Capítulo 8

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As vezes reclamamos que não temos nada, ou que o que temos não é o bastante, não é o suficiente, não é bom, até perdermos tudo o que tínhamos, e ver que tínhamos muito, e exatamente tudo o que precisávamos. Vendo minha casa em chamas, não tendo mais como salvar qualquer coisa, minhas poucas fotos, minhas gastas roupas, meus móveis velhos, que já passaram do prazo de existência a muito tempo, mas estavam lá servindo tanto quanto móveis novos, era pouco o que eu tinha, mas eram meus, conquistados pelo meu esforço, e agora eram apenas fogo e cinzas.

As chamas consumiam tudo ao seu redor, as altas labaredas espalhavam-se, misturando sua fumaça com as nuvens no céu, não podia acreditar que aquilo estava realmente acontecendo, fiquei sentada na ambulância apenas assistindo aquilo que um dia foi meu lar, ser consumido pelo fogo, como se fosse um mero papel na lareira, desmaiei em uma crise de pânico, a ambulância foi chamada para socorrer-me, mas eu preferiria estar no escuro.

Meu irmão estava a tempos conversando com os policiais, eu não tinha condições de raciocinar nenhuma resposta, muito menos proferir qualquer palavra, minha mente estava em completo vazio, fiquei apenas olhando para o fogo que recebia a água do caminhão dos bombeiros, as casas ao redor receberam uma camada de água também, para evitar que aquecessem e acabassem pegando fogo também, minha respiração estava complicada devido a inalação da fumaça, o vento trazia até mim aqueles pequenos pedaços de fuligem, meu nariz estava levemente trancado por ter chorado tanto, eu realmente estava uma bagunça, e ainda vestia as roupas do meu irmão, o que já não me incomodava mais, afinal era só o que me restava mesmo.

Skill fez um aceno para o policial que estava o interrogando se despedindo, virou e veio em passos cautelosos em minha direção, ele estava com medo de aproximar-se, talvez pela minha cara horrível, talvez por medo que eu desabe novamente, medo que eu não o queira por perto o culpando por algo, eu sei, eu também teria dezenas de medos, mas eu simplesmente não conseguia reagir, eu não tinha forças, nem se eu quisesse.

- Como está a cabeça? 

Perguntou verificando com olhar preocupado, não respondi, eu não estava sentindo nada, estava inerte, apenas minha respiração denunciava que eu continuava viva.

- Luna? Está escutando? Faça algum sinal para que eu saiba que está bem, precisamos ir embora, ficamos horas aqui, já está tarde, a noite já está caindo, os bombeiros já controlaram tudo, já conversei com os policiais, está começando a esfriar e você ainda está com as minhas roupas, precisamos ir para casa, você precisa descansar e precisa se alimentar, vou falar com a Sara, pedir mais algumas roupas emprestadas até amanhã, logo cedo iremos comprar roupas novas para você e resolver tudo isso daqui, mas agora vamos estão sendo dias intensos...

Eu escutava tudo, mas não conseguia mover um músculo, eu estava consciente, mas meu corpo estava completamente desligado.

- Perdi tudo o que eu tinha, a vida que tinha construído com muito esforço, todas as minhas lembranças, fotos, meu lugar no mundo, tudo virou cinzas...

Divaguei quase sussurrando, as palavras machucavam as paredes da minha garganta, que parecia estar grossa, como se fossem pedras arranhando para sair a voz, meus olhos continuavam vidrados, agora na fumaça negra que saia dos escombros do que um dia foi minha casa, o fogo já havia sido controlado, mas a minha vida pelo contrário acabou de perder o controle de vez.

- Vamos Luna, você precisa descansar, vamos para casa.

Skill insistiu, não esperando nenhum movimento, apenas levando-me junto a ele, comecei a andar automaticamente amparada por ele, segui olhando para trás até onde eu podia ver a cena, meu irmão abriu a porta da caminhonete ajudando-me a entrar, fechou a porta com cuidado, aquele banco de couro parecia tão grande agora, ou eu que havia encolhido, não tenho bem certeza.

Ele entrou, manobrou e seguiu o mesmo caminho que tínhamos feito para chegar até aqui, todo o percurso até o complexo foi feito em completo silêncio, eu ainda estava em choque.

Desci do carro e segui para a porta de entrada de forma automática, a vadia nº 1 estava logo no hall de entrada, eu não faço ideia do que ela falou, só sei que precisava descontar tudo que estava preso dentro de mim.

Joguei-me contra ela, que agora olhava-me com olhos esbugalhados e perplexa por ter a acertado, aproveitando seu momento de descuido a empurrei, fazendo-a cair no chão, montei sobre ela e desferi sequencias de tapas e socos naquela cara plastificada, ouvia gritos e pedidos para que eu parasse, sentia que tentavam puxar-me para que saísse de cima dela, mas tudo estava distante, as palavras não faziam sentido em minha mente, eu penas precisava descarregar e ela era a pessoa perfeita para isso.

Ela estava uma mistura de maquiagem borrada, lágrimas e sangue, mas eu continuava, ela tentava tirar-me de cima, tentava acertar tapas e arranhões, mas eu era mais rápida e esquivava de todas as tentativas, quando ela estava realmente uma bagunça, alguém conseguiu tirar-me de cima com um abraço de urso.

O perfume denunciava que era Skill, deixei que erguesse-me, virei-me em seus braços e chorei.

Eu estava em surto, mas o conforto dos braços do meu irmão conseguiu fazer meu ataque agressivo cessar, finalmente consegui tirar a tampa que estava trancando minhas emoções e permiti-me chorar.

- Como você descobriu? Era impossível eles garantiram que não iriam entregar quem havia os ajudado a armar tudo isso, eu fiz tudo por amor, Death é meu, eu mereço ele, ela não pode chegar aqui e tentar roubar ele de mim!

A vadia começou a gritar com uma voz estridente coisas que não faziam sentido para mim, senti Skill ficar tenso, meu coração falhou uma batida, então a casa pegando fogo não foi apenas um acidente, foi criminoso, alguém estava querendo me atingir ou atingir o clube? Ou era apenas para dar um sinal de aviso? Aviso para mim ou para o clube? A ideia era me matar ou assustar o bastante para que eu saísse da cidade e me afastasse do clube? Ou foi um teste para saber se eu sou um ponto fraco? Mas afinal o que eles fazem aqui? Por que tudo isso? Por que me atacar?

Tudo tornou-se novamente apenas um borrão, o mundo girava em torno de mim, não conseguia distinguir nada, milhares de perguntas rondavam em minha mente, vi caras pegarem a vadia e sumir com ela pelos corredores, muitas conversas paralelas iniciaram, cochichos.

Skill falava comigo, mas nada entrava pelos meus ouvidos, ele tentava fazer com que eu prestasse atenção nele, mas eu não conseguia, senti ele segurar meu rosto virado para ele, mas nada do que ele falava era registrado pelo meu cérebro, a imagem era um borrão, eu só queria entender o que estava acontecendo, eu estou em perigo? Ou eu trouxe o perigo até eles?

Perigo, logo agora que eu descobri que tenho um irmão, e Death, ele ainda está bastante machucado, se for eu que trouxer o perigo para cá, e por conta disso eles façam algo contra ele, acabe perdendo a vida, tudo por culpa minha.

Céus o que esta acontecendo aqui?

LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora