Capítulo 21

173 23 1
                                    

Eu poderia ser facilmente confundido com o homem mais infeliz do mundo, se não fosse ele. Passei os piores dias de minha existência, dormindo em lençóis que tinham cheiro de erva doce, me cobrindo com cobertores que não chegavam aos pés do calor do corpo dela.
  Eleanor simplesmente não saiu da minha memória em nenhum instante.
  Escrevi cartas todos os dias. Contei-lhe sobre a falta que sentia dela, sobre meus afazeres e fiz questão de deixar claro, que eu era cada dia mais apaixonado por ela.
  E ela me respondeu.

  Querido Aiden,

  Suas cartas tem sido como uma brisa fresca em meio a guerra. Estou tendo problemas com meu povo, alguns desertores amotinados se agruparam contra mim.
  Estive conversando com amigos próximos sobre uma união com os Mackenzie e isso acabou caindo nos ouvidos errados. Um boato se espalhou pelo clã, dizendo que pretendo unir nossos povos.
  Está sendo difícil manter uma boa base aliada e reter a confiança do meu povo.
  Desejo que venha com seus homens e façam acreditar que isso não é verdade e que você não tem interesse em unir nossos clãs.
  Eu sei que nós dois estamos infelizes, porém é melhor assim do que uma guerra indesejada e a chance de estarmos cada dia mais longe um do outro.
  Espero que atenda a esse pedido.
  Também espero te reencontrar novamente.

  Sempre sua,

  Eleanor.

