Capítulo 24

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O festival passou bem rápido.
  Acredito que por conta da grande quantidade de bebida que foi ingerida naquela semana.
  Quando finalmente terminou e nós despedimos de todos os convidados e campeões, restou apenas muita dor de cabeça e ressaca.
  Na primeira noite sem festa, dormimos até meio dia. Dormimos mesmo. Colocando todo o sono em dia.
  Os jogos tinham sido um sucesso: o povo estava feliz, a economia do clã tinha se movimentado muito graças aos visitantes, havia uma perspectiva que um futuro tranquilo nos aguardava.
  Meu pai foi embora junto com todos, não tocamos naquele assunto nenhuma outra vez e fizemos de tudo para que ninguém suspeitasse de que estávamos brigados.
  Eleanor suspeitou sim.
  Pois assim que estávamos descansados e tranquilos, em nossos aposentos, ela se virou para mim com uma xícara de chá e perguntou, sem rodeios:
  – o que houve entre você e seu pai?
  Eu engoli em seco e tentei mentir na cara dura.
  – nada.
  – como assim nada?-- ela insistiu, erguendo uma sobrancelha.
  – não aconteceu nada entre nós.
  – você ficou essas semanas todas sofrendo de saudades e o recebeu com toda alegria. Mas no dia seguinte mal trocaram duas palavras. Passou os jogos sem conversar com ele.
  – conversamos apenas o necessário – insisti na mentira.
  – eu me lembro de que você, Aiden, era o melhor amigo de seu pai. Estava muito orgulhoso pois seu pai tinha permitido que viesse até aqui ficar comigo. Quero sabe o que mudou.
  – não mudou nada, é que…– eu resmunguei, tentando encontrar uma forma de mudar de assunto, e falhando miseravelmente.
  Eleanor pousou a xícara de chá na mesa de centro, olhando-me atentamente.
  – você não quer me contar o que houve. Eu percebi e respeito isso.-- ela murmurou, atenta – mas por favor, não minta.
  – você tem razão, querida, eu e meu pai nos desentendemos.-- eu finalmente falei, suspirando – mas eu não quero falar sobre isso. Não agora.
  E isso não era mentira.
  Eu contaria a ela um dia. Contaria sobre a condição de meu pai, que eu aceitei, mesmo sabendo que as chances de termos um filho eram nulas. Contaria a ela que tomei a decisão de deixar meu clã em troca de ter um filho com ela. Filho, esse, que teria o poder de unir nossos clãs. Isso tudo sem ao menos perguntar sua opinião.
  Mas não podia dizer naquele momento.
  Eu não sabia qual seria sua reação. Ainda
  – certo, Aiden. Quando estiver pronto, saiba que estou aqui para ouvir seus desabafos.-- ela sussurrou, sorrindo.
  Eu fui até ela e a beijei.
  Nem todos os beijos do mundo seriam capazes de explicar o tamanho do meu amor por ela.

  Os dias longos do verão foram rápidos e logo as primeiras colheitas chegaram. Com muito trabalho no Clã, nem cheguei a mandar cartas ao meu pai depois de nosso desentendimento.
  A Festa das Colheitas foi ideia minha.
  – vai ser como uma forma de parabenizar os camponeses pelo trabalho duro – argumentei, acariciando os nós de seus dedos.
  – precisamos da aprovação do conselho – ela respondeu, sorrindo – mas acredito que não vão se opor.
  – nada como uma boa festa para alegrar o povo.-- eu falei, brincando.
  – você tem razão. Os Jogos foram uma excelente ideia. Não tem mais nenhuma dúvida nesse clã de que somos essenciais para esse povo.
  – certo. Amanhã, na reunião, vamos marcar a data. Enviaremos cartas para os fazendeiros e camponeses.
  – tudo que você precisar, querido. Confio nos seus métodos para cativar a população.
  Ela se inclinou para um beijo meigo.
 
  No dia seguinte consegui a aprovação do conselho, que compreendeu que precisávamos da aprovação do povo para que o governo corresse bem. E nada como uma boa festa para alegrar o povo.
  Quando o grande dia chegou, havia fogueiras acesas e bandeiras hasteadas. Uma grande alegria chegou junto com as primícias do campo.
  As barracas de comida atraiam a multidão, junto com algumas competições. Havia uma aura de satisfação que dominava o Clã.
  Algo que não tinha visto ali ainda.
  Fiquei feliz por conseguir mudar o cenário daquele lugar lastimável.
  Me sentei ao lado de Eleanor, como sempre. Eu era seu braço direito, seu parceiro e além de tudo, seu marido.
  Ela comigo que ela passava as noite frias das Terras Altas, era comigo que fazia planos. Eu e Eleanor tínhamos nos tornado um só. Não digo que não discutimos algumas vezes, pois ela era extremamente teimosa, mas nós sabíamos como encerrar qualquer discussão.
  Geralmente terminava na cama.
  Bom, na verdade todas as vezes terminava na cama.
  Era ali que ela finalmente se submetia a mim, visto que o restante do dia, ela estava na posição de liderança.
  E não importava.
  Enquanto eu estivesse ao lado dela, nada mais importava.
  Segurei sua mão, logo após que ela deu início às festividades.
  – maravilhosa, como sempre – elogiei, tirando dela um sorriso sincero.
  – maravilhosa foi sua ideia de fazer essa festa.
  – digamos que eu seja mais do que um Conselheiro Fiscal comum.
  Ela se inclinou e me beijou.
  – bem mais.-- ela sussurrou entre o beijo.
  A festa seguiu bem animada, regada a bebidas e comidas típicas, vários fazendeiros trouxeram prendas para as competições e estava claro que o povo tinha aprovado tudo aquilo.
  – gostaria de uma dança, minha senhora?-- eu perguntei, segurando seus dedos.
  – seria uma honra.
  Ela se levantou e fomos para o aglomerado de pessoas que dançavam. Os músicos tocavam alegremente e o ritmo das danças era agitado.
  Dançamos algumas músicas e depois o ritmo das músicas diminuiu, mais como uma valsa lenta e romântica.
  – era essa música que eu estava esperando – sussurrei, me aproximando dela em um abraço.
  – oh, eu também… estava quase ordenando que tocassem!-- ela brincou, beijando meu pescoço, causando-me um arrepio.
  – que atrevida, senhora Grant.-- sussurrei, embalando-a no ritmo da música.
  – eu gostaria de uma breve reunião contigo, meu marido, logo após a festa, claro – ela informou, inclinando a cabeça no meu peito.
  – seu desejo é uma ordem.
  – combinado.
  Terminamos aquela dança tranquila e aproveitamos o restante da festa.
  Já era madrugada quando terminou.
  Nós dois despedimos o povo e logo nos recolhemos para nossos aposentos. Um cansaço se apoderava de mim.
  Mas eu não tinha me esquecido que Eleanor desejava uma breve reunião comigo. Isso só podia significar uma coisa.
  E o cansaço não podia me atrapalhar numa hora dessas. Respirei fundo e abri a porta de nossos aposentos.
  Ela suspirou e caminhou até nosso quarto.
  Eu a segui, obviamente. Quando a alcancei no quarto, ela já estava voltando com uma caixa de madeira, me surpreendendo.
  – pensei que já estaria de camisola – brinquei, enlaçando sua cintura e trazendo ela para junto de mim.
  Ela deu uma leve risada e se afastou um pouquinho, ainda com a caixa nas mãos.
  – e o que tem aí dentro, minha senhora? Meu bônus por ter a ideia genial da festa da colheita?-- brinquei, beijando seu rosto.
  – bom, bônus não seria a palavra correta.-- ela sorriu, me entregando a tal caixa.
  Analisei bem o pequeno baú, de madeira, bem entalhado e cheio de detalhes. Abri a tampa e fiquei um tanto surpreso e intrigado.
