Capítulo 58

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Tudo certo para dar muito errado.

Fiquei caminhando pelo lugar por horas, sentava, alongava, fingia que estava fazendo qualquer coisa para disfarçar quando os guardas olhavam para minha direção, prestei atenção em cada pequeno movimento da rotina deles, cada palavra que pescava no vento.

Dali a três dias teria um voo com carga para algum lugar da américa, essa seria a oportunidade perfeita, pois estando do outro lado do oceano já seria o suficiente, depois eu dava meu jeito de ir até a cidade certa, nem que eu tivesse que atravessar o continente americano.

Daria um belo romance essa história, se eu não fosse parte de um clube de motoqueiros, nem que eu tivesse envolvimento com a máfia, e não estivesse a ponto de entrar em território inimigo para cometer crimes, para solucionar crimes.

Isso nem faz sentido.

É tão insano.

Precisava voltar para o casarão, parar de dar bandeira e voltar escondida a noite para anotar horários de troca de guarda e observar possíveis maneiras de entrar em um contêiner, de noite seria melhor, na escuridão é mais fácil ficar ali sem ser visto.

Estava completamente desligada do que tinha ao meu redor, nem percebi que Dimitri estava na porta dos fundos, me encarando com um sorriso sacana.

- Achei que fosse passar o resto da vida naquele lugar, tinha tanta coisa assim para pensar? Ou estava tentando dar em cima de algum dos guardas?

- O que?

- Ficou um tempão lá, fiquei sabendo que não veio se alimentar, te vi várias vezes caminhando ao redor do laguinho, se alongando, por que tudo isso?

- Eu precisava de um tempo para mim mesma.

- Já que não almoçou, venha comigo, vamos jantar antecipadamente hoje, e fazer uma noite de cinema no meu quarto, que obviamente é muito melhor que o seu.

- Estou me sentindo ofendida.

- Oh meu Deus! Feri seus frágeis sentimentos.

Em quanto ele falava soltava uma gargalhada divertida andando pelos corredores do casarão, ele era um homem incrível, eu iria sentir falta dele, iria sentir falta desses momentos leves com ele.

Segui para meu quarto, alegando que iria tomar banho, estava o dia todo fora, ele assentiu dizendo que ia aproveitar e fazer o mesmo, marcamos de nos encontrar em uma hora no quarto dele, a janta ele iria escolher o cardápio, e seria surpresa para mim.

Eu não sei o que tinha comigo, mas eu queria ficar bonita, me arrumar, uma coisa que nunca senti vontade, fui correndo para o banho, levei meu tempo para lavar o cabelo, o corpo, me depilar, não apenas as axilas como de costume, mas pernas e outro lugar mais específico, o que raramente eu fazia, nunca achei necessário, e eu estava bem comigo mesma sendo assim, mas hoje eu tinha uma vontade de fazer uma geral.

Saí do banho enrolada em uma toalha, tudo bem que não iríamos fazer nada, mas eu queria que ele tivesse uma boa lembrança de mim, afinal dali a dois dias eu estaria indo embora, ele não sabia disso, mas era como se hoje fosse nossa despedida.

Olhei para mim no espelho, decidi que iria fazer meu buço e aparar a sobrancelha, sem maquiagem, isso não é do meu feitio e ele iria perceber que tinha algo errado.

Tirei a toalha do cabelo, escovei meus longos fios calmamente, dei umas batidas para modelar melhor as poucas ondas que tenho e deixar secar naturalmente como sempre faço.

Volto para o quarto para escolher a roupa, não tinha muitas opções, e nem muitas cores, eram praticamente todas pretas, mas tinha um vestidinho branco soltinho, saia rodada até o joelho, de alcinha, bem verão, era a única coisa com cara feminina que tinha ali, nunca o usei, nunca achei oportunidade para isso.

Minhas lingeries eram todas simples, sem rendas, apenas variava de modelagem, escolhi um sutiã branco com alça fina, e a calcinha do conjunto era branca fio.

Me vesti e coloquei o único calçado que não era botas, tênis ou coturnos, uma sapatilha preta, estava me sentindo bem menininha que iria sair com o namoradinho de escola para tomar sorvete na praça da igreja da cidade.

Nunca fiz isso, mas eu via as garotas fazerem, e ficava imaginando como seria.

Passei perfume e desodorante, todo cuidado é pouco.

Eu estava ansiosa, dada a hora saí, fui até a porta do Dim e bati, esperei ansiosa até ele abrir a porta, acho que ele teve a mesma ideia, estava vestindo uma calça jeans, uma camiseta de banda e um tênis normal, nada do soldado que era diariamente.

- Pensei em me arrumar um pouco, mas se eu soubesse que viria uma princesa visitar meus aposentos teria colocado um terno para ficar mais a altura.

- Para com isso, só coloquei uma roupa normal.

- Fico imaginando se usaria isso para treinar, talvez alguns caras iriam desmaiar, e não disse que seria por serem atingidos por golpes.

Eu arregalei os olhos, eu nunca tinha visto esse lado cafajeste dele, e isso foi completamente fora do normal.

Ele riu, deu lado para entrar, mas eu estava paralisada, nunca ninguém falou algo assim sobre mim, eu ouvia os garotos flertarem com as meninas pelos corredores da escola, mas nunca eu tinha sido a razão dos comentários desejosos deles.

- Por favor, entre logo, está me deixando constrangido, me desculpe pela brincadeira, não queria a deixar chateada.

 - Não é isso, é que eu nunca recebi um elogio assim, só fiquei um pouco sem graça, não sei como reagir.

- Desculpa.

- Não tem o que se desculpar, vamos logo estou faminta.

- Claro já está pronto.

Entramos no quarto dele, uma mesa posta para dois, uma bandeja com cloche, me deixava ainda mais ansiosa para saber o que ele havia escolhido para o jantar.

Ele fez sinal e puxou a cadeira para me sentar, depois foi ao outro lado e se sentou, há uma um pequeno maço de flores do campo em um vasinho, e vinho.

- Por favor, abra e deguste do prato de hoje ragazza.

- Grazie signore.

Ao retirar o cloche, um delicioso cheiro de macarronada invadiu o quarto, meu estômago fez barulho anunciando que estava com fome.

- Acho que o dragão acordou.

- Você não faz ideia do quanto ele está desesperado.

Jantamos entre conversas de assuntos aleatórios e banais, risadas, taças de vinho, escolhemos filmes de comédia romântica, rimos, bebemos mais vinho, mas eu sabia que não poderia ficar o resto da noite com ele, eu ainda tinha uma missão a cumprir a mim mesma.

Mas por hora, ainda havia tempo suficiente para tudo, e agora estar deitada no seu braço, assistindo um filme qualquer era tudo o que eu mais desejava.

LunaOnde histórias criam vida. Descubra agora