Vazio

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Vazio!

Era o único sentimento que habitava meu corpo. Não consigo comer, levantar, viver. Estou presa nessa cama por diversos dias desde quando perdi minha filha.

Estava com cinco semanas, mas sabia que era uma menina.

Planejei essa gravidez desde o momento que Daemon demonstrava querer mais filhos. Ele não se importava em ter uma creche e Aegon precisava de outra criança.

Parei com qualquer contraceptivo, ansiava por esse momento e quando descobri indo até o consultório escondida, gritei de felicidade.

No entanto, nunca imaginei que uma carta acabaria com tudo.

Culpei Daemon nos primeiros dias, o evitei, não falava ou tocava nele. Um abismo sem fim residia em minha alma e queria apenas achar um culpado, mas o peso na consciência foi maior. É injusto culpá-lo por algo que sofria tanto quanto eu.

Ainda me sinto ferida, traída, machucada por esconder algo tão sério e importante. Era minha mãe, deveria ser a primeira a saber. Não confiou no meu bom senso e imaginou que agiria de forma irresponsável apenas por emoção.

Ele queria me proteger. Respeito isso.

Porém, esconder qualquer coisa em nosso relacionamento não era um bom sinal.

Daemon aproximou em passos lentos, sentando na beirada da cama. De costas, agarrada com meu travesseiro, conseguia notar sua tristeza. Não disse nada, senti por um momento sua mão aproximar do meu ombro, mas distanciou antes de tocar. Provavelmente não gostaria de começar uma briga, me machucar mais do que estava machucada.

— Aegon precisa de você! — sua voz era baixa, uma súplica pela minha melhora.

Como poderia cuidar de Aegon se não encontro forças para me erguer? Não sinto vontade de viver, de ter mais filhos e sofrer por perder um bem tão precioso.

As lágrimas não saem mais.

Eu era apenas um vazio.

Oca.

Ventre sem vida.

O peso da cama indicava Daemon deitando ao meu lado. Ele envolveu seus braços em minha cintura, forte e urgente. Enterrou seu rosto em meu pescoço e ficou ali, apenas demonstrando com ações o quanto estava sentido. Não existiam palavras que mudariam meu estado, mas o calor do seu corpo, o carinho dos seus braços, trouxe um pouco de afago, nesse vazio.

— Deveria ter te contado, minhas intenções eram apenas te proteger — ajeitava delicadamente uma mecha caída em meu rosto.

Não sentia vontade de falar. Se tentasse, as palavras não sairiam.

— Sinto a mesma dor que você, perdi um filho também Rhaenyra.

— Filha... — a resposta saiu trêmula — Era uma menina.

Sua cabeça ergueu por cima do meu rosto e ouvir a minha voz, parecia ser um enorme presente para ele.

Depois de tantos dias sem vê-lo, me permite vislumbrá-lo. Havia círculos negros debaixo de seus olhos, afirmando não ser a única que não conseguia dormir. Ele estava tão destruído quanto eu.

Girei o corpo, colocando as duas mãos em seu rosto, sentindo a barba pinicar. Encostou testa com testa como sempre fazia, um gesto de carinho característico dele.

— Não é o fim meu amor — sussurrava — te darei quantos filhos e filhas desejar, mas Aegon precisa de nós.

Olhei fixamente em seus olhos.

— Eu preciso de você!

Aquelas lágrimas que haviam secado, voltaram intensamente, fazendo cobrir meu rosto com as mãos, tentando esconder a dor que sentia.

Daemon sentou na cama, me puxando forte para o seu colo e abraçou, acariciando meus braços e me envolvendo, tentando proteger de algo que não fazia ideia do que seria, mas ele estava ali, me dando carinho e cuidando de mim.

— Nada me doe mais do que te ver sofrer e não poder fazer nada.

Chorei por longos minutos. Era uma devastação de dor e sofrimento saindo do meu corpo. Soluçava e agarrava seu corpo não querendo soltar nunca mais.

