27- Lily

147 13 15
                                    

                                        Capítulo 27- Lily

Faziam três semanas que eu não falava mais com Markus nem Lucas.

A neve já começara a derreter e eu ia correndo para a escola todos os dias e a frequentava sem frequentar de verdade porque minha cabeça nunca estava naquele lugar, ela estava lá, grudada no Markus que me observava a aula toda e que eu me esforçava para não encarar em nenhum momento.

E voltava da escola correndo e lia livros. Bati na porta da senhora do 408 e pedi que ela deixasse eu usar sua lareira por dez minutos, e ela deixou. Joguei o livro que Lucas havia me dado lá dentro, mas não sem antes ler uma última poesia, aquela que resumia tudo que acontecera há quatro semanas atrás

Tudo vazio, frio, monótono.

Tudo sem nexo, sem protesto, calado.

Tudo tem vida, sem vida, sem forças.

Tudo parado, tristonho, pasmado.

Vida sem fim, vida sem fundo, sem cor

Vida e tristeza, riqueza inútil

Vida egoísta, sem pista marcada.

Vida sem frutos. Semente tão fútil.

Sentimentos fracos, absortos, mortos.

Sentimentos falsos, egoísmo marcante.

Sentimentos não sentidos, perdidos, malvados.

Sentimentos impuros, tão sujos. Tratantes.

Joguei o livro na lareira. É claro que doía queimar um livro, doía demais. Mas não era um livro dado de bom grado, era em troca de algo, em troca de um beijo com valor; 50 dólares. No fim era uma cadeia bem maluca; livro bom = beijo = 50 dólares!

E isso me causava tantas náuseas que sentia vontade de queimar todas as cópias daquele livro estúpido.

Voltei para casa após ver a última folha com um poema intitulado “Não deixar para depois” queimar. E minha mãe ainda não havia voltado do serviço e ignorava totalmente oque havia acontecido porque eu não havia contado.

Meu pai me ligou naquela tarde e me perguntou como andavam as coisas e eu respondi que poderia estar melhor caso estivesse pior. Acho que ele não entendeu direito, mas ele não precisava entender, só precisava ignorar tudo igual eu fazia. O tempo havia de curar tudo.

Hoje fazem cinco dias desde que queimei o livro e eu fiquei a tarde toda lendo Edgar Allan Poe porque meu humor estava de acordo com seus livros tortuosos, até que alguém bateu na porta e me forçou a largar o livro e atender.

- O carteiro errou as correspondências de novo. Acho que ele nos confunde  com muita frequência. Talvez alguém devesse lhe contar que já não há nada semelhante entre nós, agora.

Era Markus, com uma pilha de correspondências na mão, estendendo ela até mim. Tratei de pegar na ponta para não encostar em uma réstia de pele daquele traidor, sabia que se encostasse tudo voltaria, todo o sentimento bom.

Eu não queria trocar uma palavra com ele, mas sabia que precisava agradecer por aquilo, sabia que seria péssimo não agradecer e aquilo ficaria na minha cabeça pelo resto da tarde me impedindo de ler terror e me forçando a mudar para romance para ler algo açucarado e fútil completamente oposto à minha vida.

- Obrigada.- Agradeci seca e fechei a porta. Mas antes que ela pudesse bater no batente, ele colocou a mão e me impediu de fechá- la.

- Lily, eu... Eu... Você... Você está linda. Me desculpa.

Se As Estrelas Contassem HistóriasOnde histórias criam vida. Descubra agora