Perigos

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Passei pelo saguão de Manchester House, ouvindo vozes em tons enérgicos, vindas da sala de visitas. Vozes femininas. Reconheci a voz de minha irmã Harriet e de lady Turner, uma de suas melhores amigas, de minha mãe e da senhora Thompson. Creio que deveriam estar discutindo assuntos inerentes às damas, o que significava que meu pai não as acompanhava. E isto consequentemente me levava a crer que ele deveria estar no escritório.

Motivado por esta hipótese, percorri os corredores até me deparar com a porta do escritório fechada.

Não irei incomodá-lo em demasia se lhe tomar apenas alguns minutos. – Pensei. Eu tinha um assunto para tratar com ele.

Minha mão chegou a tocar a maçaneta, mas a porta se abriu antes que eu tivesse oportunidade de girá-la.

– Oh, perdão. – Um cavalheiro de um pouco mais de cinquenta anos surgiu à minha frente.

Eu o examinei brevemente. Pelas roupas que usava, supus que fosse um oficial de polícia.

– Eu que peço desculpas. – Respondi ao desconhecido. – Acreditei que meu pai estivesse sozinho.

– Não se desculpe, cavalheiro. – O homem deu um passo para o lado, dando-me visão do interior do escritório. – Eu já estava de saída.

Avistei meu pai nos alcançando no instante seguinte. O oficial, o qual eu ainda não sabia o nome, encarou-me, a expressão de alguém cuja mente estava prestes a ter um lampejo.

– Lorde Stretford?

– Sim?

– Ora, ora! Então este era o pequeno Edward? – O homem se virou para trás, indagando a meu pai.

– Um tanto crescido, não?

– Demasiadamente crescido! – O desconhecido retirou o chapéu da cabeça, deslizando uma das mãos pela cabeça, cujos fios de cabelo começavam a rarear em seu topo. – Creio que tenha o visto pela última vez quando tinha doze anos!

Eu estreitei meus olhos como se com isso pudesse enxergar melhor e me recordar de quem ele era.

– Oficial Blackburn. – Ele então se apresentou, estirando-me a mão para um cumprimento.

Olhei de relance para meu pai, na esperança de que ele se manifestasse, indicando-me qualquer pista de onde exatamente eu deveria me lembrar daquele senhor.

– Perdoe meu filho, Blackburn. Parece-me que ele não se recorda de sua pessoa. Receio dizer que os jovens como ele têm ótima memória, mas apenas para reconhecer rostos femininos.

– Oh, sim, sim. – O sujeito riu e eu tive que me conter para não cruzar os braços. – Não o julgo. Na idade dele eu também era dotado de tal habilidade.

– Edward, Blackburn é oficial do departamento prisional de Londres e há alguns anos fora o chefe de Newgate Prison. Nós nos conhecemos anos atrás e desde então mantemos contato. – Meu pai explicou.

– Perdão, senhor. Só tive o vislumbre de que era um oficial pelos trajes e realmente não consegui evocar na memória quem era.

O oficial dispensou minhas novas desculpas com um gesto de mão.

– Foi um prazer revê-lo, milorde. – Blackburn se virou para meu pai: – Céus, como isto prova que estou ficando velho! Na ocasião em que nos conhecemos, vossa graça acabara de deixar de ser o marquês de Stretford para assumir o título de duque. Agora, já tem seu herdeiro, que já assumira seu título de cortesia.

Meu pai passou a mão pela barba rala no rosto, respondendo de modo altivo:

– E, no entanto, ainda posso dizer que não sinto o peso da idade...

Flor de East EndOnde histórias criam vida. Descubra agora