Capítulo 46

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ANAHI

Alícia pegou uma gripe e demorou mais de uma semana para se recuperar.

Então, os planos feitos com o Alfonso, de aproveitarmos a última semana e meia juntos, tornaram-se visitas dele para ver TV no sofá enquanto a Alícia me chamava no quarto dela a cada quinze minutos.

A noite em questão seria o nosso primeiro encontro depois daquela fase. Ela ia dormir na casa de uma amiga que estava fazendo aniversário, então teríamos a noite inteira juntos. Infelizmente, nem mesmo essa perspectiva excitante conseguiu me arrancar da cama naquela manhã. Todos os ossos do meu corpo estavam doloridos. Eu estava me sentindo tão mal que tive de usar o meu celular para ligar para a Alícia do meu quarto para que ela se aprontasse para a escola. Só a ideia de me levantar e ir até o quarto dela já me deixava exausta.

Ainda em negação quanto a ter pegado a gripe da minha enteada, cancelei as minhas consultas da manhã e voltei a dormir por algumas horas. A minha esperança renovou-se por volta de meio--dia, quando acordei e consegui ir ao banheiro, onde medi a temperatura. Estava com trinta e nove graus.

Não posso estar doente.

Tenho um encontro hoje, e o Alfonso vai embora daqui a três dias.

Uma onda de calafrios pareceu responder àquele pensamento – não o tipo de calafrio que eu sentia quando pensava no Alfonso. O meu cérebro queria se frustrar, mas nem energia para isso eu tinha. Só consegui engolir dois comprimidos de paracetamol e voltar para a cama.

Não tive forças para cancelar oficialmente o meu encontro com o Alfonso, até que ele me escreveu mais tarde.

Alfonso: Use vermelho hoje.

A decepção se instalou. Era assim que as coisas acabariam entre nós. Não conseguiríamos nem nos despedir.

Até a pele dos meus dedos doeu quando digitei a resposta.

Anahi: O único vermelho que vou usar hoje é o da febre. Desculpe. Acho que peguei a gripe da Alícia.

Alfonso: Que merda. Sinto muito. Precisa de algo? 

Anahi: Você tem uma pílula mágica para me curar? 

Alfonso: Vou me controlar e não dizer que tenho algo para você engolir que pode fazê-la se sentir muito melhor.

Sorri e balancei a cabeça.

Anahi: Que bom que você não disse.

Alfonso parou de escrever depois disso. Em qualquer outro dia, eu provavelmente passaria duas horas analisando cada detalhe das mensagens. Por sorte, eu estava sem energia para isso. A febre me derrubou, e voltei a dormir mais algumas horas até o interfone me acordar.

Eu me arrastei até a porta embrulhada no cobertor.

– Oi?

– Sou eu. – Era a voz do Alfonso. – Trouxe uma canja pra você.

Minha parte menininha queria correr para um espelho, lavar o rosto e limpar qualquer restinho de maquiagem. Mas minha parte doente mandou a parte menininha para aquele lugar. Abri a porta e me encostei na parede, esperando o elevador chegar.

Mesmo doente daquele jeito, ver o Alfonso vindo na direção do meu apartamento acordou os meus sentidos. Ele estava de calça jeans e camisa com as mangas arregaçadas. E estava usando as botas que eu amava. Também estava carregando sacolas nos dois braços.

– Você está vindo direto da obra? – eu disse, olhando as botas.

– Não. Fiz uma reunião com o cliente, depois outra reunião com o departamento de construção. Estou de bota porque você gosta.

– Como você sabe que eu gosto?

– Porque observo você. – Ele beijou a minha testa. – É por isso, também, que sei que você gosta de quando seguro as suas mãos acima da sua cabeça quando estou te penetrando.

É verdade, eu gostava. Caramba, eu era tão transparente assim? – Do que mais eu gosto?

Alfonso riu.

– Você gosta de quando contorno sua clavícula com a língua. Gosta de quando digo o que vou fazer com você, mesmo que não queira admitir que gosta quando digo que você tem uma boceta gostosa.

Fiquei boquiaberta. Ele estava bem certo. Eu odiava a palavra, mas algo na maneira como ele a proferia, no calor da paixão, me excitava. E, claro, assim como ele disse, eu não queria admitir.

Balancei a cabeça.

– O que veio fazer aqui?

Ele ergueu a sacola.

– Trazer mantimentos.

– Você vai ficar doente.

– Estou disposto a correr o risco. Agora pode ir descansar.

Lá dentro, ele insistiu para eu me sentar enquanto tirava as compras das sacolas.

– Canja daquele restaurante de que você gosta lá do centro, onde fomos almoçar.

– Não estou com fome.

– Você fez a Alícia comer quando ela disse a mesma coisa. Fiz bico, mas ele tinha razão.

Ele continuou esvaziando as sacolas.

– Remédio para baixar a febre. Lembro que você jogou fora a caixa quando a Alícia tomou o último. Refrigerante de gengibre, porque a única hora em que isso aqui tem gosto bom é quando a gente está doente e toma com torradas. Falando delas... – Ele tirou da sacola um pacote de pão e passou para a outra sacola. Manteiga, isotônico, antigripal, vitamina C, lenços e quatro DVDs em edição de luxo. O último item que ele tirou foi uma caixa que parecia de miçangas. – Para caso você fique entediada.

– O que é isso?

– Um kit de trabalhos manuais que achei na farmácia. Imaginei que talvez fosse bom para caso você precise fazer algo para passar o tempo sem se levantar.

Meu Deus, o homem conseguia partir e curar o meu coração de uma só vez. Lembrei que ele contou que sua mãe fazia trabalhos manuais quando não estava se sentindo bem e não conseguia sair da cama. Ele era mesmo um cara doce, protetor e atencioso. E aí é que estava o problema. Seria muito mais fácil dizer tchau para uma pessoa que não estivesse nem aí para a minha gripe. Alguém que só aparecesse quando eu estivesse me sentindo bem. Mas Alfonso era naturalmente o tipo de homem presente "na saúde e na doença", o que tornava muito difícil vê-lo apenas como um parceiro sexual.

Sorri com tristeza, esperando que ele interpretasse o sinal como um efeito da gripe.

– Obrigada por tudo isso. Não precisava.

Os olhos dele se voltaram para o meu rosto.

– Você está sempre cuidando dos outros. Fico feliz em poder estar aqui e tomar conta de você.

O pensamento era doce, e só consegui pensar: "Que bom que não fiquei doente quatro dias depois".

Sex without love? - AyAOnde histórias criam vida. Descubra agora