Sangue de Dragão

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Meus punhos viviam abertos. Entrar em uma briga era meu esporte favorito. Parecia que a raiva era apenas liberada quando socava a cara de alguém.

Na delegacia aos dezesseis anos esperava encostado na parede e chão gelados na cela, o responsável que buscaria o delinquente na madrugada de sexta-feira.

Na minha ficha era a primeira vez que estava sendo detido, mas em briga, perdi até as contas.

O número dos meus pais não constavam no registro e com direito à ligação, pensei em apenas uma pessoa que sempre foi meu anjo salvador.

— Olá, oficial, sou o responsável por Daemon Targaryen — a voz masculina ecoou pelos corredores e me inclinei para o lado tentando vê-lo.

— Você seria o pai dele?

— Não, sou tio. Aemon Targaryen.

Poderia chamar minha mãe, ela sempre me defendeu me intitulando de "o sangue de dragão". Esse apelido carinhoso era sempre citado quando a raiva tomava lugar da razão, algo que acontecia com frequência. No entanto, tio Aemon era calmo e gentil, esconderia as travessuras e problemas do meu pai deixando-o menos envergonhado.

A felicidade de chegar em casa e não ouvir um sermão de quatro horas de como Viserys era extremamente maduro e responsável era um grande alívio.

Ouvi passos aproximando da pequena cela e antecipei qualquer chamado, permanecendo prontamente de frente para as grades.

Os olhos preocupados e semblante cansado do meu tio, apenas confirmaram como meu rosto deveria estar. Um caos sangrento.

Posso assegurar que a outra pessoa está bem pior. Conseguia apenas sentir o gosto metálico do lábio sangrando e a ardência do ferimento próximo à sobrancelha.

— Daemon, Daemon! — balançava a cabeça de um lado para o outro negativamente — Vamos! Temos muito o que conversar.

Não consegui responder e caminhei ao seu lado, com as mãos no bolso, conforme indicava.

Entrei no banco de passageiro, cruzando os braços e apenas focando meu olhar no retrovisor. Por mais que meu tio fosse um cara legal, não conseguia encará-lo com a expressão de desapontamento.

Sim, eu era diferente, agitado, problemático, nervoso, minhas notas escolares eram ótimas mesmo para um garoto que não permanecia na sala e aparecia apenas para as provas.

Não reprovei nenhum ano pelo poder e status da minha família e aproveitei bem esse privilégio. Coisa que meu irmão não fazia.

Tio Aemon olhou por alguns minutos o meu rosto, pegou no porta-luvas um lenço e uma garrafa de água no porta-copos.

— Limpe-se! — ele jogou no meu colo — Sua tia ficou desesperada quando soube onde estava. Vamos amenizar o estrago.

— Você ligou para minha mãe? — perguntava enquanto limpava o sangue do rosto, tentando enxergar com dificuldade o espelho.

— Deveria, mas não. Alyssa está grávida, não quero preocupá-la — virou o rosto na minha direção, vendo a dificuldade em me limpar — Você deveria pensar no bem-estar dela.

Tirou o lenço da minha mão e puxou o meu rosto, sem machucar, mas firme até ele. Molhou um pouco com água e voltou a limpar, calmamente.

— Eu penso nela, mas certas coisas acontecem quando estou em uma festa que não consigo me controlar.

— Primeiro, você não deveria estar em uma festa. Segundo, não quero saber os motivos, quem estava detido era você, certo ou errado a violência não é o único caminho Daemon.

Tinha argumentos plausíveis para debater, mas ele estava aqui me ajudando, levando até sua casa, não preciso ser um pirralho birrento. Concordei educadamente.

— Só me responda com sinceridade apenas uma coisa, — olhou atentamente em meus olhos púrpuras, iguais aos seus — você usa drogas?

— Não! Isso é burrice! Apenas cigarro, nada, além disso.

— E cigarro não é uma burrice? — ele riu, mesmo tentando manter a postura de tio responsável.

