Capítulo-13

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Estou no jardim da cobertura de meu prédio de apartamentos, tomando banho de sol nu e pensando em Sara. Não daquele jeito sexual, com direito à fantasia de copeira e tudo. Estou pensando sobre seu sorriso e sua maneira de andar e a forma como franze o nariz quando está falando. Estou pensando sobre seu perfume e sua voz e o jeito que ela dá risada vendo filmes, sozinha em seu apartamento. Estou pensando sobre como perco um montão de tempo observando-a e como me sinto excitado quando estou perto dela e por que não tomo coragem de falar com ela.

Aqui estou eu, uma entidade imortal, existente desde os primórdios do ser humano, e com medo de falar com uma inofensiva fêmea do gênero. Meus pais iam ficar tão orgulhosos!

Embora tecnicamente eu não tenha pais. Acho que Necessidade poderia ser considerada minha mãe, mais do que isso seria ir longe demais. Jerry é a coisa mais próxima de um pai que eu tenho, e você não imagina o quanto isso me envergonha.

Tive três meio-irmãs durante um tempinho - Clotho, Lachesis e Atropos, as quais nasceram durante o apogeu da cultura e da mitologia da Grécia. Nunca se importaram comigo. Elas me consideravam um ultrapassado, um inútil, uma relíquia da Idade da Pedra. Elas se achavam o máximo, com aqueles seus vestidos brancos na última moda e sua imagem de "fio da vida". Chegaram até a compor uma coleção de hinos. Conheça as Moiras. Incluía canções como "Eu corto a sua linha", "Sua sina é minha" e o clássico de fim de ano "Você não chegará em casa para o Hanuca".

Não vendeu muito bem. Naquela época, os humanos não estavam interessados em gastar suas dracmas duramente conquistadas em uma composição musical autocentrada criada por um trio de hárpias sem coração.

E quando a era dourada grega chegou ao fim, mil e quinhentos anos depois, aquelas três megerinhas perceberam que fundamentar seu futuro em uma mitologia em decadência é um passo errado em termos de carreira. Pense em Ramsés ignorando os avisos de Moisés. Pense na batalha do general Custer, em Little Bighorn. Pense em Gigli, em Contato de risco.

Mas na verdade eu não sou exatamente qualificado para criticar escolhas vocacionais. Eu me apaixonei por uma mulher mortal que está na Trilha de Destino, o que é um bom motivo para você ser rebaixado a algo como Enfermidade ou Incesto.

Não é onde me vejo, nem morto.

O problema é que estou loucamente apaixonado por Sara, de maneira que não posso simplesmente esquecer a coisa. Já pensei em mudar para outro edifício, assim não teria a tentação ao alcance das mãos, mas me apeguei ao jardim da cobertura. Ele me lembra muito o do Éden. O que realmente não ajuda muito, com todo aquele cenário tentador.

Mas mesmo que eu me mudasse para o Brooklyn ou para o Queens ou para outra parte de Long Island, ainda assim saberia onde Sara vive e trabalha e quando ela costuma tomar uma sauna a vapor em sua academia. Depois, eu odeio empacotar coisas. E teria de reconfigurar minha conexão de banda larga,

o que é um saco. Portanto, excluí "mudança" de minha lista.

Eu poderia ver se Memória poderia fazer algo por mim, como excluir Sara de meu banco de dados. Mas Memória pode ser muito seletiva às vezes, e realmente seria capaz de fazer um estrago danado. A última coisa que eu quero é acabar vagando por aí nas próximas centenas de anos tentando achar onde é que deixei as minhas chaves.

Então fico com meu apartamento do Upper East Side e com meus sentimentos por Sara e com a noção geral de que não tenho a menor idéia do que deveria fazer.

Em momentos como este, eu gosto de meditar. E nada melhor para distender a mente e procurar alguma clareza do que tomar um banho de sol invisível e nu no meu jardim da cobertura.

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