As feridas haviam se curado totalmente aquela altura e as relações entre o pequeno grupo haviam ganhado novas camadas, cada vez mais profundas e enraizadas.
Já haviam dado os primeiros passos para a próxima etapa de sua missão, seguiriam para o Norte em busca do triângulo de Valhalla e de mais informações para poderem chegar no objetivo final. Durante os dias de recuperação, haviam partilhado tudo o que tinham descoberto na base de Tengu. Estavam cientes de que o laboratório havia sido incendiado e que tudo indicava para Yatagarasu como principal pivô, mas que não havia tido qualquer mácula profunda em relação as drogas produzidas já que já haviam deixado o local antes do ocorrido.
Maya tinha criado pequenas cápsulas envenenadas para que Matteo pudesse usar em seu protótipo que fora consertado e melhorado da última luta, assim como a máquina de ressonância magnética estava perto de sua etapa final.
Iam deixar o Leste ao cair da noite e já haviam preparado tudo o que podiam para a partida.
— Como será que é o Norte? — questionou Gael enquanto observava Matteo acoplar o braço robótico em si, ajustando-o rapidamente.
— Dizem que é um pouco mais frio do que aqui... Não sei se essa informação fará diferença para você... O clima te afeta? — Gael negou com a cabeça e Matteo deixou as ferramentas de lado e abriu e fechou a mão mecânica, testando sua precisão. — É época de neve na parte extrema do Norte, você já viu neve?
— Sei o que é, mas não lembro de ter visto.
— Podemos dar uma volta quando chegarmos, talvez tenhamos sorte para ver a neve cair — pontuou Matteo, um pequeno sorriso surgindo em seu rosto. — Deve ser legal sentir os flocos caírem contra a pele... Quando era mais novo queria sair do Leste para ver como era a sensação.
— Podemos — concordou Gael, seus pés o aproximando do outro e segurando a mão robótica, trazendo-a para perto de seu rosto, olhando de mais perto os agora quase imperceptíveis arranhados do último confronto. — E não tinha como sair daqui para ver?
— Hm... Não, os movimentos separatistas eram mais intensos e passar pela divisa entre as regiões era quase impossível... Eu tentei algumas vezes, mas da última vez quase morri e desisti — Comentou a raposa, abaixando lentamente o braço e se virando de frente para o rapaz maior. — A diferença é que agora posso explodi-los se não me deixarem passar.
— Eles ainda existem? Pensei que teriamos problemas depois de entrar no Norte.
— Existem... Apesar de terem se desintegrado nos últimos anos, ainda têm grupos que resistem... Eles são o de menos, teremos problemas por todos os cantos, mas eu vou te proteger, então, não precisa ficar com medo — brincou Matteo dando uma risada de sua própria piada, vendo-o assentir, o que o fez rir mais ainda. — Você sabe o que é medo?
— Medo é... Algo ruim?
— Depende, tem momentos que ter medo é bom, nos faz recuar de um perigo iminente, outros que é ruim, o medo nos deixa sem reação, nos paralisa e não conseguimos fazer nada por um tempo até controlá-lo — explicou Kitsune, suas mãos segurando contra a mesa.
— Você tem medo de algo?
— Hm... Tenho medo de... Altura, um pouco... Não é algo tão gritante assim, apenas um frio na barriga... Cada pessoa tem seus próprios medos, tem alguns que têm medo da morte... Ou de perder pessoas que se ama... Medo é um receio de sofrer de alguma forma, de perder. Acha que tem medo de algo?
— Frio na barriga? Acho que sim... Quando a gente estava na base do Tengu, eu... Senti isso, esse frio na barriga, eu queria fazer algo, mas eu não podia e... Tive medo? — Gael tombou a cabeça para o lado de forma pensativa. — Acho que tive medo de te perder.
Matteo prendeu a respiração por longos segundos, as palavras tomando forma e lugar em seu interior. Sentia seu estômago fervilhar com aquela declaração. Ele tivera medo de o perder, o que já fazia mil ideias formentarem em sua mente, o tanto de sentimentos e emoções que Gael poderia sentir, mas nem ao menos saber que aquilo que sente são sentimentos.
Ele sentia algo mais que o medo? Sentia desejo? Sentia compaixão? Sentia afeto? Sentia receio?
Cada pequeno vislumbre de emoções advindas dele pareciam uma conquista gigantesca, como se descobrisse os sentimentos junto ao outro, como se o construísse em sua memória.
