15- Especial

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Pra muitos esse pode parecer um assunto bobo, não sei, e acho que tenho mais essa percepção hoje do que quando a conversa realmente aconteceu, mas pra ela aquele era um tema sensível, tanto que logo em seguida mudamos de assunto e fomos embora, cada uma pra sua casa.

De qualquer forma aquela conversa ficou na minha cabeça, até porque foi a primeira vez que falamos sobre aquilo e eu nunca a tinha visto com aquele olhar triste. Eu não sabia o que pensar, mas era nítido que Daniela se sentia magoada pelo que aconteceu... pelo como se sentiu.

Pesquisei a respeito, mas era complexo e cada lugar tinha uma explicação, não sobre o ato em si, mas era mais como uma mistura de opiniões a respeito, e foi assim que comecei a entender, mesmo que de forma muito rasa, a respeito do que ela tava tentando me dizer... me lembrei de mim, pensando em fazer algo por ela durante o sexo e ela me dizendo que do jeito que fazíamos era perfeito.

Todas as vezes que transamos, eu nunca a fiz gozar, e isso era muito confuso na minha cabeça, ainda mais com as coisas que ela me disse, mas agora eu tinha receio de perguntar, pois não queria deixá-la ainda mais chateada sem necessidade... isso sem dizer que também estava pensando em parar de encontrá-la.

Fiquei bem confusa com o que estava acontecendo e isso era algo interessante, pois nunca ficava assim com meus clientes, já que os objetivos eram bem claros e, em sua grande maioria, o foco não era o meu prazer, mas sim o deles, então quando encontro alguém que me mostra o contrário, acho difícil não me sentir assim, principalmente porque estava começando a me importar... o que era um grande problema.

É incrível como as redes sociais sabem o que a gente pensa, porque começou a aparecer algumas postagens que tinham relação com essas questões e vi muitos comentários com opiniões diferentes, tanto a favor, quanto contrários, alguns dizendo como se fosse uma escolha ser de um jeito, ou de outro, o que acho complexo, já que gosto é algo que não se escolhe.

Enfim, resolvi segurar um pouco mais aquele meu desejo sobre fazê-la gozar, pelo menos até conseguir entender com mais clareza de que forma eu poderia fazer isso sem bater de frente com essas questões, afinal de contas, eu queria gerar prazer e não mais dor de cabeça.

Fiquei na minha, até porque essa era minha postura, ou seja, não ficava mandando mensagem e puxando assunto, já que isso ia contra as minhas regras e, querendo ou não, já as havia quebrado demais, mas, alguns poucos dias depois do nosso último encontro, Daniela me mandou uma mensagem, dizendo:

– "Ainda me sinto mal pelo que houve da última vez."

– "Como assim?" – Perguntei, confusa.

– "Sobre extrapolar nosso horário e depois ainda falar sobre as coisas que falei."

– "Não precisa ficar assim, na hora fiquei chateada, mas foi comigo, porque eu tinha que ter colocado o celular pra despertar, mas esqueci. Sobre a outra questão, não tem problema, gostei de te ouvir."

– "Acho que to quebrando demais o seu profissionalismo." – Riu.

– "Nisso eu concordo." – Ri, embora estivesse preocupada.

– "Não quero parar de te encontrar, ao menos não por agora, mas eu sei que você não é uma psicóloga, embora seja terapêutico estar com você... independente do sexo."

Fiquei paralisada olhando aquela mensagem sem saber o que responder a respeito, o bom é que estávamos nos falando pelo meio de comunicação disponibilizado pelo site que uso, então pude respirar um pouco, já que ele não me mostra nem online e nem diz que eu li a mensagem recebida.

– "Confesso que ando preocupada com essa nossa interação... ainda não sei o que fazer." – Respondi, o mais próximo da verdade possível.

– "Imagino... vou respeitar qualquer decisão que tomar."

Tinha como não gostar desse ser humano? Daniela era sempre muito cordial e educada, e eu sei que o que fazia era o mínimo, me baseando na ideia de respeito que todos deveriam seguir, mas é justamente pensando no coletivo que enxergo sua grandeza nesses pequenos detalhes.

Meu problema, ou um deles, era que eu me importava e saber que estar comigo estava sendo bom pra ela, tendo em vista todo o contexto, mexia comigo. Como me afastar naquele momento? Como dizer que não dava mais pra continuar depois de ler uma frase daquela?... de certa forma, confesso, estava sendo terapêutico pra mim também.

Na verdade não era algo tão difícil assim, tendo em vista que já tinha feito isso outras vezes, por isso enfatizo a ideia de contexto, porque o que estava vivendo era algo que nunca havia vivido antes e, verdade seja dita, Daniela era diferente de todas as pessoas que já conheci, no bom sentido.

– "Eu sei que vai, – Falei. – mas ainda não vou fazer isso e, de verdade, você não precisa se preocupar com o que houve, ou com o que você disse, não faço isso com frequência, mas ta tudo bem."

– "O que você não faz com frequência?"

– "Ouvir desabafos."

– "Por que fez isso por mim, então?"

Aquela era uma pergunta difícil de responder, não por não saber a resposta, ainda mais depois de tudo que já falei... eu sabia a resposta, mas expressá-la assim era algo ainda mais forte e complexo de se fazer. O que poderia dizer? Deveria mentir? Seria melhor se inventasse qualquer outra razão?

Me levantei por um instante e fui, da sala à cozinha. Peguei um copo d'água e o bebi, reflexiva, encostada na pia e olhando pro nada. Era horrível me sentir daquela maneira, porque era uma angustia chata que me apertava o peito. Respirei fundo e voltei pra sala. Me sentei, peguei meu celular e, contrariada, respondi, dizendo:

– "Porque você é especial pra mim."

Larguei o aparelho e fui dormir.


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