Ele era meu refúgio.

Ainda estava triste, mas não conseguia seguir sem ele.

***

Me sentia fraca ao ficar em pé e com medo de desmaiar, pedi para Daemon me ajudar a tomar um banho e tentar voltar a minha vida. Voltar ao meu menino doce que apenas queria a mãe.

Daemon cuidou de mim. Não apenas ensaboando meu corpo devagar, secando cada parte e dobra da pele. Ele dizia palavras de conforto, o quanto era especial, a mulher forte que sempre fui, o grande amor da sua vida. E uma frase, que era rara de ouvir, saiu de seus lábios:

— Eu te amo! — disse enquanto enrolava a toalha em meu corpo.

— O quê? — fingi não ouvir, queria que dissesse mais uma vez.

Ele ergueu meu rosto com as pontas dos dedos pressionados em meu queixo. Aproximou, roçando seus lábios nos meus, devagar e carinhoso.

— Eu te amo! — disse sorrindo, encostando lábio com lábio, passando as mãos em meu rosto, fazendo círculos com os polegares em minhas bochechas.

Quando se distanciou o puxei de novo urgente, abrindo a boca e consumindo. Era da sua intensidade que precisava.

O beijo dele sempre foi com sentimento, ele realmente gostava de beijar, saborear a minha boca e tentar demonstrar os sentimentos com dentes e chupões deixando os lábios inchados e o corpo quente.

Daemon me acariciava forte, passando as mãos por todo o corpo, querendo apenas me sentir.

Estava frágil e querendo-o tanto dentro de mim para preencher o enorme vazio.

— Quero você! — sussurrei, entrelaçando os dedos nos longos cabelos.

— Devagar meu amor — me puxava para o seu colo — tudo ao seu tempo, agora quero apenas cuidar de você.

Concordei. Ele sabia que meu psicológico estava abalado, meu corpo fraco e queria encontrar alguma forma desesperada de felicidade.

O médico disse para esperar, passar 40 dias até o útero ficar limpo, fazer exames e tentar de novo.

— Você vai se vestir, comer algo e ver Aegon. Ele chama apenas por você.

— Onde ele está agora?

— Laena e Laenor vieram buscá-lo, passar o dia brincando em um parque.

Os Velaryons são sempre maravilhosos comigo. Aegon não presenciar meus dias de melancolia me deixava aliviada. Não gostaria de nenhuma lembrança de dor e tristeza para ele. Queria apenas a felicidade.

***

— Não quero que ninguém saiba! — afirmei tomando finalmente um café da tarde.

— Ninguém sabe! Disse apenas para Laena e Rhaenys que você estava indisposta e precisava de cuidados, nada grave.

Respirei aliviada. Nenhuma notícia sobre a minha perda poderia chegar aos ouvidos do meu pai, principalmente de Alicent. Não estava a fim de repercutir nenhum comentário ou dar um gostinho de satisfação para ela.

Já era complicado lidar com tudo o que houve nesses dois anos. Comprovando o acidente da minha mãe, eu acabo com essa desgraçada.

— Quero resolver com você as provas que faltam para julgar Alicent.

— Faremos juntos! — confirmou apertando com carinho minha mão, ao meu lado.

— Me prometa, — apertei sua mão — nunca mais esconder nada! Me contar tudo, não importando se vai me machucar.

— Eu prometo! — seu olhar era sério e tive a certeza que estava sendo sincero.

Retornei a minha atenção à xícara de chá. Voltei a comer aos poucos, meu corpo rejeitaria uma quantidade grande de comida de apenas uma vez, mesmo meu estômago reclamando de fome, queria ir devagar.

— Como não vou mais esconder nada de você, já conversei com Mysaria sobre a papelada do nosso casamento.

Pisquei diversas vezes, paralisada não acreditando no que acabei de ouvir. Não esperava essa notícia, na verdade, não imaginei que ele realmente faria isso.

— Não brinque comigo Daemon!

