Saí da casa de Carina aquele dia com a cabeça carregada de pensamentos, sensações e sentimentos que não conseguia decifrar.Suas palavras me atingiram como um tapa na cara e de certa forma eu não poderia estar mais feliz que ela o tivesse feito.
Dá para entender?
Carina não estava para brincadeiras. Ela era adulta, tinha responsabilidades e uma vida dependia dela mais do que suas vontades e necessidades e Carina tinha consciência disso. Sabia por as coisas em seu devido lugar.
Quando saí de sua casa, a menina havia acabado de pegar no sono e Carina precisava leva-la para a cama. Foi minha deixa. Ela me pediu que pensasse e me acompanhou até a porta, se despedindo com um selinho demorado que poderia estar representando tudo ou nada.
Não me pediu que a ligasse ou informasse de qualquer decisão. Não marcou um próximo encontro. Não disse que nos veríamos novamente ou nunca mais.
Apenas me deu aquele único beijo e seu olhar meigo que continha todo aquele universo que eu só conseguia encontrar ali, nela.
E mesmo nos segundos que sucederam sua pergunta e seu primeiro pedido de que considerasse tudo isso, Carina mudou de assunto e me perguntou sobre alguma banalidade da vida.
Imediatamente o clima mudou e soube que o peso de seu ultimato não era exatamente o mesmo de qualquer outro ultimato, mas um pedido sensato de alguém que se importava comigo e com a filha.
Carina sempre foi sensata e apaixonada demais. Eu a admirava nisso.
Ela me ouviu falar de meu último ano da faculdade com um sorriso no rosto de quem me apreciava de verdade e eu não havia percebido o quanto senti saudades disso até o momento em que seu jeito caloroso me tocou novamente.
E Carina me contou sobre coisas que aprendeu durante todo esse tempo em um ar sonhador que eu também não havia percebido sentir tanta falta, até me derreter em cada palavra que escorregava por sua boca.
Me dei conta de que havia sentido mais saudades dela do que havia imaginado e isso bagunçava com toda a ideia que tinha de quem eu era. No fim eu havia me tornado apenas confusão.
Não a vi depois disso nem por acidente. Minhas férias acabaram uma semana depois. Cheguei a passar na Cookies em alguns fins de tarde nesse meio tempo, mas só quem encontrava era Andy, que ao ver minha inquietude silenciosa não me questionava, nem me dava notícias fora das perguntas que fazia.
Não a encontrei no mercado, nem na rua, nem no parque.
Era quase como se Carina DeLuca tivesse o poder de desaparecer para me dar espaço.
-O que você tem a perder? - perguntou Vic enquanto eu avaliava seu relatório sobre o terreno onde faríamos a escavação.
-Eu não sei, Vic - respondi em um suspiro, tomando nota em uma folha em branco - estou confusa. É como se Carina me fizesse entrar em colapso com o que sinto e o que penso.
-Então não pense - disse como se fosse a coisa mais óbvia e fácil do mundo e saiu, me deixando sozinha com os papéis.
Era ridículo, porque fazia mais de uma semana que tudo o que eu fazia era pensar e repensar.
Era ridículo, porque quando meus pensamentos vacilavam os pesadelos voltavam e era como se toda a terapia que havia feito fosse jogada fora.
Eu hiperventilava e podia ver claramente seus rostos cobertos de areia.
Eu prestava mil vezes mais atenção nos relatórios de Vic e enchia o saco dos outros supervisionando fio a fio, passo a passo, as escavações e quando fizeram a primeira explosão minhas pernas tremeram tanto que eu só quis correr e precisei de todo o esforço possível para conter a ansiedade enquanto a poeira baixava e eu me aproximava para verificar os pontos corretos e os riscos a serem cobertos.
A maior parte do tempo meu trabalho era distante e eu lidava com relatórios e cálculos, mas eu gostava de estar próxima e verificar se estavam seguindo o passo certo.
Qualquer coisa e tudo desabava.
Qualquer coisa e tudo desabava.
Qualquer coisa e tudo voltaria ao início de tudo onde esse tudo era o fim.
Dá para entender a sensação esmagadora em meu peito?
Eu não podia simplesmente parar de pensar, porque se eu não controlasse o que sentia, o desespero me dominaria.
Ainda assim, o que Vic me disse ficou em minha cabeça por horas.
Não pensar.
Não pensar.
Só sentir.
Carina. Carina. Carina.
Cada milimetro do meu coração se retorcendo por ela mesmo que Carina não tivesse pedido por algo assim.
Ela só precisava saber e eu tinha consciência disso.
Carina não estava me pressionando. Havia sido tão clara e limpa que eu me sentia sufocada por me condenar tanto.
Era como se o ar me engolisse e eu fosse morrer por respirar durante o banho, enquanto as distrações tentavam me invadir.
Encostei a cabeça na parede fria e úmida enquanto a água esmurrava minhas costas. Suspirei.
Ao longe pude ouvir meu celular tocando e encerrando meu banho de uma hora inteira. Eu sabia que era minha mãe por puro instinto, já que ela provavelmente havia notado alguma diferença em meu jeito.
Me enrolei na toalha, desliguei o chuveiro e saí do box, já atendendo mamãe.
-Maya Bishop - ela disse em tom de crítica assim que atendi.
-Oi, mama - respondi com um suspiro que entregava tudo.
-Vai me dizer o que está acontecendo? - ela perguntou.
Eu caminhava a passos precisos para meu quarto e esperei poder me jogar na cama antes de responder.
-Eu encontrei alguém por quem fui apaixonada e agora me sinto atordoada - expliquei, tentando ser tão vaga quanto precisa - eu entendo que ela não possa viver sem compromisso, porque ela tem uma filha que obviamente está em primeiro lugar, mas eu acho que ainda sou apaixonada por ela como ela é por mim.
-Hm.. - foi a única resposta de minha mãe.
-O que eu faço, mama?
Ela pareceu rir de leve.
-Como eu vou saber? - mamãe perguntou - quem tem que querem sair dessa bolha que você criou é você mesma. Eu já te falei que isso não é saudável. Até sua terapeuta disse, mas você escuta alguém?
-Mas, mama, eu tenho medo - admiti, mal percebendo que estava chorando.
-Adianta sentir medo, Maya ? - mamãe perguntou, sua voz soando doce dessa vez - eu entendo seus traumas. Eu ainda a vejo tendo pesadelos quando fecho os olhos e eu também sinto medo, mas já não fazemos tudo o que é possível por quem amamos?
-Eu estou fazendo. Esse é o problema.
-Não, Maya. Afastar as pessoas não é sinal de proteção e sim de medo e esse é um problema seu que afeta mais as pessoas que ama do que se tomasse qualquer outra decisão.
-Eu não consigo!
-Então não gosta dela o bastante para tentar - rebateu, fazendo meu coração e meu estômago revirarem - pessoas se machucam de diversas formas. É impossível prever e impedir todas elas. Machuca-las afastando-as de você é uma das mais dolorosas formas. Apenas tente, se você gosta dela como acha que gosta. Vou lhe deixar pensar sobre isso. Eu te amo, Maya.
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With All My Heart
FanfictionSegunda temporada de With All My Love Formada, com a carreira a mil, me mudando para um novo estado como chefe em uma nova filial da empresa onde trabalhava e todos os meus planos no caminho certo. Perfeito, não é? Exceto por um detalhe: eu não cons...