Capítulo 20: Circe Morevis

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Ronan mal chegou na sede do Asas Iluminadas e de certa forma era um assunto tão falado quanto meu casamento com Trevor. O poder de se transfigurar era algo que despertava curiosidade nas pessoas, e o fato de ele ser sobrinho de uma conselheira atraía muitos puxa-saco. Num intervalo onde pudemos todos ir para o refeitório comer e descansar por uma hora, ele não teve nenhuma dificuldade em ser praticamente arrastado para uma mesa cheia de pessoas querendo conversar com ele. Eu admito que ele também me despertava curiosidade, mas decidi não me aproximar, já havia tomado parte de seu tempo durante o treino.

Da mesma forma, Trevor também foi. Alguns conhecidos dele o chamaram, eu até pensei “sou a esposa dele, talvez deva ir junto”, mas resolvi não arriscar. É o Trevor quem eles querem, não a mim. Minha presença só causaria desconfortos desnecessários, e eu odiaria a constante sensação de que sou uma obrigação.

Me contentei em apenas olhá-lo de longe por um breve momento, mas fazer o que sempre fiz: sentar na primeira mesa vazia que visse, levando o meu prato de arroz com carne vermelha e grãos. Não é como se já não estivesse acostumada com isso. Trevor sempre estava rodeado de pessoas, e nenhuma delas era eu.

Enquanto comia, não pude deixar de reparar na mesa em que Trevor comia e conversava com alguns conhecidos que falavam irritantemente alto, e uma dessas conhecidas era uma garota morena, de cabelos perfeitamente cacheados e olhos verdes, que sorria e se aproximava dele pelo lado, conversando animadamente e tocando sutilmente seu braço e sua mão.

— Trevor eu amei como você colocou o Teseu no lugar dele hoje, foi tipo: “U A U” — Ela gesticulou de forma caricata, mas Trevor mal lhe deu atenção. — Fico mais segura em saber que tem alguém como você aqui no Asas Iluminadas.

Eu franzi o cenho. Será que é impressão minha?

Trevor mal dava a mínima para aquela garota, mas ela continuava falando com empolgação, elogiando excessivamente e tentando encostar nele de forma sutil.

Não é possível que essa garota não saiba que ele é casado. Todo mundo sabe. Os jornais não me deixam mentir.

Não entendi o porquê, mas aquilo me irritava.

— Essas peruas não tem noção nenhuma. Espero que o Trevor continue sem dar bola. — Circe falou, me surpreendendo ao arrastar a cadeira à minha frente e se juntar à minha mesa, também com seu prato de comida.

— De fato. — Concordei.

Eu suspirei profundamente e continuei comendo.

Fiquei me perguntando o que Circe estava fazendo na minha mesa, porém concluí rapidamente que ela só se sentou ali pela ausência de outros lugares disponíveis.

— Parabéns pelo casamento. — Ela falou de boca cheia. Eu a olhei com certa estranheza. Não pela boca cheia, mas pelas palavras em si.

— Obrigada. — Respondi com certa cautela.

— Imagino que seja complicado se adaptar não é? Nem imagino como seja, já que nunca tive um pretendente. Geralmente minha irmã de dezoito anos tem mais pretendentes. — Circe deu de ombros, sua voz era seca. Achei aquilo momentaneamente estranho, mas parando pra pensar, fazia sentido. Eu teoricamente só poderia me casar aos dezoito anos, mas o prefeito Growin, como meu tutor, me emancipou para casar antes disso. Eu sou uma anomalia. — Como tem se sentido?

Eu franzi o cenho, parando de comer e a encarando.

— Alguém mandou você perguntar isso? Se foi, saiba que não quero responder. — Inquiri, desconfiada.

Circe riu sem humor.

— Claro que não, sua louca. — retrucou, em tom seco. Eu arqueei ambas as sobrancelhas, surpresa. — Eu realmente quero saber, você é uma companheira de esquadrão e eu sei que você e o Trevor nunca se deram bem. Eu só fiquei preocupada com a sua situação, mas se você acha tão ruim… — ela se levantou pronta para mudar de mesa. Eu arregalei os olhos e num impulso me inclinei sobre a mesa e segurei seu braço.

Herdeira de Sangue e Fogo [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora