09- Lily

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Meu pai não estava bêbado, mas estava chorando.

Contou sobre como seu filho já tinha dois anos e sobre como tinha os olhos azuis como o da mãe e sobre como não lembrava quem ele era e disse que suas lágrimas pingaram na roupa nova do bebê quando a maquiadora de mortos perguntou "que é esse titio?" e o bebê respondeu "Carter", e Carter era o nome do novo marido da mãe e o bebê o considerava seu pai. Meu pai chorou por não ser lembrado, mas ficou feliz por o bebê ter um pai tão presente quanto ele foi para mim, já que a maquiadora de mortos não deixava ele chegar perto do filho, somente durante um dia no mês.

Chorou porque vovó Rose não parava de chorar por causa do vovô Johnson, e chorou porque leu todos os livros do vovô Johnson e agora não teria mais nada para lembrar dele.

Chorou por ter brigado com minha mãe e se separado dela.

E eu mandei que ele parasse de chorar e seguisse em frente porque lembrar do passado não era um bom passatempo, disse que levasse vovó Rose num jogo de beisebol e comprasse uma daquelas luvas azuis gigantes para ela que tinham #1 escrito na palma, disse que mandasse que ela parasse de chorar porque vovô Johnson a via chorando e já não agüentava mais ver a mulher amada se lamentando, disse que queimasse ou me mandasse pelo correio os livros do vovô - e ele disse que me mandaria pelo correio - para que não chorasse tanto quanto vovó porque isso é detestável. Perguntei porque ele havia começado a chorar pelas pessoas mortas e como iam os negócios na funerária. Ele disse que começara a chorar quando os negócios na funerária iam de mal a pior porque não havia ninguém que maquiasse e arrumasse os mortos depois que a maquiadora foi embora e eu ri dizendo que ele havia me respondido as duas perguntas com uma só resposta. E depois ele riu por perceber que eu estava tão normal quanto antes.

Perguntou como estavam as coisas na escola, respondi que estava tudo bem, fora o detalhe de quê eu não tinha amigos, só um garoto chato que morava no apartamento ao lado do meu e que o pai dele estava dando encima da mamãe, ele ficou bravo e disse que eu desferisse um soco na cara de John e eu disse que não podia porque ele era um cara legal e ele ficou em silêncio e eu fiquei arrependida por ter dito isso, depois disse que ele também era um cara legal e que estava com saudade dele e da funerária e que provavelmente iria trabalhar lá maquiando os mortos quando pudesse e que esperava que o filho da maquiadora crescesse logo para que eu o levasse para lá - se pudesse - e maquiasse os mortos de forma engraçada como sua mãe fazia para mim sem me ressentir de que ela roubara meu pai de mim, ele riu e disse que eu era uma boa pessoa e havia melhorado o dia dele só com minha a voz, em seguida desligamos o telefone e eu chorei porque tinha saudade do meu pai e de alguém que não deveria sentir; a maquiadora traidora.

Depois eu dormi e fui acordada por uma mãe rindo loucamente e pulando encima da minha cama, sacudindo meus ombros fervorosamente.

Sentei na cama, ainda esfregando os olhos, para assisti- la pulando na cama e rindo. Sorri ao ver o quanto minha mãe ficava mais jovem com um sorriso no rosto e lembrei de quando eu era menor e ela brincava de boneca comigo e nós ríamos juntas porque as bonecas sempre eram bobas demais.

- Quero saber oque ou quem foi que colocou esse rosto no sorriso da minha mãe... Opa, quem foi que colocou esse sorriso no rosto da minha mãe.

- John!- Ela continuava a pular loucamente e fiquei com medo de que as molas estourassem para fora do colchão da cama, mas não me atrevi a dizer que parasse porque gostava de vê- la pirar.

- Me conta, então, mulher!- Disse, me sentando mais ereta, estava curiosa para saber depois de ela ter mencionado o nome do homem que ela amava.

- Ele me chamou para jantar!- Ela já havia parado de pular, mas continuava soando muito animada.

Se As Estrelas Contassem HistóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora