Capítulo 31

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Stella Lancellotti

Encaro-me no espelho com atenção. Meu rosto amassado e inchado me assustam. A muito tempo eu não me sinto tão derrotada, tão frágil. Não direcionada aquela noite.

Essa sensação de desespero, agonia, angústia e medo, toda a dor que senti enquanto assistia minha família sangrar até a morte, me torna tão vulnerável que me irrita. 

Lavo meu rosto devagar e respiro fundo. Volto meus olhos para a mulher a minha frente e não consigo reconhecer ela. 

Onde está a Stella que tinha um objetivo e nada no mundo era mais importante que ele? Onde está a mulher que prometeu para si mesma fazer vingança com as próprias mãos? Porquê ela está parada participando de uma festa de aniversário com a família de seu companheiro? Porque eu estou aqui? O que estou fazendo me entregando a alguém assim? Porque não estou arrependida disso? Porque eu gosto disso?

Soluço fechando os olhos e me apoiando na pia grande e luxuosa. Respiro devagar pelo nariz e solto pela boca algumas vezes antes de soluçar de novo. Meus olhos castanhos me encaram novamente neste imenso espelho e eu balanço a cabeça negando, incrédula. 

— Por que está fazendo isso com a gente? — questiono em um fio de voz com a garganta embolada. — Por que está tão quieta sabendo que estamos nos afastando do nosso objetivo? Como isso pode não afetar você? — Minha voz falha e eu rio desacreditada abaixando a cabeça. —  Deveríamos ser aquelas que trarão paz às suas almas. Depois de tudo eles merecem isso. Pensei que estivessemos em sintonia. Eu e você. Que fossemos nós duas contra os outros e não uma contra a outra. 

Soco a pia sentindo a raiva emanar do meu corpo. Voltei a nos encarar e trinquei o maxilar. 

— Você esqueceu tudo que passamos para chegar aqui? Cada merda que tivemos que aguentar e fazer? Parece que se esqueceu de tudo… — Respirei fundo olhando para porta em tom branco e dourada do ouro que a adorna.  — Bom, não importa. Se quer que as coisas sejam assim entre nós, que seja. Só peço uma coisa a você hoje… — Começo voltando meus olhos ao espelho. — Não deixe ele perder esse momento. Nós duas sabemos o quão importante isso é. Um evento desse em família é algo importante, memorável e necessário, no caso dele vai ser divino. Eu não estou pronta para lidar com essa dor ainda, então peço que só por hoje você dê uma trégua nessa merda, está bem? Por ele. Nosso Mezzo merece passar um evento importante com a família dele e eu sei que se eu for agora vou estragar tudo. Estou quebradiça, não posso ruir agora. Preciso me recompor e para isso preciso que venha. Só esta noite. Tome o controle como fez a uns anos atrás e cuide dele. Amanhã estarei mais recuperada. — Sem resposta respiro fundo tentando ser o mais paciente possível. — Sei que está vulnerável também pelo nosso cio, mas você é mais forte do que eu. Só tente, se ver que está muito mal, eu volto e encaro isso. Mas tente por ele…

Soco a pia após mais silêncio. Abaixo a cabeça encarando meus pés descalços no chão frio do banheiro de Seth. Tento regular novamente minha respiração, sentindo a agonia dentro de mim aumentar. 

Sem ela eu não vou conseguir apoiar Seth hoje. Vou ruir novamente e estragar o primeiro momento dele sentindo coisas perto da família, descobrindo coisas novas sobre si, sentimentos verdadeiros condenados por sua alma machucada. Ele merece passar por esse processo e aproveitar cada momento, depois de tanto tempo oco, frio e sofrendo constantemente pela alma dilacerada.

— Por favor… — Sussurro sem voz encarando o meu reflexo no espelho, com os olhos úmidos e avermelhados. — Por ele…

🗡️

S

eth Bloomwood

Sentado nos pés da cama, encaro a porta do banheiro à minha frente. Coço a nuca tentando evitar a vontade de ir até o mesmo ficar com ela. Faz tanto tempo que está lá e ainda nem ouvi o barulho da ducha. 

Fecho os olhos respirando fundo e encarando minhas mãos em seguida. Eu deveria saber o que fazer para cuidar dela, ajudá-la, mas estou de mãos atadas. 

Eu nunca tive alguém assim, uma parceira. Às vezes eu só repito o que vi meu pai fazer pela minha mãe a vida toda. Ele é minha maior fonte de inspiração para tudo. Porque agora eu não consigo entender o que fazer? Dar apoio parece ter só ajudado em curto prazo, ela ainda parece destruída. 

— Você saberia lidar melhor com ela, eu acho. — murmuro olhando de novo para a porta do banheiro. Sinto meu lobo atento, a postos. — Eu ainda tenho dificuldade em cuidar dela, em ajudar. Fique próximo de mim hoje, está bem? Ela vai precisar de nós dois. — O lobo negro se prosta pronto. Sorri voltando a olhar para a porta do banheiro. — Se ela precisar de você, apenas venha e cuide dela. Não se importe com a magia, eu lido com o resto…

Longa noite. — resmungou. 

Enruguei a testa para sua comunicação e sorri ainda confuso. 

— É, ainda mais agora que sei que você fala aqui dentro. — comento.

Não somos um só, como nosso pai e os outros. Somos separados por magia. Carne, alma, lobo e magia. — explica. 

E por que nunca falou antes comigo? 

Nossa companheira nos conecta desse modo, como nossa mãe conecta os lobos pela mente. Por isso você sente nossa alma agora, o que resta dela. Além disso, ela me fortifica. Pouco, mas fortifica. — seu tom fica entediado e o sinto se aconchegar. — Quando vai tomá-la

— O que? — questionei confuso olhando novamente para a porta do banheiro. 

Ela está no cio, e você se nega a tomá-la. 

— Eu não me nego. Não quero forçá-la, é errado. –- respondi coçando a garganta desconfortável com a conversa. 

Forçar? Você sabe que ela quer, que nos deseja, apenas vá e a pegue. — ele bufa parecia bravo e entediado. — Você é a nossa parte mais presente para ela, precisar ser você a dar esse passo.

— Nem tudo se resumi a sexo, lobo. Ela só precisa de carinho agora, quando precisar de sexo então pensamos nisso. 

Espero mesmo. Sou o único lobo na Terra que tem uma companheira no cio me chamando e não posso confortá-la. É vergonhoso. Deveria se envergonhar também. 

Reviro os olhos balançando a cabeça, antes de respondê-lo sinto o cheiro forte de morangos inundando o cômodo. Doce demais, atraente demais. Sinto os pelos do meu corpo se arrepiarem, e minha respiração desregulada. 

Engoli em seco, com a queimação que rastejou rapidamente por todo meu corpo.

— Ela… — murmurei em um fio de voz, entorpecido. 

Está aqui.

🗡️

Capítulo pequeno por que é mais uma introdução da próxima fase.

Espero que gostem dessa nova fase da história que vai começar.

O drama vai ser colocado em jogo ainda mais, junto da adrenalina e da safadeza da Stella. 😂

Peguem lenços. 😂
Beijos ❤️

Entre Ruínas (Vol. 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora