Amigos sentem... desejo?

50 17 9
                                    


Fiz o possível para chegar a Manchester House com sutileza na manhã seguinte: fiz Kiggo andar a passo lento e quando nos aproximamos da propriedade, desmontei de sua garupa, conduzindo-o pelo cabresto até o estábulo.

O senhor Green, um de nossos cavalariços, recebeu-nos, mas não foi indiscreto, evitando tecer qualquer comentário ou lançar qualquer olhar de censura. Deixei o cavalo com ele e atravessei o gramado, entrando na casa pela porta dos fundos, aquela utilizada pelos criados, na esperança de não ser visto por ninguém de minha família.

Cruzei a cozinha, piscando o olho e sorrindo gentilmente para as criadas que se empenhavam em suas tarefas. Era uma tentativa de estabelecer algum tipo de cumplicidade, com o único objetivo de que elas não fizessem mexericos e me delatassem. Eu esperava que meu gesto conquistasse sua lealdade e julguei até que uma delas, uma jovem, suspirara quando a olhei sem outras intenções.

Continuei atravessando os corredores em silêncio, contudo, acabei trombando com Wallace, que de imediato, examinando meus trajes, dissonantes de meu vestuário habitual, confabulou alguma teoria, revelada na mudança de sua expressão.

– Bom dia, milorde.

– Bom dia, Wallace. – Cumprimentei-o com um sorriso amarelo.

Discreto como era, o mordomo fez menção de continuar seguindo seu caminho, mas eu o detive, dizendo:

– Wallace, posso lhe fazer um pedido?

– Certamente, milorde.

Eu olhei para os cantos, para averiguar se mais ninguém estava por perto.

– Por favor, não diga a meu pai que me viu chegar em casa a esta hora. Receio que ele possa ficar aborrecido, pois me pedira ontem que evitasse sair tarde de casa.

– Londres está infestada de criminosos, milorde. – O homem comentou como se me alertasse.

– Sim, estou ciente. Mas minha saída foi realmente necessária. Prometo não me arriscar mais enquanto a cidade não se ver livre destes malfeitores.

Embora a promessa não fosse da boca para fora, eu não poderia garantir que a cumpriria. Acaso houvesse necessidade de encontrar a senhorita Grantham, eu me veria na obrigação de reclinar a esta espécie de juramento.

– Atenderei a seu pedido, milorde. – A cabeça do mordomo inclinou para um dos lados. – Contudo, sinto dizer que isto não será o bastante para evitar que seu pai saiba que não passou a noite em Manchester House.

– Por quê?

Wallace olhou através de mim, pelo corredor às minhas costas, que desembocava no saguão da casa, onde eu teria acesso à escadaria que levava ao piso superior dos quartos, para onde eu pretendia ir.

– Temo que milorde irá descobrir assim que continuar seu trajeto.

Eu me virei para trás, a fim de encontrar qualquer pista que explicasse seu enigma. Mas não havia nada.

O mordomo não disse mais nada, limitando-se a esperar por uma nova ordem minha.

Eu gesticulei, dispensando-o:

– Obrigado mesmo assim, Wallace.

E segui pelo corredor, ansiando para descobrir o que me esperava.

Sentado em uma cadeira estofada e confortável, posta ali por alguma razão, estava meu pai. Uma de suas pernas estava cruzada sobre a outra, o cotovelo apoiava-se no braço dourado da cadeira, a mão sustentando a cabeça. Sua postura significava claramente que ele aguardava por algo ou alguém.

Flor de East EndOnde histórias criam vida. Descubra agora