Olhar solitário

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Jogou o corpo fraco na cama, invadida pela moleza e a sensação de suas forças se esvaindo.

Não fora por causa da estranha conversa com Ashley e sua comparsa recém contratada ‒ Quer dizer, não fora por isso.

Desde que virou ele, sua cabeça pesava mais e suas pernas se moviam em um ritmo mais lento e menos agitado, como se cada passo fosse um arrastar de pés.

Cora fitou o teto, ameaçando fechar os olhos.

Cadê ele?

Da última vez que demorou tanto a aparecer, Cora saiu magoada e com os sentimentos destruídos. Seung demorar não costumava ser boa coisa.

Prendeu um suspirar, mantendo a mente longe do passado. Quanto mais pensava nisso, mais sufocava.

Não era uma sensação agradável, dá para imaginar.

Em uma última piscada lenta, sentiu que enfim poderia descansar da semana agitada e ignorar o começo de uma nova. Segundas feiras nunca foram tão exaustivas.

No entanto, essa mal começou e já entrou nela acabada.

Uma batina na porta impediu que seus olhos fechassem de vez, obrigando Cora a arregalá-los pelo barulho súbito.

Soltando um bufar pesado, levantou da cama em um pulo ‒ rápida o bastante para ter sua visão tomada pela escuridão.

Por sorte não estava prestes a desmaiar. Conseguiu se recompor assim que sua mão quente envolveu a maçaneta fria.

‒ Finalmente! Já ia perguntar se esqueceu o meu endereço! ‒ resmungou com nítido deboche estampando sua face ‒ Espere.

Cora desviou a atenção de Seung, inclinando o corpo para frente e virando a cabeça de um lado para o outro ‒ dando de cara com o corredor vazio.

Percorreu o olhar ansioso pelas escadas, passando rapidamente por alguns quadros e plantas decorativas. Ninguém suspeito aqui.

Voltou a sua posição de origem, pegando Seung a observando de maneira estranha ‒ na verdade, era certo de que a única coisa estranha para ele era ela.

‒ Fala ‒ incentivou com um gesto silencioso de cabeça.

‒ Por acaso está sendo perseguida pelos homens de preto? Isso explicaria a mudança de gênero ‒ apontou com convicção.

Cora riu, mas durou poucos segundos.

Percebeu seriedade em seu semblante. As sobrancelhas escuras permaneciam retesadas e o olhar injetado analiticamente em si.

‒ Fala baixo! ‒ repreendeu entredentes, disparando novos olhares para os cantos atrás do rapaz. Parou nele, novamente ‒ achando que isso aqui é um roteiro barato de filme Hollywoodiano?

‒ Um de baixo orçamento, mas sim ‒ confessou naturalmente, erguendo os ombros.

Cora comprimiu os olhos e ‒ antes que ele processasse ‒ puxou a gola de sua camisa e o trouxe para dentro do quarto.

Imaginava que seu comportamento não seria lá o dos mais racionais quando descobrisse. Afinal, essa situação pode ser tudo, menos racional.

Era plausível estar agindo como um adolescente conspirador da atualidade.

Cora massageou as têmporas.

Só não sabia lidar com ele.

‒ O que te faz pensar que a agência MIB se desdobraria para me caçar? Sou um alienígena por acaso? ‒ tratou de fechar a porta, apoiando as costas na madeira velha.

Aquele sapato vermelho [✔] - ATUALIZADAOnde histórias criam vida. Descubra agora