Capítulo-33

69 5 0
                                    

O Westfield Mall, na rua Market, em San Francisco, é um shopping center urbano e exclusivo, que abriga um conjunto de 170 lojas e butiques de moda dedicadas a consumidores modernos e elegantes. Calvin Klein, Hugo Boss e Ann Taylor. Banana Republic, Tommy Bahama e Lucky Brand Jeans. Doces Beard Papa, chocolates Godiva e Juicy Couture. Na verdade, embora literalmente signifique costura suculenta, a Juicy Couture vende mais acessórios de moda do que confecções, mas, quando meninas de treze anos andam por aí vestindo a palavra "suculenta" em seus traseiros, enviam uma mensagem dúbia sobre o que há no cardápio.
Com seu quase 1,5 milhão de metros quadrados de satisfação para o cliente, o Westfield Mall também tem uma Bloomingdale's, uma Nordstrom, três lojas da Bebe, nove varejistas de óculos de sol, dezessete pontos avulsos dedicados a saúde e beleza, e vinte e seis joalherias. O shopping ainda tem serviços de portaria, de estacionamento com manobrista e um spa de um dia.
Você poderia pensar que, com todo o dinheiro que eles enterraram neste lugar, poderiam ter dado um jeito de abrir espaço para um Hot Dog on a Stick ou um Orange Julius, mas o menor denominador comum de nutrição que consigo encontrar na praça de alimentação é um Panda Express e um Jamba Juice.
Então, enquanto me sento em um sofá reclinado para degustar meu frango com laranja e beber meu suculento Orange Dream Machine enriquecido de proteína de soja, observo todos os viciados em shopping centers com suas sacolas de grife e suprimentos de ácido para distraí-los e não se concentrar em seu futuro.
A dona de casa de cinqüenta e dois anos de idade que não faz sexo com seu marido há seis meses e que está cogitando a possibilidade de ter um caso só para sentir, de novo, o toque amoroso e faminto de um homem, O gerente do Banana Republic, um jovem de vinte e nove anos que não consegue ter o suficiente de sua esposa, mas espera que tenham o suficiente em comum fora do quarto para conseguir manter seu casamento.
A mãe de dois filhos, uma divorciada de quarenta anos de idade que prefere continuar com um namorado que não ama do que se dar a oportu- nidade de abrir o coração para outro homem que a ame verdadeiramente, Os relacionamentos parecem estar no auge da popularidade. Eu vejo isso todo o tempo: homens e mulheres que permanecem estagnados em relacionamentos ou que optam por não entrar em novos porque é mais fácil do que ficar sozinhos ou começar do nada. Eles ficam em suas zonas de conforto e familiaridade em algo que não funciona em vez de ter a coragem de correr riscos em uma possibilidade que possa lhes trazer felicidade. Algo que possa levá-los ao futuro que sempre almejaram. Algo que possa, de fato, envolver o perigo de ter o coração partido. Preferem o conforto de suas caixas.
Então, contentam-se com menos do que desejam. Contentam-se com relacionamentos medíocres e romances mornos e distantes parceiros de cama. E, de fato, acabam por aqui mesmo. Ou em algum lugar como este. Talvez em algum lugar com lojas como Hickory Farms ou JCPenney ou Beck's Shoes, em vez de Bristol Farms, Bloomingdale's ou Kenneth Cole.
Mas, independentemente do lugar, todos eles servem ao mesmo propósito.
Compras ajudam a ocultar o que vai mal em um relacionamento. Talvez não tanto como um bom sexo, mas se pode comprar algo bonito para si, mimar- se com um par de sapatos ou com aquele relógio no qual você está de olho, ou algumas horas em um spa diário, você pode se sentir melhor intimamente e isso ajuda a se sentir melhor diante de seu relacionamento. Ao menos por um tempinho. Até que perceba que está apenas mascarando a causa de seu próprio sofrimento. Estou aqui para acabar com isso.
