therapist.

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[I tried to scream
But my head was underwater
They called me weak
Like I'm not just somebody's daughter
Could've been a nightmare
But it felt like they were right there.]

{point of view; julie blaise}

— Boa tarde, senhorita Blaise — ela pigarreou, ajeitando seus óculos enquanto passava os olhos pela prancheta. — Me chamo Ruby Monroe e serei sua terapeuta.

— Ah, certo. — Engoli a seco e me remexi desconfortavelmente na cama, resmungando um gemido sôfrego pelo movimento. — Não sabia que começaríamos tão cedo.

— Não há hora boa ou hora ruim pra começar um acompanhamento psicológico, Julie. — Ela respirou fundo e ergueu suas íris escuras em minha direção. — Do ponto de vista profissional, devo admitir que você está atrasada até demais.

— Você é bem direta. — Engoli a seco outra vez e ela assentiu, rindo fraco.

— Temos muito o que fazer. — Concordei e ela se ajeitou na cadeira, pousando seu bloco de notas em cima da coxa. — Tem algo que queira falar antes de nos aprofundarmos? Algo que te incomode nos últimos dias?

— Bom... — Respirei fundo, mordendo a parte interna da boca ao sentir meu estômago se revirar apenas por relembrar. — Eu ando sonhando muito.

— E consegue me descrever como são esses sonhos?

— São lembranças, na verdade. — Suspirei, balançando a cabeça negativamente. — Lembranças do período que fiquei em cativeiro e, às vezes, da minha infância também. — Ela assentiu e anotou algo. — E o pior aconteceu na noite passada.

— Pior? — Franziu o cenho. — Como o quê?

— Eles... se misturaram. — Apertei a mandíbula, sentindo minha respiração descompensar e minhas mãos suarem. — Eu podia sentir a surra, o homem usava a máscara do Richy e eu estava no mesmo porão, mas então ele tirou ela e... — Lágrimas encheram meus olhos. — Era meu pai ali. Me batendo enquanto gargalhava.

— Se acalme, está tudo bem. — Ela chamou minha atenção, fazendo-me encará-la. — Não precisa continuar agora se não quiser, temos muito tempo.

T-tá tudo bem. — Levei uma mão até o rosto, enxugando as lágrimas que escaparam. — Não sei se você já sabe disso, mas meus pais eram usuários de drogas. — Enfiei as unhas na palma da mão, coçando-a disfarçadamente. — Eles começaram a usar quando eu tinha dez anos, no começo era apenas maconha, cocaína... Mas aumentaram o nível em poucos meses.

— Julie...

— Primeiro a heroína, depois o crack... — Pigarrei. — Eles venderam quase tudo que tínhamos em casa, e não demorou muito pra se tornar um local de encontro deles com seus... amigos. O bairro todo sabia, todos viam o que acontecia e tudo que faziam comigo, mas nunca fizeram nada. — Encarei minhas mãos, sentindo minha palma arder pelos arranhões. — Não acho que estou pronta pra dar detalhes sobre as agressões, mas, resumindo, quando eu fiz dezesseis anos, eles tentaram "dar" minha virgindade para um traficante em troca de algumas pedrinhas e duas doses de heroína.

— Isso é terrível, Julie. Sinto muito que tenha passado por momentos tão traumáticos. — Ela respirou fundo e voltou a escrever suas anotações, ficando algum tempo em silêncio. — Devo perguntar se eles conseguiram concluir a... troca? — balbuciou, encarando-me por cima dos óculos.

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