— Uma burrice menor? — respondi com uma careta, tentando jogar o melhor argumento sem ofender.

Ele riu, bagunçando carinhosamente meus cabelos longos no topo da cabeça. Era um carinho que significava "quero bater, mas eu amo esse moleque".

— Rhaenys quer socar a sua cara, palavras dela — ligou o carro e seguiu a rua de asfalto.

— É a cara dela falar isso mesmo — encostei no banco ajustando o cinto de segurança.

Essa lembrança surgiu enquanto olhava o porta-retrato na casa de Rhaenys e Corlys. Comemoravam o aniversário de casamento com uma grande festa para toda a família.

— Meu sexto sentido sempre foi aguçado. Sabia que estaria aqui revivendo o passado problemático e quantas vezes meus pais livraram sua bunda de uma surra — Rhaenys apareceu na porta da biblioteca de sua casa com duas taças cheias de um bom vinho — Venha primo, beba comigo!

— Estou dirigindo doida, não posso comprometer a segurança de Rhaenyra e Aegon.

— Quem disse que vocês vão embora hoje? — estendeu o braço com a taça insistindo — Beba e durma aqui, amanhã é outro dia.

Um convite tentador e ela sabia que aceitaria. Mulheres fortes e decididas me faziam acatar qualquer ordem. Não é atoa que Rhaenyra me fisgou tão fácil.

— Aegon é sua cara, não diga para Rhaenyra! — ela bateu ombro com ombro, brincalhona bebendo um gole modesto da taça — Cresceu tão rápido, dois anos e corre de um lado para o outro sem perder a energia.

— Só espero quando crescer, não seja sangue do dragão igual fui — encostei na mesa devolvendo o porta-retrato e bebendo o bom vinho.

— Sangue de dragão — ela suspirou — que saudades da tia Alyssa — olhou cabisbaixa para a taça, fazendo pequenos círculos no vinho, conforme movimentava a mão — Eu amava quando ela te chamava assim brava.

Ri, sentindo saudade e o peito dolorido.

— Eu também!

O som de passos pesados e rápidos reverberou pela sala. Ofegante e impaciente, Nettles chegava correndo atrás de Aegon que se escondia debaixo das minhas pernas.

— Pai, dá um jeito nesse moleque, ele não desliga!

— Você quis um irmão, não é?

— Sim, mas não imaginei que seria um mini demônio prateado me desafiando o tempo inteiro.

Aegon levantou seu rostinho rechonchudo e olhos de gato de botas entre minhas pernas. Balbuciou um som tentando dizer algo e levantou os pequenos braços pedindo colo.

— O que você quer, Aegon? — desci aproximando o tronco — Precisa tentar falar. Vai colo papai, colo!

— Ele não vai falar assim sendo pressionado Daemon — retrucava Rhaenys fazendo caretas fofinhas para ele.

— Aegon tem dois anos e se mostrou preguiçoso em falar, preciso incentivá-lo a pelo menos tentar.

— Comigo, foi assim também? — Nettles encostou no batente da porta curiosa.

— Não, você falou mais rápido, mulheres se expressam mais rápido que homens, é a natureza de vocês.

— Está querendo dizer, com palavras bonitas, que falamos demais? — Rhaenyra apareceu na porta com as mãos na cintura e a sobrancelha levantada.

Por Deus, ela ficava tão gostosa com cara de mandona.

— Aegon, as mulheres querem me bater, me defenda — peguei-o no colo e coloquei como proteção de frente para o meu rosto.

— Não use nosso filho como escudo! — estufou o peito ainda mais nervosa e juro que se estivesse sozinho, sem aegon nos braços, agarraria aqueles peitos maravilhosos e não soltaria nunca mais — Vamos, meu pai chegou!