- Senhoras e senhores - digo, subindo em uma jardineira, no centro da recepção. Provavelmente não a maneira mais sutil de apresentar minha opinião, mas estou diante de um monte de desafios quanto a consertar relacionamentos de seres humanos e não quero fazer isso aos poucos. - Posso ter um minuto da sua atenção, por favor? Alguns clientes entediados olham em minha direção. O resto me ignora e vai em direção à Aveda ou à Banana Republic ou à Sunglass Hut International. Então, tento novamente, mas agora em minha melhor personificação de Jerry. - Posso ter um minuto da sua atenção, por favor?
Desta vez eu consigo, e muitos deles não apenas olham para mim como param o que estão fazendo e começam a andar até onde estou. É assombroso o que você consegue quando soa como Deus. O problema é que há uma enorme diferença entre soar como Jerry e ser Jerry, que tem uma aura que eu simplesmente não posso emular, não importa o quanto omni-qualquer-coisa- que-seja eu tente projetar. Então tenho um limitado espaço de oportunidade para apresentar meu ponto de vista. Provavelmente, esses humanos vão perceber que sou uma fraude e tenho de convencê-los de sua inépcia emocional antes que eles cheguem àquela conclusão. Ou antes que a segurança do shopping apareça.
- Vocês não têm de sofrer - digo. - Não têm de enfrentar uma vida de enganos. Vocês são os mestres de sua própria felicidade.
Embora não seja inteiramente verdade, soa bem. Ou, ao menos, soava quando eu ouvi no rádio. Mas pelas expressões em branco que observo nos humanos que ficam me encarando, eles não têm a menor idéia do que estou falando. Então percebo que simplesmente deveria baixar o nível intelectual do discurso.
- Vejam - digo. - Vocês não precisam de toda essa merda para ser felizes. Para se sentirem mais atraentes. Para preencher o vazio emocional de suas vidas. Não precisam da camisa Roberto Cavalli ou dos tênis Dior ou dos óculos de sol Versace para se compensar de seus relacionamentos fracassados. Tudo bem, talvez ele sim... - falo, apontando para um sujeito de trinta e dois anos que é uma reprodução do boneco Ken e que está usando todos os três. - Mas, para o restante de vocês, ainda há esperança.
Um andar acima de mim, eu vejo uns lampejos da segurança do shopping na escada rolante.
- Você - eu digo, apontando para um desastrado de trinta anos que acaba de comprar, para sua namorada, um par de brincos de diamante, para compensar o fato de estar sendo desafiado emocionalmente. - Ela não quer jóias. Ela apenas deseja que você seja honesto e compassivo. Ele olha em volta, sorrindo timidamente.
- Vocês. - Aponto para um jovem casal que tem rotineiros bate-bocas sobre assentos de vaso sanitário, compras e ordem alfabética na coleção de CDs.
- Não importa que ele seja obsessivo ou que ela espalhe seu lixo por toda a parte. O que importa é que vocês se aceitem, um ao outro, por causa de suas falhas, não apesar delas.
- Ele está certo - diz a moça, olhando para o marido.
- Como queira - ele diz, depois se volta e se afasta, enquanto a esposa
o segue, o começo de uma briga aflorando nos lábios dela.
Ao menos eu tentei.
Pelo canto do olho, vejo que os guardas estão descendo pela escada rolante.
- E você - falo desta vez dirigindo meu indicador à mãe de dois filhos divorciada de quarenta anos que escolheu a segurança medíocre em vez do risco de um amor verdadeiro. - Largue seu namorado de potencial tão baixo e abra seu coração para a intimidade emocional.
E foi só o que tive tempo de fazer antes que dois seguranças chegassem e me pedissem para descer da jardineira.
- Bem, foi divertido - digo. - Vocês foram uma plateia maravilhosa. Eu espero que tenham apreciado o show. Lembrem-se apenas: não vão para a cama com raiva, nunca se contentem com menos e sempre comam seus vegetais.
Com isso eu me inclino, tiro um chapéu imaginário e depois sigo a trajetória de meu chapéu imaginário, desaparecendo num piscar de olhos.

DesastreOnde histórias criam vida. Descubra agora