Capítulo 24: Insegurança

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Mais uma noite, eu me privei do sono.

Tomei café, treinei, dancei, caminhei, fiz tudo que podia, mas estava decidida a não dormir. Quando o sono falava mais alto, eu arranhava meu próprio corpo para me manter desperta. Estava com medo de ouvir Hamartía falar e me sentir profundamente tentada. Sequer li o livro que Cassandra me deu, pois ler me faria relaxar, e essa era a última coisa que eu queria.

Eu pensei em colocar em prática o que Cassandra ensinou. Falar com o Oleiro… a simples ideia de fazer isso me parecia absurda. Eu tentava imaginar como fazer isso e apesar das instruções e de lembrar como fiz com Cassandra, nada passava pela minha mente senão um bloqueio que me fez simplesmente descartar essa ideia.

Ao mesmo tempo que tinha medo de ser contatada por Hamartía, de ser seduzida por suas doces palavras, eu também tinha medo de quantos sofrimentos poderia passar se decidisse aceitar a proximidade do Oleiro.

Eu me sentia num limbo, onde ir para um lado era terrivelmente errado, mas ir para o outro era terrivelmente doloroso. Eu não queria o peso na consciência de me aliar a Hamartía, mas também não queria experienciar todas as possíveis dores de me tornar próxima do Oleiro que Cassandra mencionou.

Não falei com Trevor desde nossa última discussão, e aparentemente ele não me caluniou ao conselho, ou já teriam me prendido ou no mínimo me interrogado.

A parte ruim de não dormir, é que agora já estava de manhã. E eu teria que ir treinar com Asas Iluminadas, e treinar privada de sono certamente afetaria meu rendimento. E além de tudo, era um dia par. Eu teria, de toda forma, que ter contato com Trevor há noite.

— Está pronta? — Inquiriu, em tom seco, parando na porta do meu quarto. Eu ainda estava de frente pro espelho, encarando as olheiras profundas, quase roxas, que haviam se formado embaixo de meus olhos.

Eu o encarei brevemente e me levantei.

— Estou. — Respondi, e sem dizer mais nada eu saí do quarto. Ele me seguiu e fomos até o carro.

Já no banco do carona, em movimento, ele quebrou o silêncio:

— Você dormiu? — Indagou.

Dei de ombros.

— O importante é que o lorde do Abismo não falou comigo. — Ironizei.

— Isso é sério Brooke. — Trevor me bronqueou.

Eu dei de ombros.

— Quanto mais cedo eu morrer em um treino ou em batalha, melhor pra você não é? Devia me apoiar. — Cruzei os braços, mantendo meu tom petulante.

Trevor bufou.

— Você está afiada hoje.

Eu ri sem humor, desviando meu olhar para a janela, e um silêncio se instaurou no carro até nossa chegada ao Asas Iluminadas. Trevor tentou novamente me dar a mão na entrada do prédio, mas eu repeli sua mão antes que me tocasse. Não estava com paciência para montar o teatro do casal feliz. Apenas prossegui em silêncio para a sala de treino.

Eu resolvi treinar velocidade, correndo na pista em torno da sala. O simples ato de correr parecia mais pesado depois de me privar do sono, eu sentia meu coração fraco, como se não batesse em toda sua capacidade. Acreditei que correr pudesse me ajudar a liberar a raiva acumulada dentro de mim, porém percebi que essa raiva não cessaria tão rápido quando vi aquela mesma garota, morena de sardas, se aproximando de Trevor e conversando enquanto faz um treino de força ao lado dele, propositalmente deixando um de seus pesos caírem para que como um cavalheiro, ele a ajudasse.

Eu não me importaria se uma garota falasse normalmente, casualmente com ele. Mas aquela garota era diferente, eu via pelos gestos, olhares, jeitos, que ela queria mais que tudo a atenção de Trevor como mulher.

Herdeira de Sangue e Fogo [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora