A forma de liberar minha raiva sempre foi batendo em algo ou em alguém. Nesse caso não existia nenhum culpado para descontar a minha raiva, então, esmurrei a árvore mais próxima do cemitério.
O padre dizia palavras de conforto durante o funeral, pessoas que nunca ligaram para ela, choravam de remorso e a garganta fechava subindo um gosto amargo ao ver a falsidade desenfreada.
Sorrisos falsos.
Pessoas estúpidas.
Sai de perto ignorando todos. Não conseguia me despedir, ficar próximo das sanguessugas fazendo um show de quem sofria mais. Estava com raiva e usei de todo o meu autocontrole para não desconfigurar o rosto de alguém. Existiam poucas pessoas que amava nessa vida, e o destino levava para si uma por uma.
No entanto, essa que ele levou era a mais preciosa desse mundo.
— Você prometeu nunca me deixar!
Fiquei sozinho na lápide, olhando para os dizeres "Esposa, mãe e mulher incrível", claro, são os dizeres do meu pai e concordo com ele, mas ela era mais que isso. Um ser humano diferenciado, repleta de entusiasmo e energia.
— Você me deixou!
Queria que ela conhecesse minha futura esposa, meus filhos e filhas, que brincasse alegremente e pregasse alguma peça com eles do jeito mais infantil que conseguia. Ela se foi e só tenho 16 anos. Meus filhos nunca saberão das suas piadas e histórias. Será apenas uma memória.
Será que nunca mais lembrarei como era sua voz? Seu cheiro?
Somente uma figura materna saberia aconselhar em momentos mais difíceis e agora, nunca mais terei esses conselhos.
Não conseguia chorar. A dor rasgava meu peito tão ferozmente que as lágrimas secaram e apenas uma enorme melancolia irradiava por todo o meu corpo.
Abracei os meus joelhos apoiando meu rosto, sentado no espaço onde ela foi enterrada.
— Você não tinha o direito. Como será minha vida sem você? Você me prometeu!
Meu irmão Aegon não resistiu também e por um lado não senti tristeza, culpei o bebê pela morte dela.
Que culpa carregaria essa criança? Nasceu para outro morrer.
Quem sou eu para julgar uma criança que nem aos menos teve o direito de viver.
Deixei meus pensamentos de rancor de lado. Perdi mãe e irmão.
Perdi minha melhor amiga.
— Ela não está mais aqui, mas eu estou, Daemon.
A voz calma como sempre foi. A sensatez que sempre teve. Mesmo sofrendo, ele estava em pé, porque precisava estar em pé.
— Eu sei pai — disse com a voz levemente embargada — mas ela me prometeu.
— Você sabe que isso estava fora do alcance dela — sentou ao meu lado — e disse apenas para não preocupá-lo ainda mais.
— Queria ouvir a verdade. Dessa forma a dor seria menor.
Meu pai me olhava com o semblante sereno. Suas sobrancelhas juntaram, preocupado ao ver meus punhos abertos e sangue escorrendo.
Pegou minha mão estudando os machucados.
— Até quando você vai ser assim Daemon?
Dei de ombros, despreocupado. Não era novidade, cicatrizes em meu corpo por decisões burras. Lidar com palavras não fazia parte da minha personalidade.
— Eu te amo filho e sempre vou te amar. Não importa a situação, sempre estarei aqui.
— Você tem seu preferido. — ri ironicamente — Eu sou apenas o problemático.
Ele respirou pesadamente ficando em silêncio por alguns instantes. O som das árvores batendo com o vento ecoou em um murmúrio velado. Pensou bem antes de falar, isso era o melhor das suas qualidades. Não era esquentado para dizer algo no calor da emoção, mas também não era bobo em aceitar tudo calado.
Eu o admirava.
Porém, sempre fui o menino problema dele.
Queria que me amasse como ama Viserys.
— Quando você nasceu, seu choro alcançou notas surpreendentes, brincava até que seria um cantor de ópera — ele sorriu com a lembrança — Sua mãe dizia que sempre tinha algo a dizer e quando queria uma coisa, não existia nenhuma pessoa que mudasse a sua vontade. Entretanto, você só se acalmava comigo.
Seu maldito olhar acolhedor. Ele estava me acalmando nesse exato momento.
— Quando ficava em meus braços, dormia sereno e gostava de apertar meu dedo mindinho — levantou o dedinho carinhosamente — e passava horas comigo.
Meu pai sempre discursava os sermões mais longos e tenebrosos. Pedia um castigo ou uma surra para ficar em silêncio, mas quando contava histórias que representavam sua vida, era o paraíso. Falar de algo calmo com a minha infância, era o melhor dos presentes.
— Eu te amei desde o momento que nasceu Daemon. Mesmo sendo o meu garoto problema, você sempre será meu filho, a melhor lembrança de Alyssa.
As lágrimas saiam sem aviso.
Maldito rosto traidor.
— Nunca tive preferência entre vocês. Sua mãe tinha, — uma careta controversa estampou seu rosto - você sempre foi o dragão dela.
— Não sou tão bom quanto Viserys...
— Sempre tive orgulho de você.
Finalmente olhei para seus olhos, surpreso pelo comentário.
Porque sentiria orgulho de uma pessoa que apenas causava o caos?
— Orgulho? Sem palavras doces, não preciso disso pai.
— E alguma vez falei algo apenas para você se sentir bem?
Isso era verdade. A sinceridade dele era notável. Não gostava de bajular, nem mentir, era um homem de verdades e honrado. Queria ser igual a ele, mas pelo visto o sangue de dragão corre intenso em minhas veias.
— Agora é apenas eu e você — apertou forte em meu ombro com um conforto silencioso — Viserys tem sua família agora, uma linda garotinha chamada Rhaenyra. Eu... Bom... Só tenho você. Promete não deixar esse velho homem para trás?
Sorri enxugando as lágrimas. Sempre o chamei de velhote, mesmo com o tempo sendo generoso com ele.
— Obrigado pai.
— Agora vamos — levantou limpando as mãos na calça e tirando as folhas do corpo — Rhaenys procurava por você com as seguintes palavras: "Onde está o babaca do meu primo?" — ele riu.
— No dia que ela me elogiar o mundo acaba.
Andei com ele lado a lado, contando histórias, lembrando da minha mãe e deixando a tristeza de lado. Ela jamais aceitaria drama por sua morte, sempre se preparou para a única certeza da vida.
Decidi por fim, ficar apenas com a saudade.
Meu pai se foi, depois de um ano.
Ele não suportava uma vida sem ela.
Eu entendia perfeitamente e não senti raiva. Apenas saudades.
***
— Daemon! Me ajuda por favor — Rhaenyra andava desesperada com Aegon chorando em seus braços — ele não para de chorar!
Peguei meu pequeno nos braços e balancei suavemente cantando calmamente. Como um passe de mágica, Aegon parou de chorar e dormiu ao sono dos anjos. Inconsciente, ele agarrou forte em meu dedo mindinho e ficou embalado no calor dos meus braços.
— Herdei esse dom do meu pai, sabia? — sussurrava apenas para ele — Espero que não seja um garoto problema.
***Nota: Um flashback para celebrar o dia dos pais ♥
Espero que gostem e por favor deixem comentários, eu amo ler cada um deles. Me siga no Twitter: moneceles
Beijooos
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Estranhos Prazeres
FanfictionConteúdo: ADULTO (+18) Rhaenyra participa do casamento de seu pai, Viserys, com sua amiga (ex amiga agora) de infância Alicent. Em meio ao turbilhão de emoções, seu tio Daemon aparece após diversos anos. Ela não sabia que esse reencontro reacenderi...