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Anahi

— Atividades ilegais? — repito, me sentindo subitamente tonta.

— Quer a verdade ou uma versão suave?

— A verdade.

— Se o que descobrimos for um fato, seu pai tem ligação inclusive com o narcotráfico mexicano.

— Drogas?

Espalmo as duas mãos na mesa, tentando me manter firme porque a sensação que tenho é de que todo o aposento gira à minha volta.

— Não vendendo. Lavando dinheiro para eles. Cenk e eu conversamos ontem e concluímos que não é uma boa ideia voltarem aos Estados Unidos. Aqui, poderemos protegê-los.

— Acha que esses homens… que eles poderiam…

— Eu não faço a menor ideia. Nunca negociei com esse tipo de gente, Anahi. Seu pai estaria mais qualificado para lhe explicar, mas suspeito que não irá fazê-lo.

— Será que eu consigo visitá-lo na cadeia?

— Podemos providenciar isso. Como lhe disse, daremos apoio até que consigam reestruturar suas vidas.

— Mas teremos que permanecer para sempre aqui?

— A ideia lhe desagrada tanto assim?

— Não é o país, é a cultura. Apesar de já estarmos há quase um ano em Istambul, sabemos muito pouco do seu povo. Somos estrangeiros no sentido total da palavra.

— Talvez então esteja na hora de crescer. Tomar as rédeas da própria vida.

A maneira como ele diz isso me põe em guarda outra vez. Por um instante eu cheguei a pensar que havia um oferecimento de amizade por parte dele, dada a promessa que seu padrasto fez a papai, mas agora percebo que estou enganada.

Ele realmente nos despreza. Não apenas o meu pai, mas esse desprezo se estende a mim a e Hayden também.

— Vai perder sua casa muito em breve. Ela pertence agora a Berat Demirci.

— Então é verdade…

— O que é verdade?

— Há cerca de uma semana, o senhor Demirci esteve na minha casa. Ele me disse que eu deveria ir a uma recepção que ofereceria para servir de anfitriã ao lado dele e que depois… — Eu paro e dou um gole na água que o garçom acaba de servir. — E que depois, viajaríamos juntos para a Capadócia. Eu achei que tinha enlouquecido. Nunca nos relacionamos e lhe disse isso.

— E o que mais?

— Ele falou que nossa casa lhe pertencia, e que eu iria me arrepender se não aceitasse a proposta. Apesar de que…

— O quê?

— Não era um proposta. Ele falou que eu não tinha escolha.

Eu decido não contar sobre o dinheiro que meu irmão perdeu em Praga. No meio do caos em que nos encontramos, talvez a família Herrera seja nossa última esperança. Se souberem o quão grave são nossos problemas, não só os do meu pai, mas agora com a dívida do jogo, meus e de Hayden também, talvez decidam nos virar as costas.

— Eu vou providenciar para que se mudem o mais rapidamente possível — diz, já pegando o telefone.

— Como assim?

— Quer ter alguma coisa com Demirci?

O descaso com que ele pergunta isso, depois de ter me prendido em seus braços na noite da festa e confessado que me desejava, é quase ofensivo. Ele deixa claro que a atração que sente por mim não é algo incontrolável.

— Responda, Anahi.

— Não, eu não quero nada com o senhor Demirci.

— Então providenciarei para que tenham um lugar para morar e vou colocar guarda-costas vigiando-os também

Eu gostaria de dizer que não precisa, mas depois das ameaças que o outro turco me fez, eu não vou brincar com a sorte.

— Quando? — pergunto assim que ele encerra o telefonema. Mesmo que eu não tenha entendido a conversa porque ele falou rápido demais com seu interlocutor, sei que era sobre isso.

— Amanhã mesmo, se quiser. Basta me dizer.

— Eu quero. Vou lhe pagar também. Tenho dinheiro guardado. Não muito, mas o suficiente para garantir um teto sobre nossas cabeças. E se vou ficar mesmo na Turquia, pretendo conseguir um emprego.

— Para trabalhar com o quê? Já fez alguma coisa na vida além de ficar linda para ir a festas? Sinto minha garganta trancar.

— Eu mudei de ideia. Não quero jantar, senhor Herrera.

Não lhe dou chance de protestar, me levantando em seguida.

Não foi o que ele disse o que me atingiu como uma pedrada, mas o fato de ser verdade. Tenho vinte anos e não sei fazer nada além de ser um objeto de decoração.

— Como queira. Eu vou providenciar que meu motorista a leve para casa. Assim que conseguir organizar sua mudança e a visita ao seu pai, eu a informarei. Nesse meio tempo, não permita que qualquer um tente expulsá-los de lá e se Demirci aparecer, pode me telefonar — finaliza, tirando um cartão do bolso.

— Se nos despreza tanto, por que se dar ao trabalho de nos apoiar?

— Porque ainda que meu padrasto claramente tivesse um péssimo gosto para amigos, foi o homem que nos criou. Ele merece que honremos sua palavra.

— Mas é um homem rico, senhor Herrera. Poderia perfeitamente ter mandado algum empregado atrás de mim, sem a necessidade desse jantar. Uma visita ao seu escritório não seria mais adequada?

Ele não fala nada, mas percebo que seu maxilar está contraído de tensão. Não planejei provocá-lo, mas há algo no homem que sempre me empurra a entrar em guerra com ele.

— O que está tentando dizer, Anahi? Eu não gosto de joguinhos.

— Nada de mais, apenas algo que me ocorreu. Disse-me que seu padrasto tem um péssimo gosto para amigos ao escolher meu pai como um. Eu lhe digo que de acordo com a antipatia que sentimos um pelo outro, também temos um péssimo gosto para escolher por quem nos atraímos.

Eu termino de falar e lhe viro as costas, andando pelo restaurante de cabeça erguida.

Somente quando chego do lado de fora e vejo o motorista me aguardando é que um pensamento me ocorre.

Sim, eu sinto um passo além de antipatia por Alfonso, mas contraditoriamente, ele também é a única pessoa no mundo, meu irmão incluído nessa lista, com quem fico à vontade para ser eu mesma.

Fecho o cinto de segurança, dessa vez acertando de primeira, já que não tenho aqueles olhos prateados me vigiando os movimentos.

Recosto a cabeça e cerro os olhos, pensando na conversa que acabo de ter.

Alfonso.

O nome dele significa herói em turco e por mais que eu não goste do homem, é isso o que ele será para mim e Hayden no momento. Um herói.

Relutante, cheio de desprezo por nós, mas ainda assim, um herói.

O Acordo - FINALIZADAOnde histórias criam vida. Descubra agora