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     Os dois se encontraram no quarto para conversar, e Xavier encontrou uma camiseta que Dante me emprestou debaixo das coisas da Mira, por acidente. Mas aquelas roupas eram para levar na lavanderia, e Xavier pressupôs que fosse de outro cara que Mira estava se encontrando, e que ela estava colocando um chifre nele. A briga se iniciou com uma discussão, que se transformou em gritos, até ele segurar os braços dela, e na tentativa de se soltar por ele ter a apertado demais, Miranda lhe deu um tapa. Bem na hora que cheguei, ele deu um mais forte de volta. Naquela altura, a mesma já chorava muito, se sentindo culpada.

      — Você não tem culpa. — disse eu, péssima com conselhos.

      — Eu só não estava aguentando mais. — ela soluçou. — Tudo que eu faço está errado para ele. Não gosta que eu jogue, que eu beba, que eu fume, que eu use certas roupas, que eu saia com Ravi e Mars, praticamente me odeia! Se ele pelo menos dissesse que isso faz mal para mim, mas tudo que ele diz é "Minha mãe nunca vai te aprovar assim", ou "Minha namorada não pode ser uma bêbada largada".

      — Ele é um babaca.

      — Eu sei, porra... — Ela chorou ainda mais, virando a garrafa de vodca que escondemos debaixo da cama. Tentei tomar de sua mão, mas parece que ficou com mais raiva ainda e uma de suas unhas postiças descolou, e arranhou meu braço. O choro fino dela percorreu o quarto até o banheiro onde Miranda socou as paredes.

     Tentei tirar ela daquela situação, e pelo visto, teria que ser um pouco mais bruta. Ela se sacudiu quando peguei seus braços, segurou minha camisa e rasgou, gritava que não queria que fizesse nada, que queria ficar sozinha. Mas conhecia ela, sabia que faria uma besteira por tudo que o maldito do Xavier fez consigo. Todas as vezes que ele a humilhou, humilhou sua família e ela mesma. As vezes que sua sogra a humilhou, e de como ser cabeça-quente não ajudava. No fim, consegui abraçá-la, e mais tarde, tomei um banho para limpar a baba e as lágrimas no meu ombro.

      Depois daquele dia, Mira terminou com Xavier, que começou a lhe ameaçar com os olhos. E assim que Ray ficou sabendo da notícia, consolou ela muito melhor do que eu tentei, lhe dando conselhos. Eu, particularmente, nunca havia lidado com relacionamentos abusivos. Todos os meus relacionamentos que eu passei acabaram por parte minha, pois eu sabia que não era suficiente para ninguém. E, claro, o ciclo continuava com Dante.

       Acabei contando tudo para Ravi no esconderijo.

       — Merda. — ele me respondeu.

       Mais um dia se passou, Ray e eu cuidávamos de Mira, completamente traumatizada com o tapa. Ela ainda falava dele, quase não fazia seus deveres e parou de comer. Hoje, por exemplo, não quis almoçar e sequer tomou café, ou o iogurte com granola. Miranda não queria pensar em outra coisa, e como passei a frequentar o clube, notei que ela também não ia lá.

      Por sermos seus amigos, O sr. Claude conversou com Ravi e eu, para falarmos com ela o mais rápido possível, já que ela deveria por obrigação voltar ao clube. Além disso, se isolar não ia fazer bem para ela e nem apagar o que fez.

      E quando o sr. Claude disse em se isolar, me lembrei instantaneamente de que isolamento é uma das formas de se matar sem ser considerado suicida. E sim, poderia acontecer sem ao menos a pessoa notar. Por isso, quando passei nos corredores, vi Mira com o cabelo preso, com sinais que os cachos estavam retornando, conversando no grande telefone da parede, o mesmo que eu usei para descobrir o divórcio dos meus pais.

      — Eu sei... mãe... — Ela disse, com a voz manhosa. — Vou usar as pastilhas. Ok. A gente se fala... Tá, tá, eu vou ligar, prometo que vai ficar bem.... Não precisa... eu mesmo falo com ela. — e desligou.

Reacendendo-meOnde histórias criam vida. Descubra agora