Irmandade

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Desde o som furtivo da maçaneta abaixando, até os olhos apavorados de Cora ‒ quase sem vida ‒ virando para Seung, pedindo socorro silenciosamente.

Questionou-se sobre as escolhas até chegar naquele estado. Definitivamente, nenhuma coisa boa que escolheria a traria para aquela posição.

Abaixo de Seung e, para piorar, na mira dos olhos brilhantes de Christa. Um brilho que, por mais que a saudade adorasse, viveria bem sem ele agora.

Cora gelou.

‒ Podemos explicar ‒ cuspiram apressadamente, em uníssono.

O estrondo da porta se batendo foi o suficiente para arrancar uma reação deles. Era difícil escutar com o coração retumbando mais do que uma escola de bateria.

Ambos se entreolharam. A garota com a veia pulsando em sua testa, enquanto o garoto descia suas sobrancelhas, formando uma pequena linha entre elas.

‒ Não dá para ser mais clichê do que isso? ‒ Cora resmungou, sentindo calafrios só de imaginar estar dentro de um roteiro onde só havia uma cama para o casal principal.

Não seria o caso.

Forçou a si mesma a manter-se focada na linha de expressão, acima do poço profundo de seus olhos e dos vales de seus lábios.

Eu e ele não temos nada, afinal.

Caso cedesse e entrasse nas íris amargas e castanhas, cairia dentro desse poço. Nessas condições seria difícil subir novamente.

E quanto a sua boca...Os vales rosados...Transmitindo um ar promíscuo conforme abria para o ar escapar.

Gostaria de escalar eles um dia.

‒ Você está pelada em baixo de mim e o que mais te incomoda é o clichê? ‒ enfatizou a ausência de roupas, também preso em um ponto específico da veia de Cora. Com disfarçado interesse, continuou: ‒ Eu ficaria impressionado se não estivesse acostumado com o seu jeito safado.

Cora se encolheu, buscando tampar seus bebezinhos com as mãos. O que não foi possível, já que o rapaz as mantinha acima de sua cabeça.

Como ele esqueceu esse detalhe?

Ela arregalou os olhos, indicando em gestos confusos para os dedos rígidos que a prendiam. Podemos considerar que a mensagem não foi recebida de primeira.

Seung comprimiu o sondar, buscando entender. Quando assimilou o que ainda fazia, soltou rapidamente. Como se tivesse levado um choque.

Mas não foi rápido o suficiente para que a irmã mais velha não conseguisse ver. Não importava mais se o rapaz estava de pé, já praticamente do outro lado do cômodo.

‒ Estão escutando esse barulho? ‒ Christa se manifestou, adentrando mais o quarto. Conforme se aproximava um sonido metálico reverberava pelas paredes ‒ Bi, Bi, Bi, vrummmm....

‒ Sua provocadora de meia tigela! ‒ rosnou, frustrada demais pelo seu xingamento improvisado.

A imitação de Christa fora péssima. Poderiam ter chutado tudo, menos carro.

Estava mais próximo de um caminhão atropelando um servo na estrada do que do Chevrolet Opala 78 de seu pai.

Cora grunhiu. Em seguida puxou com certa raiva o cobertor para cobrir sua nudez, preparada para levantar-se rapidamente.

Ela abriu a boca para contestar e brigar com a mais velha, mas afundou no colchão e quase caiu para trás, assim que se deparou com uma Christa debilitada e de muletas.

Aquele sapato vermelho [✔] - ATUALIZADAOnde histórias criam vida. Descubra agora