Os alunos da Instituição Interna Educacional Maria Quitéria passavam sim os feriados em casa. E com a aproximação do dia da independência, estavam todos eufóricos para se mandar daquele lugar.
Incluindo eu.— Não coloco os pés na rodoviária. — disse Mira, em nosso quarto, fumando na janela e com o ventilador ligado no máximo. — Meu pai pode ligar o quanto quiser. Eu não piso naquela casa.
— Sua madrasta não pode ser tão ruim assim! — Gritou Ray, que secava o cabelo no banheiro.
— Ah, pode. — Mira riu, só que com ironia. — Ela consegue ser uma vadia, e quando eu estou lá, age como uma coitada perto do meu pai. Sem contar no monstrinho que ela criou, aquele merdinha mimado. Já disse que odeio gente mimada?
— Quem não odeia gente mimada? — eu respondi, molhando o dedo para passar a página do livro.
Duas semanas atrás, peguei um clássico de Edgar Allan Poe na biblioteca emprestado. O bibliotecário disse que eu poderia levar para casa, desde que voltasse como foi.
— Seus pais... Não ligaram? — perguntou Mira para mim de repente, e senti um frio na barriga.
Acho que meu estômago despencou.
— Ainda não. Mas sei que vão. — engulo em seco.
— A minha mãe e meu padrasto farão uma viagem. — Ray saiu do banheiro com o cabelo úmido. — Vamos para o exterior.
— Então me deixarão sozinhas aqui!? — perguntou Mira, indignada. Mas sabíamos que ela não ligava.
— Não estará sozinha. Terá Ravi e Mars com você. — disse Ray, e rimos juntas.
— Me jogue aos lobos e eu voltarei liderando a alcateia. — Mira recitou, e depois de uma pausa breve, disse: — Vamos chamar o Dante para ele conhecer seu círculo íntimo, Lani?
Eu não estava preparada para andar com ele, não estava preparada para falar com ele. Mas Mira e Ray estava tão desesperadas para que eu tomasse atitude com ele, que fui instruída a força a chamá-lo para nossa ida ao Burger king. Era a primeira vez em um mês que eu saía daquele lugar, e nada melhor que um sábado à tarde para sairmos no carro do Mars.
Sim, eram muitas pessoas. Com Dante, praticamente seis. Por isso, enquanto Mars dirigia, Ravi ia na frente do seu lado para poder fumar o quanto quisesse. Mira, Ray e eu estavam atrás com Dante, especificamente fui também instruída a ficar em seu colo.
— Meus sinceros amigos, quero que conheçam meu garoto. — Ele buzinou. — FIlho, esses são meus amigos.
O gol modelo 1000 de Mars cheirava a álcool e uma pitada de cigarro saindo do hálito de Ravi, espaços definitivamente pequenos e perfeitos para ter as mãos de Dante em meus quadris, acariciando minha cintura com uma delicadeza considerável. Ray arregalou os olhos para mim, como se estivesse dizendo "como assim você não deitou no colo dele ainda?" então, me debrucei no seu ombro.
— Nossa, você está quente.
— E você está frio. — menti. — me beije.
E nos beijamos.
Mas então, quando Mars buzinou para uma moto, um arrepio me subiu de repente e tive uma sensação horrível de déjà vu. Tirei os lábios dos dele mais rápido do que deveria.— Pare o carro. — Falei para Mars. — Pare o carro.
— Lani, você está bem? — perguntou Dante, colocando uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha.
— Pare o carro, porra! — gritei para Mars.
— Fica calma, estou saindo dessa avenida! — Ele gritou de volta.
Então, comecei a ficar sem ar, e Dante me levantou. Não sei o que fez em seguida, mas eu só me sentia tonta, muito tonta. Mas então, paramos.
Quando tinha onze anos eu estava na aula de educação física, mas estava sem Angelina. Era só eu e o mundo. E detestava isso, já que meus amigos eram apenas os amigos dela. Nessa aula, permaneci nas arquibancadas, e a bola de queimada veio de súbito em minha direção e bateu com muita força na minha cabeça e eu desmaiei, acordando apenas meia hora depois.
Naquela hora, eu sentia a mesma coisa que senti quando levei a pancada. Tontura, ânsia, um zumbido. Só me lembro de descer do carro correndo e vomitar todo o café, almoço e lanche daquele dia perto da árvore numa pracinha, onde uma família fazia piquenique. Um bebê começou a chorar.
— Isso — Senti Mira bater nas minhas costas suavemente. — Joga tudo para fora.
Provavelmente eu estraguei tudo quando o programa para o Burger king mudou para a farmácia. Quem desceu comigo do carro foram Dante e Mira, que me ajudaram a me recuperar. O farmacêutico disse que eu sofri uma intoxicação alimentar e desidratação, e eu passei a beber água de coco nas horas seguintes. Claro, não os impedi de ir ao Burger king. Logo, todos paramos lá, e juntamos mesas.
Dante estava cuidando tanto de mim que foi de partir o coração. O encarei, enquanto colocava a camiseta em cima da tampa da garrafa de água de coco para abrir, aquelas garrafas que havíamos comprado eram muito complicadas de abrir.
— Você não precisa fazer tudo isso por mim. — disse eu. — está tudo bem.
Ele finalmente conseguiu.
— Só quando estiver de verdade. — Sorriu, e seus lábios se tornaram um sorriso calmante com uma linha fina.Dei um gole, e ele acariciou minha coxa com o polegar.
— Você quase não come nada, culpe o molho á bolonhesa no almoço hoje. Estava completamente estragado. — Disse Ravi, aparentemente tentando tranquilizar-me, quando os hambúrgueres chegaram.
— Obrigado por pelo menos pensar em mim. — respondi, arqueando as sobrancelhas, e Mars riu.
— Bom, vamos agradecer a Alanis por estragar a brincadeira do Eu Nunca que faríamos com whisky mais tarde. Eu odeio deixar pessoas na moita olhando eu me divertir, então me recuso a jogar. — disse ele, e murmurei um "babaca".
— Sem essa. Até o final do dia ela vai estar melhor. Não vai, Lani? — disse Ray, praticamente me implorando para melhorar.
Assinto.
— Hum. — resmungo.— Está sentindo alguma coisa? — perguntou Dante, depois de mastigar um pouco de batatas fritas.
Comecei a sentir meu estômago revirar.
— Vou ao banheiro. — tentei sorrir, mas claramente pareceu que chupei limão.Quando me levantei, as mãos dele que seguravam meus quadris escorregaram suavemente, e naquele momento, percebera ter cometido um grande erro: Dante Leblanc estava apaixonado por mim. Estava fazendo amizade com meus amigos. Estava saindo conosco, por mim.
Enfiei o dedo na garganta e vomitei na privada, na mesma hora. Havia passado por encontros terríveis, mas era porque quem tinha que pagar a conta era eu. Mas esse foi a gota d'água, não sabia como continuar olhando para o rosto de Dante, ou de qualquer um dos meus amigos. Eles poderiam estar se divertindo, mas estava dando tudo errado para mim.
Tudo estava dando errado para mim havia um bom tempo.
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Reacendendo-me
Teen FictionEnquanto uma adolescente passa pela fase do luto e do trauma, ela começa a estudar em um instituto interno, e onde espera mais tristeza, na verdade encontra diversos amores e uma vida que jamais imaginou viver novamente. iniciado: 22 de julho de 20...