Capítulo 50

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ALFONSO 

7 ANOS ANTES

– Vamos, Jayce. Atenda a porra do telefone.

A minha perna balançava de maneira nervosa enquanto eu contava os toques. Depois do quarto toque, foi para a caixa postal. Desliguei na hora e liguei mais uma vez.

Só chamou de novo.

Algo estava errado. Peguei o meu laptop e os projetos nos quais estava trabalhando e parei no escritório do meu chefe antes de sair.

– Preciso pesquisar uma coisa no departamento de construção – menti. – Volto mais tarde.

No meu carro, liguei o rádio na tentativa de relaxar no caminho de trinta minutos até a casa do Jayce. Mas o efeito foi exatamente o oposto. A cada música que tocava, a cada quilômetro que eu me aproximava da casa do meu irmão, a sensação ruim aumentava.

Jayce andava depressivo. Eu não podia culpá-lo. Ele agora lutava para fazer as tarefas simples do dia a dia – falar e se sentar se tornaram ações difíceis. De alguma forma, ele conseguia se deitar e se levantar da cama todos os dias, e até caminhar um pouco, mas, no fim do dia, estava sempre exausto e dependente da cadeira de rodas que ele tanto desprezava. O tremor involuntário nos braços e nos ombros tinha se intensificado tanto que o acordava no meio da noite, então ele raramente dormia por mais de uma ou duas horas seguidas. Exceto pela ida a consultas médicas, ele não saía de casa havia meses. A maior parte dos dias ele passava assistindo à TV e esperando enfermeiros diferentes virem ajudá-lo a se barbear e a ir até o quintal para mudar de cenário.

Tentamos fazê-lo se mudar novamente para a casa do tio Joe e da tia Elizabeth, ou vir morar comigo. Mas ele recusou, preferindo ficar na casa alugada e deprimente dele, sozinho, em vez de cercado pela família que queria ajudá-lo. Eu o visitava algumas noites por semana depois do trabalho, assim como o nosso tio, mas nem isso era capaz de animá-lo mais. Eu costumava pensar que a pior coisa do mundo era a morte. Mas passei a ter certeza de que ficar esperando a morte era muito pior.

Depois de vinte minutos, liguei de novo do celular, enquanto estava dirigindo. Sem a porra de uma resposta. Eu estava em uma reunião quando ele ligou naquela manhã, então o celular estava no modo silencioso. Uma náusea revirou o meu estômago quando apertei o botão para ouvir a mensagem novamente.

"Mano (silêncio por dez segundos)

Nunca fiquei bravo com a história da Diana. (Alguns suspiros profundos até ele conseguir falar de novo.)

Só queria que você soubesse disso. (Outra longa pausa.) Te amo, cara."

A doença de Huntington tinha afetado a cabeça dele – sua maneira de pensar, as coisas em que ele acreditava. Altos e baixos maníacos haviam se desenvolvido na personalidade do Jayce. Eu tinha lido o suficiente para saber que tudo por que ele estava passando era normal, mas algo no recado que ele deixou me dizia que a mensagem era mais do que só um desabafo aleatório em um momento de baixo astral. Havia anos que eu não falava com a Diana. Embora eu tivesse contado sobre nossa relação para o Jayce, eu havia terminado com ela não muito depois de o Jayce sair do hospital. Por que ele estava pensando sobre isso agora? Parecia que ele não queria que eu carregasse aquele peso comigo depois que ele se fosse. Rezei para estar errado.

A cada quilômetro, o meu pressentimento foi ficando pior, e o meu pé pressionava o pedal com mais força. Quando saí da rodovia, vi que estava correndo a 150 km/h. Eu tinha feito em vinte minutos uma distância que levaria pelo menos meia hora para percorrer.

O meu irmão não atendeu – não que eu tenha dado muita chance antes de usar a chave que ele tinha me dado no ano anterior.

– Jayce!

Sem resposta.

– Jayce!

Sem resposta.

Entrelacei os dedos e alonguei as minhas mãos, então bati algumas vezes. Geladas. As minhas mãos estavam geladas.

Não estava na cozinha.

Não estava na sala ou na pequena sala de jantar.

A porta do quarto estava aberta.

Nada.

Não havia outros espaços em que ele poderia estar naquela casa pequena. Não estava no quintal.

Andei pelo corredor que levava da cozinha à porta dos fundos e vi que a porta do banheiro estava fechada. De frente para a porta, senti a minha nuca arrepiar.

Merda. Eu tô ficando louco.

Respirei fundo e bati.

– Jayce. Você está aí?

Sem resposta.

Bati mais uma vez, e a porta se abriu quando bati. Paralisei.

A minha respiração acelerou.

O mundo pareceu girar ao contrário, e o meu coração pareceu se rachar ao meio.

Não.

Não.

– Nãããããooooo! – gritei.

Corri para o corpo sem vida do meu irmão, pendurado por uma corda presa ao teto. Ele tinha retirado a lâmpada e amarrado a corda em uma viga no forro.

Em pânico, ergui o corpo para que não ficasse pendurado pela corda. Os olhos estavam abertos e saltados.

Os lábios e o rosto estavam azulados.

Havia sangue seco nos cantos da boca.

Mas me recusei a acreditar que já fosse tarde demais.

– Não! Não! Você não pode...

Eu o abracei por muito tempo, sem querer que a corda apertasse o seu pescoço.

Não consegui ir buscar algo para cortar a corda e soltá-lo. Não consegui ligar para pedir ajuda.

Não consegui ver se o coração dele estava batendo.

Não consegui.

Simplesmente não consegui...

Sex without love? - AyAOnde histórias criam vida. Descubra agora