Eu sei que minha declaração caiu como uma bomba sobre Ágata.
— Como assim, Nick? — Ágata me olhava espantada.
— Vou te contar tudo e espero que você me escute até o final, por favor. É uma parte da minha vida fechada a sete chaves do qual eu não pretendia abrir, não antes de você, agora sinto necessidade de contar, porque se for preciso pra lhe manter segura eu irei abri-la novamente.Respirando fundo e munido de coragem comecei a abrir meu coração para aquela que seria o meu recomeço.
— Tudo começou quando eu tinha 11 anos, eu e minha família voltamos ao Brasil, mas desta vez não seria por férias, pois seria nossa moradia definitiva. — suspirei— Meu pai havia investido suas últimas fichas na ideia de abrir a empresa. Meus pais eram o típico casal do comercial de margarina, minha mãe sempre foi muito apaixonada por ele, parecia feliz e satisfeita. Os anos foi passando e meu pai mudando, mas minha mãe justificativa suas mudanças e ausência ao trabalho. — sorri em deboche— Quando eu estava com 15 anos, minha mãe precisou fazer uma viajem, pois meu avô havia falecido e ela precisava da suporte a minha avó, nós não fomos por conta do colégio e meu pai por conta do trabalho.
Era semana de prova, eu era um bom aluno até então, atleta da escola, praticava Jiu-Jitsu desde 6 anos, terminei a prova e voltei para casa.
Quando estava subindo em direção ao meu quarto, ouvi vozes vindo do quarto de meus pais, fiquei feliz pensando ser minha mãe que havia chegado, então acabei entrando sem bater a porta e vi meu pai transando com sua secretária na cama da minha mãe.
— Nossa Nick, deve ter sido horrível. — afirmou Ágata.
— É, foi horrível, naquele momento eu havia entendido que meu pai e a família perfeita era uma mentira.
Pensei em contar pra minha mãe, mas ela não aguentaria saber a verdade, pois acabará de perder o seu pai. Eu passei dias, meses, remoendo a cena bizarra em minha mente e esperar uma boa oportunidade para conta-la. No final, não tive coragem, mas mudei de comportamento, porque bancar a família perfeita não fazia mais sentido pra mim. Logo comecei me envolver em problemas com álcool e consequentemente drogas, sempre que meu pai tentava intervir ele acabava passando a mão na minha cabeça porque estava com o rabo preso. Pra evitar problemas maiores quando concluí o ensino médio, me enviaram para fazer a faculdade na minha cidade natal, Cambridge.Ágata prestava atenção a tudo que eu falava.
— Nos primeiros dias eu já havia me enturmado com um pessoal, logo estava usando drogas e bebendo descontroladamente. Uma noite, o pessoal havia ido a um bar perto da faculdade, estava tudo bem até que um cara esbarrou em mim, eu tinha problemas em lhe dar com a agressividade, toda vida pratiquei luta, afim de amenizar isso.
Então o cara partiu pra cima de mim, ele era mais velho e possuía o dobro do meu tamanho, eu era só uma garoto problemático de 17 anos, mas acabei revidando e com as técnicas certas somada a minha raiva descomunal, o cara acabou se machucando feito, tempo depois eu soube que ele não resistiu a um traumatismos.
— Nick! Meu Deus! — Ágata, assustada, levou uma de suas mãos a boca e com a outra tentou tocar meu antebraço, como consolo, mas recuei.— Não! Me deixe continuar a falar, antes que minha coragem de conta-la se vá. Depois do que direi, não sei se ainda assim irá querer me tocar.
Dito isso, ela recuou.
— O fato é que o cara que briguei fazia parte de uma facção criminosa, mais precisamente um braço da máfia italiana em Cambridge. No dia seguinte fui capturado por eles, pensei que iria morrer, mas para minha derrota, e surpresa, eles me fizeram lutar por minha vida e assim o fiz, lutei contra um de seus melhores homens e ganhei. Mesmo assim, meu inferno só estava começando, após ganhar eles não me deram a liberdade, pelo contrário, só me manteriam vivo se eu lutasse para eles em suas lutas clandestinas, e quando necessário fizesse alguns serviços.
