20- Podemos

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Talvez pareça idiota tudo que estou dizendo daqui pra frente, mas juro que era a primeira vez que me sentia daquela maneira e eu realmente não sabia como lidar com aquilo, então foquei em trabalhar, foquei em putaria, e comecei a pegar todo tipo de trabalho que podia pegar... dentro de um certo limite, é claro.

O bom disso é que voltei a fazer dinheiro, já que andava distraída com essas tais emoções. É incrível como o coração faz a gente se perder no meio do processo, pois percebi que andava trabalhando menos, sempre na espera de que Dani fizesse contato pra um novo encontro.

De certa forma estava me tornando fiel, por mais louco que isso possa parecer saindo de mim, mas aquele era um movimento natural, algo que estava fazendo sem perceber, pois estava perdendo o interesse por meu trabalho, o que me fazia inventar desculpas pra maioria dos meus clientes... por mais que não tenha mencionado isso antes, mas era real.

Então, meio que na raiva, me levantei internamente com esse objetivo, ou seja, eu iria retomar minha vida, pois tinha meus objetivos, tinha meus planos, e precisava daquele dinheiro, não só pro meu dia a dia, mas sim pro meu futuro, o qual estava construindo com muito suor... muito mesmo.

Com isso passei aqueles dias focada, nem perguntei como havia sido o tal encontro de Dani e Gabi, sobre o qual me esquivei de todas as maneiras possíveis, pois sim, minha querida colega de faculdade tentou me contar mais de uma vez, confirmando que ele havia acontecido, mas não sei detalhes, não sei mesmo, já que não queria saber.

Ela parecia alegre e isso me angustiava, não vou ser hipócrita, essa era a verdade, porque sabia que seu motivo iria me arrasar. Quantas foram as vezes que imaginei aquele momento entre as duas... quantas vezes vi, em minha mente, Dani proporcionando um prazer que antes estava sendo direcionado a mim.

No meio da minha dor, minha motivação era sair, sair linda, limpa e cheirosa, pra me entregar pra qualquer um com um mínimo de boa aparência e higiene, que pudesse pagar bem, até porque não sou obrigada a me deitar com qualquer tipo de pessoa, e quando falo assim, não é diminuindo alguns, mas sim me valorizando.

Não vejo necessidade em detalhar a respeito de meus demais programas, mas consegui fazer pelo menos um por dia, mas confesso que, mesmo conseguindo me distrair, por várias vezes me peguei lembrando, ainda mais durante o sexo, pois a diferença era absurda... não sei explicar e nem me refiro pela ideia de homem e mulher, mas é que Dani tinha algo diferente... algo especial.

É tão estranho voltar pra solidão depois de experimentar emoções tão prazerosas e, por mais que não tenha tido um relacionamento, era como se algo assim tivesse sido perdido e, como já disse, tudo ao meu redor parecia não ter a mesma graça que tinha antes, mesmo quando era algo bom.

Seria injusto dizer que todos eram ruins, mas é que não eram ela... eles não tinham o seu abraço, o seu olhar... o seu sorriso. Idas e vindas, sexo e mais sexo, dinheiro entrando na conta. Será que só isso basta? Será que a vida gira em torno apenas disso? Dinheiro e sexo? Contas pagas? Será que é só isso?

Nunca havia me questionado tanto sobre essas coisas como o fazia e, confesso, meu interesse pelos temas homossexuais continuavam e eu sempre me pegava perdida em alguma foto de casais lésbicos, sorrindo e se amando, ou vendo filmes e séries, por mais que fossem poucos, ou de difícil acesso.

Qual era o segredo de Dani? Eu não sabia a história toda e talvez nunca fosse saber, mas aquilo ainda rodeava minha mente, me atiçando a curiosidade, mas eu sabia que era apenas mais um motivo pra pensar a respeito, porque, por mais que não quisesse, era inevitável não lembrar. Será que nunca saberia?

Acho que Gabi percebeu que eu não queria saber sobre seus encontros, os quais continuaram a acontecer, pois ela parou de tentar me contar, só não sei o que pensava a respeito, já que também não dava espaço pra esse tipo de questionamento, mas provavelmente devia ter suas teorias.

Elas se viam, não foi uma única vez, e eu continuava presa àquele sentimento que me angustiava. Nunca imaginei que fosse tão difícil se desvencilhar desse tipo de emoção, ou seja, eu continuava pagando minha língua, que sempre usei pra criticar outras pessoas, falando como se fosse fácil esquecer, mas agora eu sabia... não era assim tão simples.

Comecei a pensar na possibilidade de trocar novamente de faculdade, por mais que agora faltasse bem menos pra me formar, mas é que, com tudo aquilo, eu não estava conseguindo me concentrar nas aulas e, por outro lado, Gabi tinha razão a respeito das minhas faltas, que estavam ocorrendo com uma certa frequência.

Enfim, enquanto não tomava uma decisão, precisava me esforçar pra não reprovar, então eu ia, fosse antes ou depois de um programa, mas ia, cansada, distraída, mas tentava me esforçar pra não faltar mais... ao menos isso, e foi quando o imprevisto aconteceu.

Fui pra faculdade depois de um trabalho, tava na correria e ia chegar atrasada, isso era fato. Peguei um carro por aplicativo, pra tentar chegar o mais rápido possível, desci na porta, mas percebi que meu cadarço estava desamarrado, então apoiei minhas coisas no chão e me abaixei pra resolver aquele simples problema.

– Oi. – Me disse aquela voz mais que familiar.

Ergui minha cabeça e era ela, era Dani, parada, bem na minha frente, com as mãos nos bolsos de seu casaco e linda, como sempre. Não sei explicar o que senti, ainda mais porque não esperava vê-la, já que estudávamos na parte da tarde, mas lá estava ela, me olhando, sem sorrir.

Me levantei, ainda atordoada pela surpresa. O que ela tava fazendo ali? Será que era motivo pra me preocupar? O que devia fazer? Devia falar algo? Devia lhe abraçar?... como eu queria aquele abraço, mas não. De pé, de frente a ela, sem nada dizer, peguei minhas coisas e comecei a andar, mas, novamente pra minha surpresa, ela me segurou e perguntou:

– Podemos conversar?

Enfim... não devia, eu acho, mas sim... podemos.


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