Capítulo 70

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Antes de sairmos do motel, Juan me segura para parar e olha seriamente para mim.

- Antes de tudo muchacha, preciso que entenda algumas coisas, estamos em crise social aqui, há soldados armados, há rebeldes nas ruas, pode ser que haja algum confronto em algum momento, acontece inesperadamente, o que eu quero é que você não saia da minha vista, ou melhor não pode sair de perto de mim, aconteça o que acontecer, estamos indo para um lugar seguro, mas até lá , se algo acontecer, não se distancie, tudo bem?

Se ele soubesse quem sou, não estaria preocupado assim comigo, mas acenei concordando, não poderia explicar o porquê que não preciso de proteção mesmo, as vezes só aceitar e seguir é o melhor remédio.

Seguimos, ele me guiou até o carro, uma música do tipo antiga tocava baixo nos alto-falantes, era uma melodia diferente do que tocava na televisão, era gostosa de escutar, relaxante.

- Essa música não parece ser igual ao que tocava na televisão.

- É porque não é, é um músico local, antigo, Luis Enrique Mejía Godoy, disco de 1977, músicas tiradas de um disco de vinil, gostou?

- Muito.

- Aproveite meu gosto musical, mas já aviso, que para onde vamos não tem nada a ver com isso.

- É parecido com o que?

- Nas ruas vai estar provavelmente tocando músicas de cantores como JavyDade, tipo reggaeton, ou Lil Shiken, rap, rebelde, defesa musical de Nicaragua, Nicaragua livre, essas coisas.

- Rap é a música das ruas, é o coração das pessoas que fala.

- Exatamente.

- Isso na rua, mas e para onde vamos?

- Uma boate.

- Vão pedir meus documentos?

- Não se preocupe com isso.

A noite parecia estar em câmera lenta, tudo passava lento e calmo, parece que era guiada pela calmaria das músicas. Passamos por algumas ruas, vi pessoas com lenços nos rostos, pichando muros, ruas semiescuras, alguns tacando fogo em alguma coisa em lixeiras, era uma visão horripilante, não tinha visto quase nada da cidade, mas podia sentir o medo, a dor, o sofrimento destes habitantes, podia até me sentir mal por estar indo me divertir naquele momento, mas não podia fazer nada para ajudar.

Desviei os olhos da janela lateral focando na pista, Juan percebeu que eu estava evitando de olhar para aquelas cenas.

- As pessoas e a presidência estão em lados opostos, estão afundando o país e ninguém enxerga, mas vamos vivendo.

Olhei para ele interessada no assunto.

- Me conta mais sobre o país.

- Temos paisagens deslumbrantes, vulcões, praias, lagos, paisagens naturais, rico em fauna e flora, a arquitetura tem raízes espanholas, o maior país da América Central em território, de grande produção agrícola de café, banana e algodão, temos muito minério, extração de ouro, prata e cobre, e o turismo tem crescido bastante por aqui também.

- Parece ser um país incrível.

- E é, temos orgulho da terra que habitamos, apesar da situação política estar sempre instável, o povo daqui é perseverante.

Assenti e voltei a olhar para fora.

- Estamos chegando, pronta?

- Não, mas vamos lá.

Ele riu e estacionou, o lugar estava cheio, muitos jovens em carros, música alta, rindo, bebendo, mulheres maravilhosas andando de um lado para outro em roupas tão curtas quanto as que eu estava, corpos bronzeados, exalando sedução.

- Não fique olhando assim para todos.

- Olhando como?

- Como se quisesse comer todos.

Arregalei os olhos, eu não queria comer ninguém não.

- Estou brincando, vamos entrar.

O prédio era enorme e todo grafitado colorido, com luzes amarelas convidativas, tinha um ar de liberdade, de que poderia fazer qualquer coisa, eu me sentia poderosa, a vibração era incrível.

- Venha, vamos entrar pela porta lateral, dá direto para a área VIP, essa boate é de um amigo meu, tenho entrada liberada sempre que quiser.

- Cheio dos contatos.

- Você não sabe o quanto.

Seguimos pela porta, entrando em um corredor praticamente sem iluminação, apenas com uma luz fraca ao final que já era a entrada da sala VIP, o lugar não era muito amplo, mas tinha um bom espaço, o som muito alto, de primeiro momento chegada ser ensurdecedor, até se acostumar, sofás de couro, mesinhas altas espalhadas, garçons e garçonetes passavam com bandejas trazendo bebidas e petiscos, vou até a sacada de metal, que dava vista para a pista de dança, muitos jovens com copos, balançando seus corpos no som envolvente das músicas.

- Quer algo para beber?

- Um refrigerante, com limão e gelo.

- Sem álcool?

- Não posso beber.

- Posso perguntar por que?

- Medicamentos.

- Certo, não vou falar mais sobre isso e nem insistir.

Ele fez sinal para um garçom e fez os pedidos, momentos depois o jovem volta com as bebidas, Juan pega as duas e alcança a minha, o refrigerante estava maravilhosamente gelado, o calor que estava lá dentro, com o frescor do refrigerante, tudo estava literalmente no ponto certo, estava focada em assistir as pessoas lá embaixo.

- Quer dançar?

Olho para ele com os olhos quase saindo de órbita.

- Eu não sei dançar.

- Isso não é um problema muchacha, venha comigo.

Saiu puxando minha mão, o segurei por um momento, virei o resto do líquido que havia em meu copo antes de seguir com ele, copiando minha ideia ele fez o mesmo com a bebida ele, depois pegou meu copo e o dele deixando em uma das mesinhas que estava próxima de nós.

Descemos as escadas em direção as pessoas que estavam na pista, meu coração estava a mil, a adrenalina estava tomando conta do meu corpo.

Juan me leva até o meio da pista, no meio do calor das pessoas dançando, para e se vira de frente para mim, aproxima do meu ouvido, falando para que eu pudesse escutar em meio ao som alto que tocava nos alto-falantes.

- Só deixa a música te invadir, solta o corpo e se permita.

Então ele se afasta e começa a dançar no ritmo da música, fecho os olhos e deixo a melodia e a voz suave de Becky G e Maluma, cantando La Respuesta, comecei a movimentar no ritmo alegre da música, conforme ia adaptando meus ouvidos, permiti brincar dançando com Juan.

Era real oportunidade de ser jovem, e eu estava aproveitando com todas as minhas forças.

LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora