Eva se encarou no espelho embaçado e quebrado, suas mãos passando pela lateral do cabelo recém-raspada, deixando mais à mostra as cicatrizes da região, algumas mais ressaltadas que outra. A franja azulada e já desbotada estava ajeitada de forma a não incomodar seus olhos, enquanto o comprimento estava preso em um rabo de cavalo.
A máscara vermelha que remetia à figura mitológica do tengu estava preso na lateral de sua calça e sua mão triscou no objeto de forma desleixada, em seguida a mulher suspirou e saiu do cômodo, se encaminhando para a saída do prédio abandonado.
Íris e Gael já estavam ali. A rosada abriu um largo sorriso ao notar a maior se aproximar, balançando suavemente os quadris e fazendo a saia rodada e cheia de seu vestido girar graciosamente.
— Como estou? — perguntou a menor em um tom animado, em seguida mostrando os sapatos escuros de vinil desprovidos de qualquer rodinha.
— Parece pronta para uma festa... — comentou um tanto avoada e a menor fez um enorme biquinho, os braços cruzados em frente ao seios levemente mais volumosos, se comparados aos da azulada, demonstrando sua insatisfação com a resposta. — Está... Linda, se é o que quer saber.
O sorriso voltou a surgir na face da mais baixa que riu empolgada, suas mãos se movendo agitadas em seu entorno mostravam sua ansiedade e animação para aquele evento.
— Neko, viu o Kitsune? Ele está atrasado — pontuou a mulher mudando de assunto, seu olhar vasculhando a proximidade em busca do último elemento faltante.
— Ele estava no quarto se vestindo. Acho que ele se atrasou por culpa minha. Não entendo sobre como me vestir para algo do gênero — falou o maior, apontando para as roupas que lhe pareciam um pouco apertadas e curtas, mas que cobriam o suficiente de seu corpo.
— Deveria ter dito para ele arranjar algumas roupas para você também — mencionou a de madeixas azuis em um suspiro cansado.
— Essas roupas são da raposinha? Que fofo, emprestando as roupas para o namorado — disse Íris colocando suas mãos no ombro de Gael e o fazendo girar enquanto olhava para as vestimentas. — Não ficou tão mal assim, só um pouco apertado. Está de incomodando, gatinho?
— São. Namorado? É algo como um companheiro? — questionou o maior, seus dedos segurando no pano da roupa a encarando. — Não, não sinto elas me apertarem, só aqui e aqui. — Gael apontou para a parte interna do cotovelo e a parte de trás dos joelhos. — Não incomoda no todo.
— Isso, companheiros, uma pessoa bem próxima. Vocês são assim não são, gatinho?
— Acho que sim... Ele é a pessoa mais próxima a mim agora — respondeu o maior depois de alguns segundos pensando a respeito.
— E ele já te beijou?
— Você sabe que ele não está entendendo namorado como a gente entende por namorado, não é? — falou Eva respirando fundo. — É óbvio que ele não o beijou. Duvido que o Kitsune tenha beijado alguém na vida.
— Bonito daquela maneira? Aquele jeito de garoto mau e rebelde deve fazer um sucesso por aí.
— Por que ele deveria me beijar? É um cumprimento?
— Isso, mas pessoas bem próximas se beijam aqui. — Íris apontou para os próprios lábios dando uma risada divertida ao ver o outro assentir e processar a informação.
— E quando não são próximos?
— Aí depende, pode ser na bochecha ou não ter beijo. Beijar é algo íntimo.
— Por que estão falando sobre beijos? O ócio está demais para vocês? — perguntou Matteo assim que pisou no lado de fora do prédio, as mãos ocupadas com duas máscaras de nariz comprido, enquanto outra estava presa no topo de sua cabeça. — Se têm tempo para conversarem bobagens ao menos façam isso em outro momento.
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inafetivo
Science FictionNaquele mundo em que sobreviver era a lei, os afetos são esquecidos e abandonados desde o berço. Amar se torna um peso, algo difícil de se carregar, uma cruz a qual poucos conseguem lidar. A guerra, a morte e a violência se encontram em cada esquin...