02- Lily

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Paradas para janta são sempre as piores.

Quando finalmente saímos daquela  parcialidade da viagem que era desértica, chegamos à uma pequena cidade em Denver, que devia grande parte de sua culinária ao Texas. Não que eu já tivesse ido ao Texas, nunca fui, mas haviam restaurantes em Salt Lake cujos pratos eram; Tacos e Burritos.

E os pratos daquele restaurante da cidade de Denver eram; Tacos, Burritos e Nachos.

Nada de batatas fritas, nem Hamburgers, nem nada do tipo. E pra piorar o menino pálido e o pai grisalho sentaram- se e nossa mesa, oque fez a total felicidade de Mary McLary e a total infelicidade de Lily Melody McLary.

- Uau, esses Nachos estão ótimos!- John disse com a boca cheia. Isso me repugnava de maneira inebriante. Minha mãe concordou também com a boca cheia.

- Estão mesmo! Prove os Tacos.- Ela alcançou a maldita travessa de Tacos bem na frente da minha cara. Ela nunca fazia isso quando estávamos sozinhas. Ela sabia que eu detestava braços sobre a mesa alcançando coisas durante as refeições. O menino pálido que, como eu lembrava, se chamava Markus, revirou os olhos e eu prendi uma gargalhada.

- Aqui os Burritos...- John colocou o braço esquerdo novamente bem na frente da minha cara, alcançando a outra maldita travessa de Burritos para minha mãe. Dei um suspiro em alto e bom som.

- Tudo bem, filha?- Ela perguntou sorridente terminando o milésimo Nacho da refeição.

- Tudo ótimo. Aliás, já estou farta. Vou dar uma caminhada, com licença.- Me levantei da cadeira e me preparei para sair.

- Não vá muito longe.- Minha mãe avisou com um olhar preocupado.

- Sua mãe tem razão. Já está escurecendo...- Ele disse alcançando a travessa de Tacos novamente à minha mãe, agora na frente da cara do menino.

Virei de costas para que ele percebesse que eu não ligava, e saí caminhando, sem prestar atenção no resto da conversa.

O ambiente lá fora estava bem mais agradável; o estacionamento – que era bem pitoresco; ao ar livre – estava praticamente vazio. Pelo jeito só pessoas desesperadas paravam naquele lugar para realizar suas refeições. Droga, éramos pessoas desesperadas. O vento não tinha cheiro de nada, nem Tacos, nem Burritos, nem Nachos. Cheiro de nada era melhor que qualquer cheiro do mundo. O lugar era bem natural, repleto de árvores, pinheiros e flores, além de grama para tudo quanto era lado. E mais importante; estava tudo escuro, silencioso e dava para ver as estrelas. E as estrelas eram de tirar o fôlego. Em Salt Lake eu nunca pude ver as estrelas com tanta perfeição como estava vendo aqui. Sem nenhum rastro de poluição nem luzes artificiais. Só as estrelas. E se as estrelas pudessem contar histórias? E se elas escrevessem resumos particulares como os que eu escrevo? E se elas pudessem lançar o livro que escrevessem? E se eu pudesse ser a única a entendê- las? E se pudéssemos falar diretamente com as estrelas quando quiséssemos? E se elas também desabafassem, contassem suas aventuras a nós como às vezes fazemos com elas? Será que poderíamos ouvi- las se tentássemos?

- Então está mais agradável aqui fora?- Alguém se sentou ao meu lado na grama, fazendo um certo barulho no molhado do sereno noturno. Não reconheci a voz e se não tivesse olhado para a cara da pessoa, não saberia que se tratava do Markus ali sentado.- Sabe, eu não gosto que passem travessas bem na frente do meu rosto durante as refeições. E também não gosto de comida mexicana. E detesto conversas sobre rotas e rodovias.

- E afinal você fala. Até demais.- Disse sorrindo sem graça. Na verdade, o silêncio de vozes humanas, apenas meus pensamentos falando, estava bom demais. Mas como tudo que é bom demais, foi interrompido.

Se As Estrelas Contassem HistóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora