Capítulo 92

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AMELIA ARCHERON

-2 meses antes-

     A putridez no ar era tão avassaladora que meus olhos se abriram de imediato assim que tive o mínimo lampejo de consciência. Agarrei-me a luz assim que pude, ainda que ela não passasse de uma brisa fantasma farfalhando os panos transparentes de minha mente. 

      Eu estava na cama com Az segundos antes de me levantar e não encontrá-lo; minutos antes de ver a forma contra o luar irrompendo pela janela. Então me senti paralisar ao reconhece-la. E, depois disto, meu corpo ficou tão leve quanto uma asa de borboleta e minha mente girou e girou e girou. Não gritei; sem saber por que. Tudo ficara tão silencioso. E a escuridão me tomara. 

      Me perguntei onde estava Azriel, se estava bem... Mas ele estava bem e longe. Ou eu o sentiria por perto. Pelo menos isto.

      Primeiramente, quando a dor martelando minha cabeça pouco se suaviza, avistei um chão de pedra úmida e áspera. A dureza também era reconhecida pelo meu couro cabeludo, deitado naquele piso. Mal tive tempo de notar os arredores antes que a percepção me consumisse. Um vazio. Uma falta inalcançável que quase doía. Já tinha me sentido dessa forma havia muito tempo, quase eras atrás... Mas apenas quando era humana. 

      Não tinha sequer gota de poder dentro de mim, como se tivesse sido sugado ou arrancado pelas próprias mãos de alguém. 

      Comecei a me desesperar, sabendo que aquele poder era irreparável e inimaginavelmente valioso. Era meu. Eu conquistara com cada grama de meu ser. E não estava mais lá.

      Foi tirado de mim... Meus poderes... 

      Precisava descobrir como. Porque a última pessoa que vi, aquela contra a luz da lua em minha casa..., era eu. Simplesmente me vi ali. Cada detalhe meu estampado num rosto belo. A diferença era o olhar cujo ela me encarou — os olhos quais eu tinha quando jurava vingança a alguém; repleto de maldade predatória. 

     Eu mesma me roubara ou... 

     Abri os olhos mais repentinamente, decidida a descobrir o que acontecera. Mais alto daquele piso fedido e cinza, o começo de barras de cela de um palmo de grossura erguiam-se como pilastras. Quase nenhum espaço estava entre elas. Não reconheci a pedra de primeiro momento e esperei ter uma visão menos embaçada. Alguns segundos depois, vi mais claramente e, mesmo assim, não identifiquei o material das barras. 

      Queria me levantar, mas o ar parecia fazer pressão sobre meu corpo, como se a gravidade estivesse mais intensa do que nunca. Não obstante, forcei-me a mover a cabeça alguns centímetros. Somente fiquei sobre os antebraços. 

      Eu estava, de fato, numa cela estreita e minúscula; sem visão para qualquer coisa de fora dela, graças a escuridão. Blocos de pedra revestiam o chão e as paredes, e nenhuma cama ali residia, ao contrário de outras prisões.  

      Me senti um pouco ofendida por terem me colocado em tal lugar tão indigno. Quero dizer, esperava pelo menos uma cela maior e cheia de precauções; não algo tão trivial. 

      Olhando para baixo, me deparei com um par de algemas de ferro antigo e encardido ao redor de meus pulsos. Eram grossas e correntes pendiam entre elas, quais me lembraram de uma ancora de navio. Estavam tão apertadas que doíam, e senti uma pontada forte de dor vinda dali. Espinhos se fincavam na minha pele, compreendi. Eles quem continham minha magia, e os feitiços na cela me enfraqueciam. 

      Todavia, era impossível. Meu poder não podia ser contido com algemas de veneno feérico ou qualquer coisa do gênero. Eu tinha controle sobre a maioria de meus poderes. Veneno não me enfraquecia mais — e não conhecia feitiço que o fazia. 

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