— Eu também tenho... Medo de te perder — afirmou, suas mãos segurando as dele. Seu olhar seguindo para o do outro, chocando-se naquele momento. — Tenho medo de não poder te tocar para ter certeza de que está aqui no fim do dia.
— Você pode me tocar sempre que quiser, vou estar aqui em qualquer momento — pontuou Gael, seus dedos pressionaram as mãos dele e as levaram até seu rosto. — Onde quiser, a hora que quiser.
— Não me dê tanta liberdade assim sobre o seu corpo, Gael — comentou Matteo, deixando suas mãos repousarem próximos as bochechas, descendo pelo maxilar e pescoço, fazendo o caminho contrário. — Não quero que se arrependa depois.
— Não vou me arrepender, eu confio em você. Confio meu nome a você.
Matteo deu um pequeno sorriso e inclinou seu corpo para frente, aproximando-se do outro. Era encantador e surpreendente aqueles momentos em que Gael parecia assimilar tão fácil o que lhe contava e explicava que acabava utilizando com o significado que Matteo empregara.
Parecia algo bobo e sem importância, mas ele ter usado "nome" em vez de "o que sou" era profundamente significante, como se aquilo já tivesse criado raízes dentro de si, se espalhado por toda sua interioridade.
E a forma com que ele fazia aquilo era tão distinta, tão única, ele era por si só uma caixinha de surpresas que definitivamente não lhe lembrava ninguém além dele próprio.
Suas mãos se mantiveram sobre as bochechas e Matteo se aproximou ainda mais, deixando seus rostos tão próximos que podia sentir o hálito quente se mesclar com o seu naquela distância mínima.
— Eu posso te... Beijar? — questionou em um fio de voz, sua respiração ficando mais acelerada naquele curto período de silêncio que se seguiu após sua resposta.
— Você pode me tocar como quiser, Matteo. Já te dei permissão para isso — repetiu Gael, sua mente se lembrando da última vez em que se beijaram, seus lábios se juntaram aos do menor e sua boca se abriu, deixando a língua do outro invadir sua cavidade.
As mãos de Matteo seguraram com firmeza a face dele, um suspiro baixo deixando seus lábios ao sentir o toque quente e úmido do músculo do outro contra o seu, acompanhando-o em seus movimentos. Em seguida, seus dedos deslizaram para os fios encaracolados, passando suavemente por eles, mas descendo logo em seguida.
Sua palma passou pelo braço do maior até alcançar a dobra, acariciando a região sem o revestimento, suas unhas rasparam contra a pele. Matteo afastou levemente o rosto e direcionou seu olhar para o local de suas carícias, notando os pelos arrepiados do braço.
Sua mão segurou o antebraço e o ergueu próximo ao rosto, seus lábios tocaram o local sensível, deixando pequenos selares ali antes de deslizar sua língua e mordiscar a pele.
— Assim é bom para você? — perguntou ao deixar um último selinho na região, olhando-o de soslaio e o vendo assentir afirmativamente. — Ótimo, diga quando não estiver bom.
— Não se preocupe, vou dizer — pontuou Gael, suas mãos pairando no ar sem saber para onde levá-las. — O que eu faço?
— Me toque onde quiser — respondeu e Gael colocou suas mãos nas bochechas do menor, acariciando de sua forma robótica a região, mas tinha seu calor, apesar do titânio tornar quase imperceptível.
Seus lábios voltaram a se encontrar em um beijo cada vez mais profundo, Matteo guiava aquele toque molhado e o maior o seguia, repetindo e se adaptando a tudo, todas as intensidades que o outro impunha.
Suas mãos desceram pelos ombros e braços, passeando contra a pele e Matteo soltou um baixo ofego, sentindo seu baixo-ventre começar a formigar em excitação, as calças macias e largas pareciam cada vez mais duras e apertadas e sua mente se inundava com ideias pecaminosas e nada púdicas.
A noite começava a surgir do lado de fora e os beijos tornavam a sala cada vez mais aquecida, cada vez mais molhadas. Os dedos de Matteo faziam pequenos círculos na região que descobrira sensível e passavam pela epiderme arrepiada, se deleitando com aquela pequena, mas significativa, reação.
Matteo se afastou levemente ofegante e passou longos segundos encarando a face do maior, passeando seu olhar pelos lábios agora molhados, em seguida, deixou suas orbes seguindo para baixo, visualizando o corpo do outro até chegar na região que queria, notando que havia um certo volume ali.
