🌺Capítulo 17 - Fuga no deserto - Parte II 🌺

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Kalled sai de trás das árvores e caminha cauteloso até os três homens. Eles usam túnicas negras longas e seus rostos estão cobertos. Um deles leva a mão à cintura, dando a entender que carrega algum tipo de arma. Os outros desmontam de seus cavalos e vão de encontro a Kalled que ergue as mãos de forma apaziguadora.

Um diálogo incompreensível para mim se estabelece. Um dos homens revista Kalled de alto a baixo. Posso ver uma faca pendurada em sua cintura. Me espremo atrás do tronco da pequena árvore e rezo para que não notem minha presença, nem vejam Akhal pastando do outro lado do oásis.

Até que algo que Kalled diz os fazem parar como estátuas de sal no deserto. Consigo identificar o nome de Khan ser citado na conversa. O cavaleiro que ficou montado tira a mão da cintura imediatamente. Os outros dois conversam entre si e começam a gargalhar.

Kalled recebe tapas amistosos nos ombros. Olha para trás em direção onde estou escondida e fala alto em português de forma que somente eu entenda...

__ Estava dando um passeio sozinho e acabei me perdendo. Fico grato por me acompanharem até o palácio.

Kalled sobe em sua montaria e se afasta do oásis escoltado pelos três. A medida que as figuras vão desaparecendo na imensidão do deserto, o alívio inicial vai dando lugar a uma sensação de abandono e desespero.

Olho ao redor e constato que estou a minha própria sorte. A única orientação que tenho é tentar voltar ao palácio seguindo na mesma direção que o grupo.

Abasteço o cantil preso na cela de Akhal. Pronuncio o comando ensinado por Aziz e o cavalo age da mesma forma anterior. Abaixa as patas traseiras. Logo estamos galopando em direção sul.

O calor começa a intensificar, porém o que mais me incomoda é uma corrente de vento arenosa que arrasta pequenos grãos para toda parte de meu corpo, inclusive para os olhos. Minha pele começa a ficar salpicada de uma camada de areia fina.

Akhal parece entender meu desconforto, pois diminui o galope, permitindo-me ajustar o hijabe envolta da cabeça e do rosto.

Visualizo um amontoado verde ao longe. Não lembro de termos passados por outro oásis além daquele. Começo a perder a noção de direção e tempo. Tenho a sensação de estar há muitas horas galopando.

Talvez minha mente esteja começando a ficar confusa por falta de água.

Pronuncio um comando e Akhal para imediatamente. Deslizo para o chão. Desvencilho o cantil da cela e bebo alguns goles d'água. Coloco um pouco na mão e estendo para Akhal. Olho para o céu e noto que o sol está no topo.

Isso é sinal de que passou metade do dia!

Como o tempo passou tão rápido?!

A cabeça gira um pouco e uma sensação de desespero se apossa de mim.

__ Será que estamos andando em círculo, Akhal? __ O cavalo dá um relincho baixo e sacode o pescoço.

Estou delirando ou o cavalo me respondeu?

Tento subir de volta em Akhal, mas meu corpo cambaleia quando minhas vistas escurecem. Me seguro nas correias da cela e sem querer solto um dos lados. Não recordo mais dos comandos em árabe.

Vejo o cantil cair na areia e o líquido precioso escorrer e se evaporar rapidamente. Uma nova tontura dessa vez me derruba. Tento levantar, mas meu corpo parece pesar feito chumbo. A última coisa que sinto é a respiração forte do cavalo em meus cabelos e logo depois seus cascos se afastando em um galope desenfreado...

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Não sei por quanto tempo perdi a consciência. Me arrasto fraca pela areia. Apoio-me nos braços e levanto cambaleante. Olho ao redor e não vejo nenhum sinal do cavalo de Khan. Passo a língua pelos lábios e os sinto arderem inchados.

Uma batida surda ecoa em meus ouvidos, consequência do ritmo acelerado de meu coração. Elevo o rosto suado para o céu. É como Aiyra disse. O clima no deserto muda bruscamente. A brisa fresca da manhã deu lugar a um vapor sufocante.

Ergo a mão à altura dos olhos para protegê-los dos raios solares. A pele exposta começa a arder. Ajusto melhor o hijabe cobrindo toda a cabeça.

Olho para trás. Nenhum sinal do garanhão que fugiu à galope assim que caí da cela quase inconsciente.

Animal egoísta. Fugiu sem hesitar.

Dou mais alguns passos arrastados. Meu tornozelo começa a doer.

Abigail me daria uma surra se me visse nesta situação. Certamente não concordaria com minhas decisões. Mas ela não entende. Ninguém entende. A não ser Aiyra que vivenciou algo parecido.

Sinto-me fraca. Estou desidratando. Gotas de suor escorrem por todo o corpo. Lamento ter perdido o cantil abastecido de água durante a queda.

Uma lágrima solitária se mistura ao suor do rosto.

Sei que morrerei aqui. É questão de tempo.

Talvez finalmente tenha encontrado meu lugar. De alguma forma me identifico com o deserto. A beleza disfarça nossa natureza selvagem. Um coração seco e vazio como a paisagem inóspita.

No horizonte, onde as dunas se encontram com o céu de um azul cobalto, ondas de calor transformam a paisagem e parecem desacelerar o tempo. Uma mancha branca se aproxima. Creio que não passa de alucinação de uma mente febril.
Cerro as vistas para apagar a miragem...

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