"Não adianta perguntar 'por quê?'
Preciso confiar sem entender
Que o que é velho já passou
E que um novo tempo começou"(Eclesiastes 3, Daniel Berg)
Eu não costumava ver Tom irritado.
Ele era o tipo de pessoa serena, da qual era difícil distinguir os sentimentos — o total contrário de mim. Se bobeasse, eu contava toda a minha vida para uma senhora no supermercado.
Não costumava ver Tom discutir, olhar feio, ou mesmo levantar a voz, em qualquer circunstância. Por isso, era impossível para mim imaginar que ele poderia nutrir raiva por alguém, ou culpar o pai pelo seu acidente. Suas cartas demonstravam que ele tinha tais sentimentos negativos como qualquer outra pessoa, mas eu não costumava ver.
Enquanto andava até o quarto 14, cumprimentando alguns enfermeiros no caminho, minha mente procurava formas de imaginar Tom bravo ou decepcionado. Mas eu só conseguia lembrar de momentos dele rindo — que eram raros, e por isso eu os guardava com muito carinho dentro de mim —, fazendo alguma brincadeira — a seu modo contido e objetivo —, me falando “Provérbios” e eu tendo que adivinhar a qual versículo ele se referia; momentos bons e felizes.
Senti uma movimentação esquisita dentro de mim. O órgão bombeador de sangue que era protegido por minhas costelas estava um pouco acelerado, como se eu tivesse corrido e parado subitamente.
Foi aí que liguei as reações do meu coração com os meus pensamentos. Estaquei no corredor.
— Ai, menina. — Vivian apareceu ao meu lado, com um sorriso no rosto. — Eu estava andando atrás de você, tá? — brincou. Ao notar minha expressão, ela franziu as sobrancelhas. — Aconteceu alguma coisa?
— Eu... — Minha garganta estava seca.
Imagens de meu melhor amigo tocando teclado, subindo o óculos no nariz e apertando os lábios invadiram a minha cabeça sem pedir licença.Minha mente nunca fora a primeira em memória, mas eu me lembrava de cada detalhe da minha amizade com Tom. E isso nunca me apavorou tanto.
Lágrimas vieram aos meus olhos, e balancei a cabeça para Vivian.
— Eu... vou ver o Tom — respondi, incerta de que queria fazer aquilo.
— Que bom que você vem sempre — comentou ela. — Ele vai ficar feliz de saber quando acordar — acrescentou, sorrindo.
Senti um frio no estômago.
— Espero que... que sim. — Tentei sorrir.
Percorri mais alguns metros no piso branco, seguindo a linha roxa no chão. A cor me deixou deprimida, pois me lembrei do meu vestido de madrinha do casamento de Raquely, em que Tom seria meu par.
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O Escritor da História • Livro 01 | Duologia "O Escritor"
Romance"Eu acredito que as promessas que Ele faz, Ele cumpre. Acredito que, mesmo que o Senhor me permita sofrer ainda mais, mesmo se esmagar e quebrar o meu coração, ainda assim estará lá para juntar os meus pedaços. Ainda que demore, acredito que um dia...