  Terminei de ler a carta e a deixei sobre a mesa, reli mais duas vezes e ainda não sabia o que responder a ela.
  Toda a situação era muito complicada. Visto que não havia nenhuma forma de ficarmos juntos sem abrir mão de alguma coisa.
  Eu iria sim, até lá. Mostraria ao povo que não queria unir nossos clãs. Embora fosse a solução mais simples, aos olhos de todos.
  Tornando nossos povos um só, poderíamos ficar juntos o tempo todo.
  Porém, a ameaça à vida de Eleanor era o principal contra. Uma revolta no clã era extremamente perigosa, além do que Eleanor estava praticamente só naquele lugar.
  Fui até a sala de meu pai, que estava lendo alguns documentos.
  – com licença,meu pai.-- falei, entrando na sala.
  – Aiden, não esperava você aqui hoje.-- ele respondeu, interrompendo o que fazia.
  – preciso falar contigo.
  Meu pai deixou os documentos de lado, me dando atenção.
  – pois diga, meu filho – ele falou, apontando para que eu me sentasse na cadeira à sua frente.
  – meu pai, recebi uma carta de Eleanor. Ela informou que teme uma rebelião no clã, pois seu povo não quer que unimos os clãs.
  – você me disse que não tinham interesse nisso.
  – e não temos. Alguns desertores estão causando problemas, espalhando essa história entre o povo. Causando discórdia. Eleanor corre perigo.
  – Aiden… uma revolta em um clã como os Grant seria fatal para Eleanor. Ela é uma líder recente e provavelmente não tem o apoio dos principais do clã.
  Eu apenas concordei, maneando a cabeça.
  – você pretende ir até lá?-- ele perguntou, vendo meu semblante abatido.
  – com a sua permissão.
  – você tem a minha permissão, meu filho, para tudo que traga paz ao seu coração.
  – meu pai, o que eu farei agora?
  – vai mostrar ao povo dela que você não tem interesse nenhum em nos unir aquele clã miserável!-- ele exclamou, levemente alterado.
  – não, meu pai. Estou querendo dizer, o que farei no sentido mais amplo. Eu não suporto viver longe dela, meu pai! – confessei, desesperado.
  Os olhos do meu pai se encheram de ternura e afeto. Ele segurou minhas mãos, e disse:
  – Aiden, você sabe que eu me casei com sua mãe por conveniência. Eu a conheci na semana do casamento. Ela veio de longe, e quando a conheci, imediatamente a amei. Rose carregava a graça de andorinhas no seu andar. A leveza de uma bruma de verão no seu olhar. Quando você nasceu, nosso amor era maior do que eu poderia sequer explicar. Mas foi breve, Rose foi uma das vítimas da grande epidemia de varíola. Só me restou você. Eu jamais quis me casar de novo, nunca imaginei amar outra mulher. Então, meu filho, eu sei como é amar loucamente uma mulher, com toda sua alma.
  Ele fez uma breve pausa e continuou.
  – seu tio, Angus, conheceu uma camponesa e foi loucamente apaixonado por ela. Assim como eu era por sua mãe. Nossa família é marcada por homens loucamente apaixonados. Infelizmente, os pais dela eram contra o relacionamento, uma família que se assentava junto com desertores a fim de derrubar meu governo. Eu tive que exilar todos. Na época em que sua mãe faleceu, centenas de pessoas tiveram o mesmo fim, inclusive a amada de seu tio. Então, Angus foi à procura de seu túmulo para prestar uma última homenagem. E descobriu que sua amada, quando partiu com os pais para o exílio, estava esperando uma criança. Ele procurou até o fim da terra e encontrou o menino.
  – Duncan?-- questionei, surpreso.
  – sim.
  – então não era apenas um boato?
  – o povo aumenta, mas não inventa. Angus trouxe o menino para cá, tinha três anos, assim como você. Eu me senti culpado, pois a moça foi levada com os pais para longe, no exílio que eu tinha decretado. Então, prometi a Angus que o menino teria sempre um lugar aqui no Castelo. Angus não teve chance de ser pai dele, pois perdeu sua vida em uma batalha, logo a seguir. Mas eu cumpri minha promessa com ele e Duncan permaneceu próximo a mim. Então, meu filho, ainda há outro Mackenzie por aqui, disposto a trazer herdeiros para esse clã.
  – mas por que Duncan não é reconhecido? Quero dizer, como um legítimo filho de meu tio?
  – ele tinha um pai, a moça foi obrigada a se casar com outro, que tinha criado o menino. Com a morte da mãe, Duncan viveria com esse homem. Mas Angus não permitiu.
  Eu fiquei pensativo.
  – mas eu pretendo legitimar Duncan. Ele é um homem de valor, assim como meu irmão era.
  – o senhor está dizendo isso por que, afinal?
  – enquanto você não tiver um herdeiro para ficar no meu lugar, Duncan pode ficar. Eu não vou me opor, se você decidir partir.
  – meu pai…
  – você jamais pediria para Eleanor abrir mão do povo dela. Mas também, vejo que sofre a sua ausência. Eu estou te mostrando a solução.
  Eu fiquei mudo, diante de tudo que tinha ouvido.
  – vou legitimar Duncan, fazendo com que ele entre na linha de sucessão, mais como uma "segurança extra" – ele explicou, fazendo aspas com os dedos – caso eu morra antes. Então, você pode partir para os Grant, com Eleanor. Tenha um herdeiro Mackenzie que irá ficar no seu lugar, na linha de sucessão. Quando eu morrer, seu herdeiro será o senhor. E você fica com Eleanor.
  – o senhor faria isso?
  – Aiden, meu filho. Você não hesitou em se casar com uma estranha para fazer a minha vontade. Por que eu não encontraria uma solução para que você consiga ser feliz?
  Eu simplesmente me levantei e me lancei ao seu pescoço, em um abraço caloroso.
  – oh, Aiden… não precisa disso…– ele resmungou, sendo ranzinza.
  – eu não sei como te agradecer, meu pai – respondi, soltando meu pai e indo em direção a porta.
  – não foi nada, meu filho. E outra, espero logo ter netinhos. Então, não seria nada tão difícil deixar Duncan como meu sucessor por algum tempo.
  Eu sorri concordando e corri para meus aposentos. Preparei minhas malas, coloquei tudo que eu acreditava ser importante.
  Eu decidi partir naquele dia mesmo.
  Precisava ir ao encontro de minha esposa o mais rápido possível. Não tinha tempo a perder. Eu tinha encontrado uma brecha que me garantia um pouco de tranquilidade. Iria para seus braços imediatamente.
  Desci as escadas, chamando por criados e cavalariços, ordenando que preparassem uma carruagem para mim.
  Duncan estava no pátio do Castelo, e ao ver o rebuliço, veio ao meu encontro.
  – o que está acontecendo, Aiden? Para onde vai?-- ele questionou, curioso.
  – Duncan, meu amigo…– exclamei, soltando as malas e pondo minhas mãos em seus ombros – adorei encontrar você aqui.
  – ei… isso é estranho…– ele riu, brincalhão.
  – Duncan, eu estou partindo…
  – para onde?
  – para encontrar Eleanor.
  – oh, que bom. E que triste ao mesmo tempo. O clã Grant é deprimente.-- ele comentou, ainda muito divertido. Eu sentiria falta dele.
  – Duncan, eu quero que saiba…
  – ei, ei. Que papo é esse? Primeiro, seu pai me convoca para um banquete e agora você com esse papo de quero que saiba…
  – você é um cabeça dura! Eu só quero te agradecer por tudo, por ser meu amigo e parceiro. Vou sentir sua falta.-- confessei, abrindo coração.
  – não seja mole, Aiden… irei te visitar… mas visitas curtas, porque não suporto aquele lugar…
  – Duncan, eu te considero mais do que a um amigo. Você sempre foi da família, para mim.
  Ele sorriu de canto. Ele deveria se lembrar de seu falecido pai ou de quando veio para o Castelo. Talvez tenha escutado muito as fofocas pelos cantos da cidade. Porém, Duncan nunca tinha tocado no assunto de ser um Mackenzie legítimo.
  Dei-lhe um abraço apertado.
  – também vou sentir sua falta, Aiden.
  Os cavalariços chegaram com a carruagem e logo embarquei minhas malas. Despedi de meu pai e de meus amigos próximos.
  Não seria um adeus ao clã Mackenzie. Apenas um até breve, pois logo retornaria. Pelo menos a passeio.

Sob as Regras do Clã Onde histórias criam vida. Descubra agora