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Anahi


Eu tento me levantar logo que o vejo, mas as pernas não obedecem o comando do cérebro.

Apesar do uniforme da prisão de segurança média, não parece doente. Ainda assim, eu não consigo disfarçar o choque. É a primeira vez, que eu me lembre, que usa uma camiseta fora de situações de férias.

— Não deveria estar aqui. A prisão não é lugar para uma dama como você.

É a primeira coisa que me fala após dias sem me dar notícias, sem sequer me dar uma pista de que teria sua prisão decretada.

Ele nem chega a se sentar na sala que foi permitida a visita. Olha-me de baixo para cima.

— Boa tarde, pai. O que exatamente esperava que eu fizesse? Sou sua filha. Eu precisava falar com o senhor pessoalmente.

— Sabe que não gosto de emotividade, Anahi.

— Não se trata de ser emotiva. Estou fazendo o que fui treinada para: tentando manter nossa família unida mesmo em meio ao caos.

— A única coisa que tem que fazer é seguir as instruções de Berat.

— O quê?

— Ele me disse que foi visitá-la.

— Se por visitar se refere a ter tentado me intimidar e me dizer que as mulheres dele devem ser obedientes, sim, ele foi me visitar.

— Não fique histérica. O homem está interessado em você e é um excelente partido. Acha que conseguirá coisa melhor?

— Passou pela sua cabeça que eu não estou à procura de um namorado? Ou ao menos me informar desse interesse do seu amigo antes de permitir que ele me ameaçasse dentro da nossa casa… opa, mas espera, a casa não é nossa mais. Nem mesmo aquele helicóptero é nosso.

Eu não consigo parar agora que comecei. Foi uma vida inteira engolindo tudo calada e nem mesmo em um momento como esse ele consegue demonstrar um pingo de sensibilidade.

Deus, eu estou morrendo de vergonha! O advogado que Alfonso providenciou para me acompanhar está escutando cada frase de desprezo que meu pai me dirige.

Nada está acontecendo como eu imaginei que seria. Eu não sei o que esperava, mas certamente não era encontrar um homem raivoso mesmo depois de ter sido confinado no meio de criminosos.

Ele próprio é um criminoso — eu me recordo.

Segundos depois, fico decepcionada comigo por ter sido tão tola, mesmo depois do que descobri a respeito dele.

Eu cheguei aqui, como sempre, à espera de orientação, quando deveria ter entendido de uma vez por todas que sou eu quem vai controlar minha vida daqui por diante.

— Sim, perdemos tudo.

— Tudo?

— Sim, estamos zerados. Por quê? Está precisando de um vestido novo? Se for o caso, sabe onde consegui-lo — debocha.

Eu queria muito falar sobre o “vestido” de um milhão de euros que estou precisando — a dívida que Hayden contraiu com o cretino do Berat —, mas a lealdade ao meu irmão não permite. Além do mais, de que adiantaria? Ele acabou de dizer que não sobrou nada para pagá-la.

— O que veio fazer aqui, Anahi?

— Em primeiro lugar, confirmar uma informação que obtive de que será extraditado para os Estados Unidos.

Eu li nos jornais hoje cedo. A imprensa turca não para de noticiar a prisão dele.

— Informação confirmada. Lá terei mais conforto. Espero ser manejado para uma prisão federal em nosso país. Isso aqui é um inferno na Terra. Qual o próximo tópico dessa conversa inútil?

Eu tenho vontade de gritar de frustração. Nem em meus piores pesadelos eu achei que essa visita acabaria assim.

— Que tal me falar sobre um pacto, ou melhor seria dizer, uma promessa que pediu que seu amigo, o senhor Halil, o padrasto falecido dos irmãos Herrera, lhe fez sobre cuidar de mim e de Hayden caso algo viesse a lhe acontecer?

— O quê?

A pele fica subitamente pálida e por um instante, eu me preocupo, então ele se levanta furioso, vermelhidão se espalhando por seu pescoço.

— Esqueça esses filhos da puta!

Meu Deus do céu, o advogado ouvindo ele ofender o próprio cliente!

— Por que eu deveria fazer isso?

— O trato que fiz com Halil não vale mais. Foi logo quando sua mãe faleceu. Eu nem lembrava disso!

— Mas eles aparentemente sim, e estão estendendo a mão para mim e Hayden.

— Não precisamos daqueles turcos. Eles nos odeiam.

— Você não precisa, porque eu não enxergo outra saída. Nem mesmo aos Estados Unidos podemos voltar, pai. Seria perigoso para nossas vidas.

Eu jogo essas últimas informações intencionalmente para ver se o que Alfonso me contou sobre o narcotráfico procede. Seu rosto me dá a resposta em questão de segundos.

— Não podem mesmo. Precisam ficar na Turquia.

— Por quê? — pressiono.

— Como pode ser tão estúpida? Estamos em uma prisão. Eu não devo falar sobre isso. Será que não pode por uma vez sequer obedecer sem questionar?

Eu sinto como se tivesse levado um soco na boca do estômago e levanto-me lentamente. Demonstro a graça e delicadeza da dama da alta sociedade que sou, mas por dentro, eu grito e choro.

Por mim mesma, por Hayden. Pela família que acaba de se fragmentar de uma vez por todas.

— O problema é justamente o contrário, pai. Eu obedeci sem questionar por tempo demais e agora estou sendo jogada no meio de um furacão.

— Pare com esse drama. Eu já lhe disse. Aceite o pedido de casamento de Berat e todos ficaremos bem.

Casamento?

— Claro. Achou que eu concordaria com menos do que isso? Você é uma Puente. Ele irá honrá-la como uma esposa merece.

Eu olho para ele, mais decepcionada do que nunca, mas também com uma pontada de pena.

— Você está doente, pai. A vida que conhecíamos acabou e está preocupado em obter vantagem me vendendo para um homem desprezível?

— Desprezível? Acha que conseguirá um partido melhor? Berat é um bilionário, Anahi. Ele pode lhe proporcionar o mesmo estilo de vida a que está acostumada.

— Eu quero me desacostumar.

— Do que diabos está falando, sua irresponsável?

— Vou procurar um emprego como as pessoas normais fazem, ao invés de esperar que alguém me sustente.

Eu tento demonstrar coragem, por dentro, estou partida em milhares de pedaços.

Não há emprego no mundo que vá me pagar um milhão de euros.

— Se continuar com essa intransigência, vai destruir o que resta da minha vida, Anahi.

— Estou cansada de pensar no senhor. Eu preciso cuidar de mim mesma e, principalmente, do meu irmão que só tem dezoito anos.

— Um inútil.

— Ele é a única pessoa que me importa no mundo. Eu vou proteger Hayden como prometi à mamãe que faria.

— Não tem nem onde morar!

— Alfonso já providenciou isso.

— Eu a proíbo de aceitar esmola dos Herrera.

— Proíbe porque prefere que eu me torne uma escrava sexual de seu parceiro de negócios.

— Que absurdo! Não diga algo assim. Vai ser esposa dele. Eu preciso de você, filha.

— E vou fazer o que for possível para ajudá-lo, mas não às custas da minha liberdade. Está aqui porque escolheu seguir por esse caminho. Eu estou escolhendo o meu. Adeus, pai. Eu manterei contato.

— Anahi, volte aqui! Eu a proíbo, está me ouvindo? Proíbo de rastejar para os miseráveis turcos!

O Acordo - FINALIZADAOnde histórias criam vida. Descubra agora