𝐂𝐀𝐏𝐈𝐓𝐔𝐋𝐎 𝐔𝐌 - Sobrevivência inesperada

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     Harumi se lembrava apenas de escutar o início de uma luta andares abaixo do prédio que estava, de deslizar pelos batentes das janelas até o andar da loja de conveniências, e de ver um garoto de madeixas morenas gritando, com uma das bombas ma...

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     Harumi se lembrava apenas de escutar o início de uma luta andares abaixo do prédio que estava, de deslizar pelos batentes das janelas até o andar da loja de conveniências, e de ver um garoto de madeixas morenas gritando, com uma das bombas mais mal estruturadas que já viu na sua vida voando de forma desajeitada em direção aquele qual ela planejava atacar de uma maneira que, claramente, aquelas pessoas desconheciam: Furtivamente. Mas ela sem dúvidas se lembrava de sentir neles, a mesma raiva que ela sentia pelo rei de espadas.

     As demais peças foram logo se encaixando em sua mente, fragmentos de apenas algumas horas atrás, quando o Sol ainda se escondia da lua. O rapaz havia saltado do prédio tentando salvar a vida de seu companheiro, ele usava calças do exército e tinha um rosto parcialmente coberto de sangue, não havia como negar que o conhecia, era Aguni, ela apenas não sabia o que estava fazendo ali. Ela se lembrava da decepção que sentiu quando já havia chegado tarde demais para ajudar aqueles jogadores, mas do prazer enorme que teve em arremessar a última faca no rei, que por mais algum milissegundo sequer, teria conseguido escapar da péssima armadilha que os prováveis amigos tinham armado. Harumi se lembrava daquela forma como fora chamada pelo chapeleiro, "Ás de espadas", finalmente ter válido a pena.

     O ás, apesar de ser o primeiro do baralho, e a carta mais fraca nos jogos daquele universo, era o único que matava o rei em diversos jogos que aprendeu durante a vida. A ás de espadas, naquela noite, havia impedido o rei de espadas, para o jogo ser salvo.

     Não parecia uma má ideia, morrer se sacrificando para salvar alguém, ela já havia se conformado com o conforto da morte há muito tempo — antes mesmo de chegar em Borderland —, então quando gritou para Aguni que saltava da janela, aquele qual ela já não via a muito tempo, atirar de uma vez por todas naquela bomba e acabar com a porra daquele rei, ela se sentia incrivelmente em paz, apesar de não ter sido nem ao menos capaz de impedir o reflexo de seu corpo de chutar para longe o inimigo, tomando impulso para saltar por uma das janelas do lado sul do cômodo, enquanto os outros dois haviam saltado pelo oeste. Ela havia se esquecido, de como seu corpo se recusava a seguir seus atos suicidas — também, antes mesmo de chegar em Borderland.

     Quando o prédio finalmente explodiu, Harumi ainda não havia encontrado o chão, ou nenhum outro lugar na verdade, fora apenas no momento em que o calor da pólvora atingiu seu rosto, que seu corpo finalmente repousou em alguma superfície, alguns sacos de lixo, e corpos de vítimas do último jogo. Os destroços haviam caído perfeitamente sobre ela, encostando no outro prédio ao lado, sua cabeça sangrava por algum ferimento que não conseguia distinguir muito bem a posição, seu braço estava tão ralado que pareciam ter passado por um ralador de queijo, e apesar de não fazer ideia de como sairia de dentro daquele único espaço seguro que foi colocada entre o concreto, ela estava magicamente e erroneamente viva.

     Foram poucas as vezes que ela sentiu tanta raiva como naquele momento. Nem ao menos quando finalmente havia decidido morrer, quando o peso da incerteza da vida não lhe pareceu tão pesado quanto o de saber que poderia ajudar alguma pessoa por ali, conseguiu tal feito. Ela havia se contentado com a poesia que a morte lhe causaria naquele momento, e foi preciso um bom tempo até decidir se descontava aquela raiva tentando sair daquele lugar, ou se deixava seu corpo definhar até a morte por ali mesmo, talvez no fim, ela apenas não merecesse uma morte honrosa como a que estava planejando, mas apenas a decomposição junto com restos mortais de outras pessoas.

𝐓𝐇𝐄 𝐑𝐄𝐀𝐋 𝐆𝐀𝐌𝐄 - 𝘚𝘩𝘶𝘯𝘵𝘢𝘳𝘰 𝘊𝘩𝘪𝘴𝘩𝘪𝘺𝘢Onde histórias criam vida. Descubra agora