesma hora, sei a resposta.
“Definitivamente discreta. Acho que velas e pétalas de rosa a deixariam
nervosa.”

Era Uma Vez Na Grécia (Terminada)Onde histórias criam vida. Descubra agora