Viserys estava completamente recuperado de seu acidente. O semblante era mais saudável e parecia imensamente feliz. Infelizmente não afastou a corja Hightower como gostaria. Continuou com Alicent mesmo após as alegações feitas e pediu (quase como uma ordem) que encerrássemos essa discussão.

Sempre tão ingênuo.

A vaca verde permanecia ao seu lado, com cara de nojo e empática não desgrudando os braços de Viserys. Queria manipulá-lo nos mínimos passos. Por sorte Otto não estava junto, mas o pau no cu do seu segurança, Criston Cole, permanecia colado neles.

Talvez estivessem colados na cama também depois do sono pesado do meu irmão.

Como ele não consegue ver isso?

Viserys abraçou carinhosamente Rhaenyra.

— Minha única filha — colocou o rosto dela entre suas mãos olhando-a admirado.

Fazia tempo que ele não a via. Depois que assumiu a empresa como CEO, seu tempo ficou escasso e as visitas em sua casa diminuíram.

Rhaenyra ainda estava magoada com tudo. Ficou ao lado dele durante a recuperação até se assegurar que nada de ruim aconteceria novamente. Sempre foi justa, benevolente, mas não boba. Ela nunca esquecia uma ofensa.

Por um milagre, a vaca verde se desvencilhou dele e seguiu até a minha direção com os olhos vidrados em Aegon.

Tentou chamá-lo para o seu colo, passando as mãos nas costas dele como se fosse uma pessoa confiável.

Virei o corpo não deixando tocá-lo.

— Não quero você tocando no meu filho.

— Ainda com esses pensamentos sobre mim? — ela olhava ofendida — Quantas vezes preciso provar que não fiz nada de errado com Viserys?

— Nunca vou acreditar!

— Foi um acidente! A inspeção foi feita, as provas jogadas na mesa. Nem Viserys toca mais nesse assunto e continuamos felizes juntos.

— Meu irmão é ingênuo Alicent. Não é atoa que você conseguiu casar com ele.

O rosto se contorceu em fúria. Tentava amenizar qualquer ataque para não chamar atenção de todos.

— Não vou aceitar ofensas sem provas, calúnias contra o meu caráter — sussurrou apenas para eu ouvir.

— Minha desconfiança não é mais sobre o acidente dele, mas sim pela morte de Aemma.

Seus olhos castanhos arregalaram surpresos.

— Eu sei que foi você e seu querido pai, só preciso provar.

Ela se aproximou, audaciosa, rastejando como a cobra que é, ficando ao meu lado, destilando seu veneno.

— Tente o quanto quiser, — ela sorriu — mas isso você nunca vai provar — Alicent foi embora em direção do meu irmão, olhando sobre o ombro.

Desconfiar e ter quase certeza de tudo o que aconteceu com Aemma era uma coisa, mas ouvir a confirmação debochada da boca de sapo da Alicent era outra.

Nesse momento aquela raiva da adolescência percorreu meu corpo. A única vontade que sentia era esmagar a cabeça dela, no chão, desconfigurar até não restar nada, sumir como a inútil e nojenta verde que ela é.

Aegon nos meus braços felizmente me impediu e uma mão salvadora como seus pais, pressionou meu ombro.

— Calma sangue de dragão, não vale a pena! — Rhaenys me acalmava — Violência nunca é a melhor solução.

— Rhaenys...

— Eu sei, vamos com calma. Estamos tão próximos de provar e Rhaenyra não sabe de nada ainda, nem desconfia. Hoje é um dia de celebração, então beba primo e festeje comigo.

Rhaenys fez exatamente o que seus pais fariam. Me salvariam de qualquer desgraça.

***

Nota: Felizmente veio uma pequena inspiração nesse domingo chuvoso (aqui em SP está frio). Estou passando por bloqueio criativo (kkkkrying), mas hoje decidi lutar um pouco. Escrever (e desenhar) é a minha válvula de escape. Então espero atualizar todas as fics hoje ♥

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Beijooos

Estranhos PrazeresOnde histórias criam vida. Descubra agora