— Que tipo de serviços? — Ágata temia oque eu poderia dizer, era nítido em seu olhar.
— Sequestro, cobrança de dividas, fazia de tudo. — confessei envergonhado.
— Você matou pessoas? — podia sentir o medo se forma em seu rosto.
— Não! Juro pela vida de Olívia, eu os capturava e entregava aos outros soldados.
— Mas você disse que matou seu pai?
— Tem razão, eu o matei, não diretamente, mas indiretamente minhas atitudes foram seu caminho até sua morte. Enfim, passei muito tempo me dividindo entre a faculdade, e a vida noturna da máfia, oque me levou ao vício em drogas pesadas, para me manter acordado.
Não desisti da faculdade mesmo com todas as dificuldade, pois era um sonho da minha mãe me ver formado e um sonho meu desde menino, quando desenhava casas e prédios e fingia que eram projetos para meu pai. — sorri ao me recordar — Durante os anos de faculdade não voltei ao Brasil, não mantive contato com meu pai, raramente falava com minha mãe, só falava um pouco mais com a minha irmã, que me ligava e passava o relatório de como as coisas estavam.
No último semestre de faculdade as coisas estavam difíceis, pois no submundo, como diziam "a família" estava em guerra.
O chefe havia sido assassinado por uma facção inimiga, e afim de pegar o culpado teríamos que armar uma emboscada, como isca eu teria que me passar por filho do chefe, assim seria alvo também e quando os inimigos me capturassem, através de um localizador colocado em meu relógio eu seria achado e o covil do inimigo exterminado. Infelizmente as coisas não saíram como planejado, de algum modo a facção inimiga descobriu que eu não era o filho do chefe, era apenas um dos soldados.
Fui torturado, eles queriam saber quem era o filho do chefe. Aguentei firme, até que pensei que não aguentaria mais, então fui resgatado em estado crítico.
Dado meu estado, o hospital entrou em contato com meu pai, através de meu celular. — lágrimas rolaram em meu rosto — Oque sei depois disso é oque minha irmã me contou, ela estava com meu pai na hora que recebeu a ligação, ela disse que ele teve um infarto ao saber meu estado, e que haverá morrido pedindo perdão e chamando meu nome. Eu matei meu pai.
— Não, não matou, Nick. Foi uma fatalidade, uma sucessão de acontecimentos, você era só um garoto, estava revoltado, magoado. Seu pai deveria ter tentando não falhar mais com você, mas ele falhou novamente, deixou você ir, se afastar. Por isso ele morreu se culpando.
Não vê? É o mesmo que aconteceu comigo, meus pais morreram por minha causa, porque queriam me dá uma vida melhor, uma educação melhor, aceitaram ajuda de um estranho e acabaram mortos.
— Sinto muito não ser oque você pensou. Sinto muito não ser um homem perfeito, mas se você não quiser mais estar comigo, vou lhe entender — eu não conseguia falar olhando para ela.
— Nick, nada que você fez foi intencional, você não acabou nessa situação por escolha sua, você só foi vítima de uma sucessão de acontecimentos. Você não é um mostro! — disse ao tocar meu rosto com sua palma delicada — Eu conheci um mostro, e você está mais para anjo, meu anjo.Me rendi ao seu toque, aceitando seu abraço. Naquele momento a sensação que tinha era de que havia retirado o peso de um mundo que carreguei nas costas por longos 10 anos.
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Indicação de música para este capítulo: Life's Work · Stephen Porter
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Recomeçar
RomansaÁgata Andrade, 18 anos, é uma linda jovem com marcas profundas e cruéis para sua pouca idade. Nascida numa pequena cidade do interior, filha única de Mário Andrade e de Dona Marina. Um trágico acidente põe fim na vida dos pais da jovem garota, mas...