Assim que voltaram para o quarto de Eva, a mulher nada disse sobre o beijo que dera na mais baixa e evitou a todo custo que ela tocasse no assunto. Maya tampouco parecia se importar em entender seus motivos ou porquês, achando graça na forma agitada com que a outra parecia evitar o tema.
Depois disso, acompanhou a maior em uma sessão de socos incansáveis contra o saco de pancadas, ouvindo o som forte dos muros contra o objeto e da corrente metálica balançando a cada golpe.
Já nem sabia precisar quanto tempo ficaram ali até que Eva finalmente parecesse se cansar e a agitação abandonar seu corpo, a fazendo cair exausta na cama e adormecer em um piscar de olhos.
A de cabelos rosados ainda permaneceu um bom tempo ali, observando-a dormir como um anjo, não parecendo nem um pouco com a mulher agitada ou a de expressão entediada que via com frequência.
Dormindo parecia tão serena e em paz, como se fosse para ser assim. Seus dedos percorreram as mechas desbotadas e revoltosas, acariciando seus cabelos enquanto dormia.
Eva se remexeu levemente e resmungou baixo, encolhendo seu corpo como se estivesse se protegendo de um ataque iminente, apesar de ainda dormir. Era como se sua guarda, mesmo que aparentasse o contrário, ainda estivesse alta e vigilante inconscientemente.
— Você pode dormir tranquila agora. Não tem ninguém aqui para te machucar, Eva — anunciou a menor e sorriu largo ao ver a maior relaxar o corpo.
A de madeixas rosas permaneceu ali a acariciando por longos minutos até que achasse que Eva estava calma e dormindo tranquila o suficiente para ficar sozinha.
Em seguida deixou o quarto e decidiu por passear pelo prédio abandonado, havia certa graça em descobrir todos os cantos escondidos daquele lugar, decorar cada caminho e inventar novos.
Quando seguiu para a cozinha compartilhada, viu que o cômodo já estava sendo ocupado e se aproximou, não pensando duas vezes em puxar a cadeira vazia para se sentar ao lado da presença que nem ao menos fez menção de se afastar ou de que diria algo.
— Parece que mais alguém está sem sono por aqui — comentou Íris, seus cotovelos se apoiando sobre a mesa e seu rosto sorridente em suas palmas.
— Meu corpo não precisa de tanto descanso assim... — pontuou o homem se voltando para a rosada. — Está tudo bem com você para estar sem sono?
— Está, eu durmo pouco, me deixa mais disposta no dia seguinte. E quanto a você, gatinho? Estava sozinho aqui em silêncio.
— Estava pensando — afirmou, seu olhar encarando a parede descascada por uns instantes e depois se voltando para a rosada. — Você sabe o que o Kitsune fez na festa para conseguir o sangue dele?
— Você perguntou a ele? — respondeu com uma pergunta, sondando antes de lhe dar outra resposta.
— Perguntei... Ele disse que era complicado explicar em palavras e o pedi para mostrar se fosse mais fácil. — A mulher rosada alargou o sorriso e deu uma risada daquilo, gostava de ver como a ingenuidade do outro era tão evidente ao se tratar de relações humanas.
— E ele te mostrou?
— Ele começou a me mostrar... Mas disse que não faria igual porque não via necessidade em não ser gentil comigo... O que não faz muito sentido... Como posso aprender algo se ele não me mostrar como realmente fez?
— Ele disse isso? — A mulher riu graciosamente, se divertindo com aquela conversa. — Quem diria que ele era tão romântico assim... E o que mais?
— Ele me tocou aqui — apontou para o próprio rosto e em seguida para os lábios. — E me beijou, mas antes ele me falou que não éramos namorados e que há coisas que namorados fazem que também podem ser feitas por não namorados.
VOCÊ ESTÁ LENDO
inafetivo
Science FictionNaquele mundo em que sobreviver era a lei, os afetos são esquecidos e abandonados desde o berço. Amar se torna um peso, algo difícil de se carregar, uma cruz a qual poucos conseguem lidar. A guerra, a morte e a violência se encontram em cada esquin...