Capítulo 96

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Algum tempo depois.

Era uma sexta feira como outra qualquer, ao final de tarde, e Gizelly estava cansada. O bom de ser dona de sua própria livraria e trabalhar a vida inteira no mesmo lugar era que ela conhecia todos os clientes mais fiéis e algumas manias da maioria deles. Como também sabia de seus livros e autores favoritos e até onde gostavam de sentar para ler. Lembrou—se de que precisava colocar uma nova poltrona na ala de ficção cientifica, anotou mentalmente para discutir com Talles depois. Mas bem depois.

Falando em Talles, o homem estava no balcão, então Gizelly aproveitou o momento de paz e foi para o seu cantinho em busca do último romance que estava lendo. Capítulo trinta e cinco, faltavam apenas cinco e ela finalizaria mais um livro. Mais uma estória de amor onde o bem vencia o mal, e que tudo terminava bem se o casal principal apenas ficasse junto.

Era utópico, claro.

Mas ela gostava de ler, imaginar e sonhar que um dia teria um amor tão bom que superaria tudo. E que na verdade, tinha exatamente o amor que sempre procurara ter em toda a sua vida — a tranquilidade de saber que as duas se buscavam com a mesma força. Que uma não precisava da outra, mas que a vida era deveras mais deliciosa uma vez que estavam existindo no mesmo espaço. Ou até em espaços separados, mas ainda encontravam uma forma de estar juntas.

E como obra do destino e das melhores comédias românticas, um papel dobrado caiu do livro na hora que Gizelly o colocava de volta na prateleira. Estranho, ela não lembrava de ter colocado nada naquela obra. Ou em nenhuma obra, se fosse ser sincera. E falando nisso, ela nunca guardava nada em livros e sempre conferia todos os que guardava. Pegou o papel e analisou; estava muito bem dobrado, até com cuidado. Mas foi o cheiro que a atingiu que chamou sua atenção, ela conhecia aquele cheiro...

E sentiu o coração acelerar imediatamente.

Morena,

Tive que fugir, se quiser me encontrar.

Sabe aonde tem que ir.

Beijos,

Sua Rafa.


Gizelly sorriu ao enfiar o papel dobrado no bolso da calça, teve apenas o tempo de redobrar as mangas da blusa de botão que usava, e trancar a livraria. Não tinha mais nada para fazer e ainda estava cedo o suficiente. Sorrindo, sentindo—se ao mesmo tempo boba e apaixonada — ou talvez uma coisa já levasse a outra sem perceber — correu para fora da livraria e em direção ao seu apartamento. Subiu as escadas com lentidão, como se quisesse apreciar cada passo. Depois, abriu a porta da sala e encontrou o ambiente muito pouco iluminado.

Por velas.

O tom alaranjado da sala a deixou ainda mais sorridente.

E a música de fundo teria sido a cereja do bolo da paixão, se sua esposa não tivesse aparecido como a personificação de um sonho maravilhoso, com um vestido lindo, que caía por seu corpo, moldando—se às curvas deliciosas. Ela teria babado se fosse possível.

Mas ficou estática enquanto encarava a mulher se aproximar.

— Você demorou.

— Eu só achei seu bilhete agora, me perdoe.

— Demorou. — A mulher resmungou assim que parou na frente dela. — Não achei que você chegaria atrasada.

— Atrasada para o que, exatamente?

Rafaella se fez de ofendida enquanto enlaçava Gizelly pelo pescoço, colando seus corpos.

— Para a nossa comemoração.

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