Quarenta e sete

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                         Taylor

   Quando senhora Josephine e a pequena Pennie foram embora, voltei para o meu quarto onde toquei em um piano virtual. Estava com saudades do meu piano em Nova Iorque. Na verdade sentia saudade de tudo, até do picadinho de carne do Thomas. Encarei o retrato de Michelle e Helena juntas na formatura universitária de ambas. As duas eram muito bonitas, e pelo que escutei de Joshepine, também eram bastante inteligentes. Parei de tocar assim que escutei senhora Kate batendo na porta.

  — Vi que não desceu para jantar. Aconteceu alguma coisa?

  Neguei com a cabeça.

  — Não estou com fome, mas obrigada.

  Tentei sorrir. Senhora Kate se sentou e pediu para mim tocar novamente.

  —Você é tão boa quanto a Helena era. — disse, enquanto tocava, senhora Kate mergulhou em uma memória cheia satisfação e calmaria. — Sinto tanta saudade. Toque uma da Nina Simone.

  — I Put a Spell On You? — perguntei. Era uma das minhas favoritas dela. Senhora Kate balançou a cabeça animada e disse que cantaria.

  A voz da senhora Kate cantando arrepiou todo o meu corpo. Aquela emoção e vontade me tocaram e eu queria muito saber como ela conseguia ter tanto vocal.

   — Senhora Kate, você pode me falar mais sobre a Michelle?

   — Por que do interesse?

   — Estou curiosa. — falei animada. — E gostaria de saber se temos algo em comum, além da semelhança.

  Ela riu.

  — Michelle gostava muito de balé, o marido e ela se conheceram em uma apresentação da Universidade.

  — Ela fez vestibular para qual curso?

  — Administração. Ela era muito inteligente muitas universidades como Berkeley, Stanford e Yale queriam ela. Porém os custos altos não ajudaram e os benefícios eram poucos, ela acabou se formando em uma universidade simples daqui de Compton.

  — Ela era uma boa mãe?

  Senhora Kate sorriu e balançou a cabeça.

  — Boa não era suficiente para ela. Michelle era uma ótima mãe. Rebecca e Alicia viam nela a meta da inspiração.

  — Gostaria de ter conhecido ela.

  — Sim. — sorriu. — Taylor, como era a sua vida antes de ser adotada?

  — Não sei se posso chamar aquilo de vida. — trocamos olhares. — Parecia um pesadelo. Ainda consigo escutar as crianças zombando de mim, do barulho dos ratos passeando pelos corredores. Das freiras gritando. Queria que o tumor apagasse as lembranças ruins, mas acho que elas estão aqui para mim lembrar o porquê quero ser uma pessoa melhor. Não consigo me lembrar dos meus pais, nem sei se estão vivos, às vezes gostaria que estivessem, pelo menos eles teriam um bom motivo para terem me deixado.

  Suspirei. Mesmo falando continuava concentrada em deslizar os dedos pela tela do tablet, fazendo com que as teclas virtuais trouxessem um bom som.

  — Com que roupa você estava quando chegou ao orfanato?

  Senhora Kate parecia uma detetive determinada a encontrar algo.

  — Ganhei uma roupa do hospital. Parece que antes de ir para lá, fiquei internada por duas semanas.

  — Internada? Por qual motivo?

  — Fui atropelada e no hospital me examinaram e descobriram que estava com queimaduras nas costas.

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