O dia amanhecera cinzento e chuvoso, apesar do mormaço que fazia pelo ar rarefeito e tóxico, em uma densidade que prende o calor na região.
As gotas finas caiam fracas contra os vidros quebrados da janela, enquanto os olhos amarelados e astutos da raposa seguiam pelas informações, textos e imagens que estavam expostos na tela holograma que falhava levemente.
Seus dedos acompanhavam levemente os designs dos equipamentos na tela, tentando projetá-los em sua mente e tentar reduzir o tamanho e os custos para produzi-lo.
Gael havia chegado há um bom tempo na sala e ficara ali apenas o observando trabalhar, não querendo atrapalhar a concentração alheia. Já o moreno tentava não se deixar abater pelas sensações ansiosas que estar a sós com o maior em uma sala fechada após a noite anterior lhe dava.
Pela forma como Íris havia tomado a frente em responder suas perguntas sobre o que conversavam, lhe parecia evidente que dissera algo além, o qual evitou tocar no assunto.
Deveria questionar algo? Estava pronto para ouvir o que a outra havia dito? Haviam falado algo sobre o que ocorrera entre ele e Gael? Era possível, ainda mais por saber que o maior não tinha um parâmetro bem claro em sua mente sobre o que poderia ou não falar para terceiros, ou melhor, para a rosada.
E algo dentro de si dizia que a mulher havia se aproveitado um pouco desse fato, ainda mais que estavam de certa forma juntos naquilo, como se tivessem algum vínculo de confiança, o que de certa maneira lhe dava credibilidade para que o maior a considerasse como alguém confiável.
Matteo engoliu em seco ao perceber Gael se aproximar e encarar a tela, a proximidade aumentando o nervosismo no interior do menor.
O moreno respirou fundo e tentou não deixar tão aparente em seus movimentos o quanto sentia-se mexido com a abrupta aproximação. Ainda estava confuso dentro de si com o ocorrido da noite anterior, era algo que lhe parecia muito delicado e complicado para digerir.
Quando saíra para tomar um ar, não conseguia parar de relembrar tudo o que fizera e dissera, todas as memórias que pouco a pouco invadiam sua mente.
Aquela altura não tinha como negar que sentia algo pelo maior, mesmo que fosse algo pequeno, ou não teria dito tudo o que dissera, não teria o cuidado e a preocupação que tivera.
Definitivamente não acatara a ideia do outro por necessidade física ou por qualquer outro motivo se não pelo sentimento que parecia se acoplar ao seu peito. Mas também não podia dizer que aquele sentimento era realmente amor pela persona de Gael, não enquanto sua mente lhe desse a impressão, mesmo que fraca e sem fundamento, de que o colocava ou o via como um substituto para Bakeneko.
Tinha a absoluta certeza de que não o observava dessa forma, mas os pequenos fantasmas do inconsciente sempre acabavam por rondar sua mente com questões que antes nem pareciam fazer sentido.
Seus olhos seguiram para as máscaras de oxigênio empilhadas em uma das mesas, as três lado a lado. A em forma de gato estava no meio enquanto a de raposa a direita e o de corvo a esquerda. Era aquela formação que usavam quando estavam juntos em uma missão, só os três.
O moreno deixou o que estava fazendo de lado e seguiu até elas, encarando-as e passando o dedo sobre a parte lisa, retirando um pouco da poeira que começava a se formar.
— Você o amava? — perguntou Gael depois de um tempo olhando o menor perdido em pensamentos enquanto encarava as máscaras.
O moreno virou o rosto ao ouvir a voz alheia, a pergunta demorando a se processar completamente em sua mente.
— Hm... Sim, eu... O amava. Talvez mais que eu já tenha amado alguém na vida — pontuou o menor deixando as máscaras de lado e voltando para onde estava. — Não sei se um dia vou deixar de amá-lo.
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inafetivo
Science FictionNaquele mundo em que sobreviver era a lei, os afetos são esquecidos e abandonados desde o berço. Amar se torna um peso, algo difícil de se carregar, uma cruz a qual poucos conseguem lidar. A guerra, a morte e a violência se encontram em cada esquin...