— Você sabe o que vem depois? — perguntou apenas por segurança, sentindo-se incerto se o maior sabia para onde aqueles toques os levariam.
— Sexo? — respondeu depois de um tempo refletindo, pensando sobre a conversa que tivera com Íris após lhe contar sobre o que ocorrera entre eles da última vez em que se beijaram.
— Você deduziu isso sozinho ou Íris quem te contou?
— Segunda opção.
matteo respirou fundo e deu uma baixa risada, sua cabeça balançou suavemente para os lados.
— Você sabe como funciona?
— Biologicamente falando?
— Hm... Não exatamente... Sabe como funciona entre dois homens?
Gael negou com a cabeça, o que fez Kitsune mordiscar seu lábio, pensando sobre o que deveria fazer naquele momento. Deveria continuar com aquilo? Manter seus toques e levar adiante?
— Vamos... Devagar — afirmou Matteo, sua mão seguindo para o pescoço dele. — Vou te dar uma colher de chá dessa vez... E da próxima vou te mostrar como funciona.
— Uma colher de chá? Não era sobre sexo?
Matteo ficou o encarando alguns segundos antes de rir alto daquelas perguntas, suas mãos seguraram o rosto dele e colou seus lábios aos do maior em um selinho longo.
— Significa facilitar algo, deixar mais fácil para a outra pessoa — explicou entre risadas. — Foi mal, eu sempre esqueço que você acaba levando as coisas ao pé da letra... Em sentido literal.
— Ah... Não faz nenhum sentido, mas vou me lembrar disso.
— Como você consegue ser fofo mesmo sem expressar emoções? — questionou, seus dedos apertando suavemente a bochecha dele.
— Não sei... O que é ser fofo?
— É algo... Macio, bonito, interessante... Não exatamente... É fofo, fofo é fofo.
— Então, você é fofo.
— Eu não sou fofo, já olhou para minha cara? — Matteo fez uma careta, fingindo irritação. — Fofo é tipo um filhote.
— Uma raposa é fofa?
— O animal? Hm... É, de certa forma.
— Então você é fofo.
— Eu não sou uma raposa de verdade... Se for assim, gatos são muito mais fofos.
— O que não anula o fato de que você é fofo, os dois podem ser, não é uma informação que contradiz a outra.
— Pode parar de usar argumentos lógicos? — reclamou Kitsune em um tom de brincadeira, rindo baixo daquela situação e suspirando em seguida. — Acho que nunca fui tão contrariado pela lógica quanto quando estou com você.
— Desculpa, eu acho.
— Não é algo ruim. Gosto quando me contraria, quando se mostra como realmente é. O fato de que se opõe a mim em alguns pontos me deixa mais... Tranquilo de que você seja tão humano quanto eu — pontuou Matteo, seus dedos acariciando as bochechas dele, mesmo sabendo que ele não sentiria aquele toque. — De que você tem sua própria singularidade... — "E que não está apenas se moldando a minha vontade e meus desejos inconscientes", completou em sua mente. — Já está escurecendo, melhor nos prepararmos para partir.
Matteo caminhou pela sala e pegou as máscaras, colocando a de raposa em sua cabeça e lançando a de gato para Gael.
Gael ajeitou o objeto sobre seu rosto e acompanhou com o olhar o menor ajeitar as armas em seus devidos locais e lhe entregar as duas espadas.
— Matteo... Você se lembra dele quando eu uso as coisas dele?
— De Dante? Olhar para a máscara me lembra dele, mas... Eu sei que são pessoas completamente distintas e que significam ou significaram coisas diferentes para mim. Ele é... Algo do passado que foi bom enquanto durou e que... Vou lembrar sempre com... Carinho... E você é você, o aqui e o agora, algo que eu não quero perder.
— E quem ele queria ser?
— Você sabe que não precisa ver o codinome como ele, não sabe? Bakeneko pode ser algo que dividem, mas o significado não precisa ser o mesmo. — Matteo se aproximou em passos lentos, mantendo seu olhar voltado para o maior. — Se quer continuar com esse codinome, quero que pense no que você quer ser como Bakeneko, não no que ele foi um dia. Os codinomes são nós que fazemos, não o contrário.
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inafetivo
Fiksi IlmiahNaquele mundo em que sobreviver era a lei, os afetos são esquecidos e abandonados desde o berço. Amar se torna um peso, algo difícil de se carregar, uma cruz a qual poucos conseguem lidar. A guerra, a morte e a violência se encontram em cada esquin...