CAPÍTULO 7

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TOMÁS

Ela era louca. Completamente maluca.

Não havia outra explicação para ela quase sofrer um acidente sério em cima de um cavalo que não fosse essa.

E ainda por cima nem me agradeceu. A primeira coisa que ela fez foi reclamar e brigar comigo.

E ainda me olhava como se estivesse pronta para me matar.

Mili era uma égua calma, provavelmente só se assustou. E isso ficou comprovado assim que tirei a Cecília dela, Mili se acalmou e ficou andando, mas até isso acontecer, Cecília podia ter se machucado de alguma forma, de algum jeito pela sua imprudência.

Não sabia lidar com isso.

Na hora que ela saiu desenfreada, eu coloquei minha filha no chão, pedindo que fosse atrás dos meus tios e sai atrás das duas. E que bom que eu conhecia cada canto dessa fazenda.

Ainda podia sentir meu medo ao tentar algo arriscado mas que parecia ser a única saída. Talvez tivesse outra alternativa, mas ali no calor do momento, me vi naquela situação e fiz o que pensava ser certo.

Agora ela me encarava como se fosse me matar enquanto andávamos de volta para a casa principal.

Eu segurava nas rédeas dos dois cavalos e ela ia atrás, bufando e reclamando.

Salvei a vida dela e tudo o que ela faz é reclamar.

Estávamos chegando quando vi meus tios e minha filha correndo em nossa direção.

— Caramba, vocês estão bem? O que houve?  – Meu tio pergunta.

Abro a boca para explicar a confusão toda, mas a nervosinha fala primeiro.

— Assustei a Mili sem querer e ela saiu em disparada comigo junto. Mas o sobrinho de vocês resolveu tudo. – Ela suspira antes de continuar. — Agora se vocês me dão licença, eu vou tomar um banho relaxante e deitar um pouco.

Com isso ela sai andando meio irregular e eu percebo que provavelmente estava machucada. Era a primeira vez dela em cima de um cavalo, ela não estava acostumada. Ainda mais um cavalo que levou ela correndo por uma grande distância.

Me sinto um pouco menos irritado e mais culpado por não ter oferecido que ela voltasse sentada de lado em um deles.

— Claro, meu anjo. Vou levar o almoço para você logo logo. – Com isso, minha tia sai em disparada para dentro de casa, provavelmente para montar um prato ou uma cesta de comida para ela.

— Papai, então vamos deixar para ir na cidade amanhã, que tal? Assim a senhorita Lia vai estar melhor pra ir também. – Ela fala com os olhos mansos e eu pondero.

De hoje não deveria passar minha conversa com a minha filha sobre suas intenções de cupido, mas acho que em um gesto de boa fé, eu poderia mesmo estender esse ramo de oliveira e deixar para irmos todos amanhã.

Não podia deixar que meus conflitos internos e pessoais atrapalhassem o negócio dos meus tios.

Júlio me ajuda a levar os cavalos de volta, já que minha filha resolveu seguir a minha tia e preparar algo para a Cecília.

Convivi com quase  todos os maridos da minha tia, o primeiro morreu quando eu era ainda criança. Todos eles veneravam o chão que ela pisava, e ela amava todos eles.

E isso não é diferente do Júlio. Eles se encontraram praticamente na casa dos sessenta e se amam como se fossem dois adolescentes apaixonados.

Era isso que eu tinha com a minha esposa. O que queria de volta. Seu sorriso, sua risada, nossa cumplicidade...

— O que tanto te encuca, Tom? – Ele pergunta depois que guardamos os cavalos na baía e trocamos suas águas.

Coço a cabeça enquanto penso em como articular isso da melhor forma. Encosto na parede para olhá-lo.

— Pra ser honesto, não sei. Desde um tempo eu ando meio estranho.

Ele para e se vira para mim totalmente.

— Estranho como?

Júlio era alto, cabelo totalmente grisalho e tinha um porte esguio. Ele tinha aqueles olhos bondosos que era fácil de conversar, já que minha tia tinha totalmente os olhos inquisidores e sempre analisando a situação. Normalmente também sempre pronta pra um conselho.

— Não sei, só... ando pensando muito sobre tudo.  – Dou de ombros.

Ele balança a cabeça como se entendesse.

— Acham que depois que a gente vira adulto e  tem uma família, que temos tudo resolvido em relação a nossa vida. Que já chegamos em algum patamar evoluído e não temos mais problemas para resolver. Mas isso é a maior pegadinha que tem. – Ele se senta na cadeira ao lado e cruza aos braços para me encarar. — Quando estamos adultos é quando os problemas mais surgem. É quando a cabeça pesa e as responsabilidades triplicam. É quando tudo a gente tem que pensar mil vezes antes de agir na impulsividade. É quando a gente precisa parar pra respirar ou fica louco. E é normal tudo isso. Estranho seria se a gente entendesse tudo logo de cara.

— E se eu nunca entender?

— Tudo bem também. A vida não é feita pra ser entendida logo de cara, ela é feita pra ser vivida e aprender com ela todos os dias.

Ela é feita para ser vivida.

Ela é feita para ser vivida.

"— Não quero que você se prenda a mim, meu amor. A vida é um presente lindo e que é feita para ser vivida."

Essas foram uma das últimas palavras que minha esposa me disse.

— Você analisa tudo demais. E entendo que as vezes precisamos analisar a situação ao invés de pular de cabeça. Mas também existem situações que se a gente não arrisca, se a gente só não se deixa sentir... a gente perde.

E o papo parou por aí.

E agora eu tinha mais ainda no que pensar.

Não entendia o que estava me atormentando tanto, mas sabia que precisava pensar e descobrir a raiz dessa inquietação.

Ou talvez eu soubesse e só preferisse ignorar.

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