  No primeiro momento, não entendi direito o par de meias brancas de tricô. Retirei as pequenas meias intrigado, eram minúsculas.
  Eleanor não disse nada, apenas me analisava duramente.
  Depois tirei uma pequena touca de tricô, que era mais ou menos do tamanho da palma de minha mão. Repousei a caixa na poltrona próxima e tirei também uma manta do mesmo material e cor dos outros itens.
  Eram peças de roupa de bebê!
  Oh, céus!
  Um bebê!
  Olhei para ela, completamente atordoado e percebi que ela aguardava ansiosa por uma reação minha.
  – isso são…roupas de…– eu conseguir dizer.
  – de um bebê, Aiden.
  – nós…– eu gaguejo – você está…?
  – grávida, Aiden.
  Minha boca se abriu involuntariamente.
  Sem pensar muito eu a abracei.
  Minha cabeça a mil não me deixava processar mais nada.
  – como assim…grávida?-- falei, segurando seu rosto em suas mãos.
  – pois é…talvez um milagre! Faz dois meses que minhas regras não vêm. Tenho me sentido estranha…então falei com a curandeira…– ela disse, eufórica – finalmente vamos ter nosso filho, Aiden!
  Ela me abraçou carinhosamente, cobrindo meu rosto com beijos. E eu não sabia como reagir. Porque realmente eu não estava esperando por nada daquilo! Um bebê era a última coisa que eu esperava!
  Não significa que eu estava triste. Isso jamais. Mas foi inesperado. Eu estava feliz por Eleanor estar grávida, muito feliz.
  – o que houve?-- ela perguntou, analisando meu olhar.-- não era essa a reação que eu esperava…
  – digamos que eu não estava esperando por isso – eu expliquei, acariciando as peças tricotadas com carinho – mas não quer dizer que não estou feliz.
  – eu sei, pensávamos que isso jamais aconteceria… mas aconteceu. Estamos com um bebê Grant Mackenzie a caminho.
  Ela se lançou ao meu pescoço, carinhosamente. Porém a forma que ela disse, "bebê Grant Mackenzie", gelou meu corpo por dentro.
  Eu a beijei, tentando afastar toda ansiedade que se apoderou de mim.
  Desci minhas mãos até o seu ventre, onde estava sendo gerado meu pequeno herdeiro, cuja chegada tinha sido inesperada.
  – ele já está aqui – falei, num sussurro
  – sim – ela respondeu, com o sorriso mais largo que eu já tinha visto na vida, acariciando a barriga.– em algumas semanas vai dar para notar, mas ele já está aqui.
  – oh, céus, sou o mais sortudo dos homens…– comentei, me inclinando para acariciar de perto, encostando meu rosto em seu ventre – está ouvindo, pequeno? Seu pai é o mais sortudo dos homens!
  Eleanor correu os dedos entre meus cabelos carinhosamente.
  Nossas carícias continuaram e aquilo terminou na cama. De uma forma tão leve e suave, dócil e gentil. Eu estava ali com a mulher da minha vida e a mãe do meu filho. Ela, nos meus braços, significava todo amor do meu mundo.
  Quando ela adormeceu, tomei a liberdade de levantar o cobertor e ficar olhando para sua barriga. Ainda estava normal, nada de diferente. Mas comecei a pensar que em algumas semanas estaria crescendo e ali dentro também cresceria meu filho.
  O bebê Grant Mackenzie.
  O bebê esperado pelo meu pai. Tal criança seria herdeira dos dois clãs mais poderosos e influentes da Escócia. Tendo assim o poder de unificá-los e criar um Clã supremo nas Terras Altas.
  Mas Eleanor não sabia desse plano.
  Ela não podia saber que eu tive passe livre para viver com ela no Clã Grant em troca de fazer um filho com ela. Apenas como parte de um plano de meu pai.
  Afinal, eu não saberia sua reação.
  Em minha defesa, até recentemente, eu não sabia desse plano.
  Fiquei a madrugada toda pensando se deveria contar a ela. E decidi que não era a hora.

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