— Não estou brincando. — ele sorria tão gentilmente que senti meu corpo quase se desfazer no chão da sala de jantar — Acertei com ela e está vendo tudo o que precisa pagar, comprovar, as questões do incesto, enfim...

Pulei de onde estava, derrubando-o no chão. Me olhava assustado, não esperando uma reação tão animada.

— Pensei que não queria se casar comigo.

— Nunca disse isso.

— Mas foi indiferente quando sugeri, disse até que era apenas um pedaço de papel.

— Rhaenyra, — olhou meu rosto, ajustando as madeixas caídas em meus olhos — me diga uma coisa que não fiz por você?

Aquele enorme vazio se dissipou e a felicidade preencheu qualquer tristeza que antes habitava.

— Agora minha linda noiva, pense comigo, — continuava seu raciocínio, analisando todos os detalhes do meu rosto — você vai escolher o vestido mais lindo — beijou a ponta do meu nariz — a data perfeita — beijou a bochecha — e Aegon vai levar as alianças — beijou minha boca.

— Oh meu deus! Aegon pode levar as alianças!

Meu pensamento começou a projetar em como tudo seria, no quão adorável estaria Aegon levando as alianças e nada mais me deixaria triste novamente, precisava disso.

Um enorme sorriso se formou em meu rosto e a euforia voltou alegremente.

Daemon me puxou pela cabeça para melhor acomodar o beijo. Um beijo aliviado se assim poderia descrever. Ele era todo lábios e dentes, mãos pelo corpo e os sons que fazia, me deixavam quente.

— Quando passar o tempo que o médico indicou, vou encher você de filhos — sua boca percorria o pescoço e meu corpo grudou ainda mais no seu, jogados no chão gelado.

— Daemon...

Antes de terminar a frase, sua boca cobriu a minha novamente, aprofundando o beijo e pressionando as mãos na cintura, trazendo meu corpo ainda mais para cima.

Paramos o beijo para respirar. Ofegante e ainda extasiada por ele, abria os olhos devagar, voltando para a realidade.

— Você é linda.

Ainda não conseguia processar a suavidade daquelas palavras, o rosto bonito, sorrindo provocante, o jeito natural dele.

— Daemon, não sei se quero engravidar de novo. — dei de ombros, acrescentando um sorriso forçado, tentando suavizar a frase.

Franziu o cenho com certeza odiando o que ouviu.

— Por que não?

— Não quero passar por isso de novo, é horrível a sensação e tenho medo. Se engravidar, o medo vai tomar conta e não vou conseguir seguir com a gestação.

— Ei! — olhos em meus olhos — Não vai acontecer de novo!

— Você não pode afirmar isso e nem evitar.

— Posso e vou, mas vamos tentar apenas quando estiver bem, certo?

— Certo! — não estava confortável ainda para conversar sobre isso e ele sabia.

— Agora voltando ao assunto sobre esconder as coisas um do outro, você sabia que Nettles não estava mais com Alyn e não me contou.

Merda!

— Ela pediu para não contar, é diferente. — levantava do chão, fugindo de qualquer sermão.

— É minha filha, você deveria ter me contado.

— Nett ficou com medo de você cometer algum assassinato.

— Como se eu fosse assim...

Na mesma hora, lancei um olhar irônico fazendo-o recuar.

— Um pouco colérico, mas não estúpido.

— Suas cicatrizes dizem outra coisa.

— Ok, um pouco estúpido, mas agora estou mais velho e menos impulsivo.

Isso me tirou um sorriso. O jeito confiante dele em resolver tudo me acalmava. Daemon não gostava de deixar a bomba estourando em minhas mãos, resolvia tudo antes de saber, antes de me machucar, era um cuidado que ninguém fez.

Não conseguia mais imaginar como seria viver sem ele.

***

Espero que gostem e por favor deixem comentários, eu amo ler cada um deles. Me siga no Twitter: moneceles

Beijooos

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