Capítulo 60

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ANAHI

Vomitei.

Tinha dito ao Alfonso que precisava ir ao banheiro porque senti aquela queimação no esôfago que a gente sente logo antes de passar mal. A minha vista ainda estava embaçada com as lágrimas enquanto segurava a cabeça sobre o vaso sanitário, olhando para a água.

A porta do banheiro abriu, mas eu não conseguia levantar a cabeça. Alfonso sentou no chão e me abraçou. O calor do peito dele me aqueceu como um cobertor quentinho. Recostei a minha cabeça contra o ombro dele e chorei.

Ele me abraçou firme por um bom tempo, embalando-me e fazendo carinho no meu cabelo, sem dizer nada. Quando nos olhamos, ele falou baixinho:

– Sinto muito. Não queria te contar até ter o resultado do exame.

– Você ao menos estava planejando me contar se desse positivo?

Ele não precisou falar para eu saber a resposta. O olhar dele dizia tudo. Assoei o nariz.

– Bom, estou feliz que o Manuel finalmente tenha tido uma serventia. Como você sabia que eu estava na casa da minha mãe? Nem contei para a Maite ainda.

– A Alicia me contou quando fui à sua casa. Recuei.

– Você viu o Manuel?

– Sim.

– Como foi?

– Ele tentou me fazer pensar que você estava lá com ele, que vocês estavam juntos.

Dei um suspiro.

– Ele é tão babaca. Odeio deixar a Alícia lá com ele, mas eu sabia que ela queria passar um tempo com o pai, mesmo que ela não admitisse. Ela ama o pai, e eles precisam se entender para melhorar a relação.

Alfonso assentiu. Ficou em silêncio durante o momento que se seguiu.

– No que você está pensando? – perguntei.

Ele balançou a cabeça.

– Não sei se fiz a coisa certa ao contar para você. Foi muito egoísta da minha parte. Não poderemos ficar juntos se o resultado for positivo.

– O que você quer dizer com "não poderemos ficar juntos"?

– Não vou fazer você passar por isso, virar a minha enfermeira. Vim a Nova York porque sou um ciumento idiota. E te contei porque você precisava saber a verdade. Os homens da sua vida desrespeitaram você com mentiras, e eu não queria fazer isso. Mas não faria você passar pelo que passei com o meu irmão.

– Mas não é você quem decide isso.

Alfonso fechou os olhos. Quando os abriu, anunciou:

– Não vamos discutir sobre esse assunto agora. O resultado sai daqui a dois dias.

– Tá. – Eu precisava mesmo daqueles dias para digerir tudo e formular respostas para todos os argumentos que ele defenderia para que não ficássemos juntos caso o resultado fosse, infelizmente, positivo.

Ficamos sentados no chão do banheiro por mais uma hora enquanto Alfonso respondia às minhas perguntas sobre a doença. Ele claramente tinha se informado bastante sobre genética e estatística, além de ter tido a real experiência com a mãe e o irmão. O único lado bom de tudo aquilo é que o Alfonso já tinha passado da idade de ser considerado um quadro juvenil da doença, isto é, quando os sintomas aparecem antes dos vinte anos. A versão adulta da doença em geral se desenvolvia entre os vinte e os cinquenta anos, mas podia chegar até aos oitenta anos, e a progressão ficava muito mais lenta, levando entre dez e trinta anos para causar a morte.

– Venha. – Alfonso finalmente ficou em pé. – Vamos sair deste banheiro.

– Eu teria alguns pacientes para atender, então vou ligar para desmarcar as sessões.

– Você não precisa fazer isso. Preciso achar um lugar para ficar e dormir um pouco. Estou acordado desde ontem de manhã.

– Por quanto tempo você vai ficar?

– Não sei ainda. Mais dois ou três dias, pelo menos. 

– Fique aqui na casa da minha mãe, comigo.

– Ela tem um moedor de carne?

Esfreguei o nariz.

– Tem. Por quê?

– Por nada. Ela faz almôndegas muito boas. Mas prefiro ficar em um hotel, se estiver tudo bem para você.

– Tudo bem.

Embora já tivesse tomado banho, tomei uma chuveirada para conseguir esfriar a cabeça enquanto Alfonso usava o meu computador para procurar um hotel perto da casa da minha mãe. Quando acabei de me arrumar, eu o encontrei no sofá, dormindo profundamente. Por um momento, observei aquele homem e pensei na decisão difícil que ele tomou ao me contar. Desde a descoberta, ele nunca havia contado a ninguém a não ser ao seu melhor amigo, mais de uma década atrás. Era muito para uma pessoa só. Decidi que queria lhe mostrar o quanto estava agradecida por ele ter sido honesto comigo, então sentei no colo dele, com uma perna de cada lado, e o beijei.

– Hmmm... – ele gemeu, acordando.

Posso ter iniciado o beijo, mas ele logo assumiu o controle, agarrando o meu cabelo com as duas mãos para segurar a minha cabeça enquanto usava aquela língua talentosa dele para conduzir a minha em uma dança frenética. Quando tentei me afastar, ele puxou o meu lábio inferior com os dentes.

– O que está tentando fazer? Eu poderia me acostumar facilmente a ser acordado assim.

Rocei o meu nariz no dele.

– Quando eu era pequena, sempre que as minhas irmãs e eu não confessávamos alguma arte, a minha mãe prometia não nos punir se falássemos a verdade, dizendo "a honestidade merece um prêmio". Então sempre confessávamos o segredo, e ela nos dava pirulitos ou outra guloseima como prêmio.

– Ah, é? E você está dizendo que vai me dar um pirulito por ter compartilhado a minha infelicidade com você?

Recuei para ver o sorriso sinistro dele.

– Quase. Você poderia ser o meu pirulito. Vou para as minhas consultas; você vai para o seu hotel, tome um banho quente e vá para a cama pelado.

Vou acordar você com um prêmio pela sua honestidade.

Sex without love? - AyAOnde histórias criam vida. Descubra agora